APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006695-80.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: SCHENKER DO BRASIL TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA
Advogados do(a) APELADO: BAUDILIO GONZALEZ REGUEIRA - SP139684-A, JOAO PAULO ALVES JUSTO BRAUN - SP184716-A, SUZEL MARIA REIS ALMEIDA CUNHA - SP139210-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006695-80.2020.4.03.6104 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SCHENKER DO BRASIL TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA Advogado do(a) APELADO: JOAO PAULO ALVES JUSTO BRAUN - SP184716-A R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta pela União Federal (Fazenda Nacional) em face da r. sentença que julgou procedente o pedido, nos autos da ação de procedimento comum interposta por SCHENKER DO BRASIL TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA., em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando seja declarada a nulidade do débito fiscal decorrente do Processo Administrativo nº 11128.735024/2013-96. Alternativamente, postula a redução do valor exigido pela autoridade aduaneira. O pedido encontra-se fundamentado, em suma, nos seguintes argumentos: 1) o auto de infração padece de vício formal, não explicitando, de forma clara os fatos que ensejaram a multa; 2) ausência de responsabilidade, pois prestou as informações devidas e eventual demora do transportador em informar o que lhe incumbe não pode lhe ser imputada; 3) ausência de prejuízo ao Erário; 4) denúncia espontânea; 5) valor atribuído à multa com violação aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade; 6) a existência de decisão liminar proferida nos autos do processo nº 0005238-86.2015.4.03.6100, em curso perante a 14ª Vara Federal da Subseção Judiciária de São Paulo, em demanda intentada pela Associação Nacional de Empresas Transitárias, Agentes de Carga aérea, Comissárias de Despachos e operadores Intermodais (ACTC), da qual é associada, que afasta a aplicação da multa reclamada; 7) à época da suposta infração, não era obrigatório o prazo previsto no dispositivo em que foi enquadrada. A análise do pedido de tutela de urgência foi postergada para após a resposta da ré. Autora regularizou a inicial, recolhendo custas. A União ofertou contestação, pugnando pela improcedência do pedido. O pedido de tutela de urgência restou deferido. Sobreveio réplica e as partes não mostraram interesse na produção de novas provas. O MM. Juiz a quo, JULGOU PROCEDENTE o pedido para anular o Processo Administrativo Fiscal nº 11128.735024/2013-96 (id. 43453798), instaurado pela Alfândega da Receita Federal do Brasil em Santos, assegurando, assim, a exclusão de eventuais registros e anotações da dívida correspondente. Mantenho a tutela de urgência. Ante a sucumbência, a parte Ré foi condenada no pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico pretendido na inicial, devidamente atualizado (CPC/2015, art. 85, § 3º, inciso I). Custas na forma da lei. Sentença não sujeita a reexame necessário (§ 3º, artigo 496, do C.P.C.). Em razões recursais, pleiteia a União Federal a reforma do decisum com a improcedência da ação. Com contrarrazões, vieram os autos. É o Relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006695-80.2020.4.03.6104 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SCHENKER DO BRASIL TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA Advogado do(a) APELADO: JOAO PAULO ALVES JUSTO BRAUN - SP184716-A V O T O De início, no tocante à liminar favorável aos associados da ACTC (Associação Nacional de Empresas Transitárias, Agentes de Carga Aérea, Comissárias de Despachos e Operadores Intermodais), proferida nos autos do processo nº 0005238-86.2015.403.6100, que estava em trâmite na 14ª Vara Cível de São Paulo, saliento que além das ações coletivas não induzirem litispendência, não foi realizado pedido de suspensão dos presentes autos (artigo 104 da Lei nº 8.078/90), sendo que é no bojo daquela ação que deve ser aferido descumprimento de ordem judicial emanada no feito, não havendo imposição de suspensão do curso dos presentes autos, cujo trâmite infere-se como opção do demandante individual. Nesse sentido o Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDIVIDUAL. PEDIDO DE EXTINÇÃO. FEITO JÁ SENTENCIADO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 104 DO CDC. INAPLICABILIDADE NO CASO CONCRETO. 1. O sistema processual brasileiro admite a coexistência de ação coletiva e ação individual que postulem o reconhecimento de um mesmo direito, inexistindo litispendência entre elas. 2. Nos termos do art. 104 do Código de Defesa do Consumidor, aquele que ajuizou ação individual pode aproveitar de eventuais benefícios resultantes da coisa julgada a ser formada na demanda coletiva, desde que postule a suspensão daquela, no prazo de 30 (trinta) dias contados da ciência da ação coletiva, até o julgamento do litígio de massa, podendo ser retomada a tal tramitação no caso de a sentença coletiva ser pela improcedência do pedido, ou ser (o feito individual) julgado extinto, sem resolução de mérito, por perda de interesse (utilidade), se o decisum coletivo for pela procedência do pleito. 3. Para que o pedido de suspensão surta os aludidos efeitos, é necessário que ele seja apresentado antes de proferida a sentença meritória no processo individual e, sobretudo, antes de transitada em julgado a sentença proferida na ação coletiva. 4. Prestada a jurisdição em ambas as demandas, não é mais possível ao interessado buscar que o provimento judicial de uma prevaleça sobre o da outra, porquanto isso representaria clara afronta ao princípio do juiz natural. 5. Hipótese em que a requerente, ao pedir a extinção do feito por perda superveniente de objeto, busca desonerar-se dos efeitos jurídicos da ação individual por ela ajuizada, hoje na fase de embargos de divergência, e cuja probabilidade de êxito é remota, dado o julgamento dos EREsp 1.403.532/SC (submetido à sistemática dos recursos repetitivos), ao argumento de que recentemente filiou-se a sindicato que logrou êxito em ação coletiva de mesmo objeto, já transitada em julgado. 6. Dada a falta de litispendência, a ciência quanto à existência de tutela coletiva já obtida pela entidade sindical não implica perda de objeto de ação individual já sentenciada e nem infirma as consequências jurídicas dela advindas. 7. Agravo interno desprovido.". (AgInt na PET nos EREsp 1405424 / SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Primeira Seção, julgado em 26/10/2016, DJe 29/11/2016) No mais consta dos autos que, em desfavor da autora, foi lavrado Auto de Infração, com fundamento no artigo art. 107, inciso IV, alínea "e" do Decreto-Lei nº 37/66 com a redação dada pelo art. 77 da Lei n 10.833/03, dando origem ao Processo Administrativo nº fiscal nº 11128.735024/2013-96 , em virtude de prestar informações sobre veículo ou carga transportada, ou sobre operações que executou, não obedecendo a forma e prazos estabelecidos pela Receita Federal do Brasil. Para analisar a legalidade ou não do procedimento adotado pelo Fisco, ao lavrar o Auto de Infração, faz-se mister transcrever os dispositivos que regulam a matéria ora debatida: Decreto-lei n. 37/66: Art. 37. O transportador deve prestar à Secretaria da Receita Federal, na forma e no prazo por ela estabelecidos, as informações sobre as cargas transportadas, bem como sobre a chegada de veículo procedente do exterior ou a ele destinado. (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)(...)Art. 107. Aplicam-se ainda as seguintes multas: (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)(...)IV - de R$ 5.000,00 (cinco mil reais): (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)(...)e) por deixar de prestar informação sobre veículo ou carga nele transportada, ou sobre as operações que execute, na forma e no prazo estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, aplicada à empresa de transporte internacional, inclusive a prestadora de serviços de transporte internacional expresso porta-a-porta, ou ao agente de carga; O Instrumento Normativo que regulamenta a forma e prazo citados nos dispositivos acima é a Instrução Normativa RFB nº 800/2007, in verbis: IN 800/2007 Art. 1º O controle de entrada e saída de embarcações e de movimentação de cargas e unidades de carga em portos alfandegados obedecerá ao disposto nesta Instrução Normativa e será processado mediante o módulo de controle de carga aquaviária do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), denominado Siscomex Carga. Parágrafo único. As informações necessárias aos controles referidos no caput serão prestadas à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) pelos intervenientes, conforme estabelecido nesta Instrução Normativa, mediante o uso de certificação digital:(...) Art. 22. São os seguintes os prazos mínimos para a prestação das informações à RFB: (...) II - as correspondentes ao manifesto e seus CE, bem como para toda associação de CE a manifesto e de manifesto a escala: d) quarenta e oito horas antes da chegada da embarcação, para os manifestos e respectivos CE a descarregar em porto nacional, ou que permaneçam a bordo; e III - as relativas à conclusão da desconsolidação, quarenta e oito horas antes da chegada da embarcação no porto de destino do conhecimento genérico. A informação intempestiva no que se refere ao registro das cargas para desembarque configura a infração contida no art. 107, IV “e”, do Decreto-Lei nº 37/66, que dispõe que o transportador de cargas provenientes do exterior tem o dever legal de prestar as informações à Receita Federal do Brasil sobre a chegada do veículo e sobre as cargas transportadas, na forma e prazo estabelecidos. Nos autos em análise, o D. Magistrado entendeu pela inaplicabilidade da multa no “período de contingência” do Siscomex Carga, sob o argumento de que os prazos mínimos do art. 22 da IN RFB nº 800/2007, ainda não eram exigíveis no momento da lavratura do auto de infração, haja vista que os referidos prazos só se tornaram obrigatórios em 1º de abril de 2009, conforme redação do art. 50 dado pela INR RFB nº 899/2008. Ocorre que, no caso em tela, conforme constou no processo administrativo fiscal referido na inicial, a parte autora descumpriu a obrigação tributária acessória de registrar informações no Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX – CARGA), dentro do prazo legal estipulado, uma vez que referidas informações, que deveriam ter sido prestadas pela consignatária antes da atracação do navio, somente o foram após a consumação do evento, incluídas aqui eventuais alterações (reputadas pela autora como simples alteração de informação já prestada) — incorrendo-se na penalidade prevista no artigo 107, inciso IV, alínea “c”, do Decreto-lei nº 37/1966, com a redação da Lei nº 10.833/2003. Ora, a prestação extemporânea de informações acerca da carga transportada ou das operações realizadas implica em infração, sendo, portanto, legítimo o auto de infração lavrado pela autoridade aduaneira, o qual imputou à apelante multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Ademais a IN RFB nº 899, de 29 de dezembro de 2008, deu a seguinte redação ao caput art. 50 da IN RFB nº 800/2007 (mantendo inalterada as disposições do parágrafo único): "Art. 50. Os prazos de antecedência previstos no art. 22 desta Instrução Normativa somente serão obrigatórios a partir de 1º de abril de 2009. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 899, de 29 de dezembro de 2008) Parágrafo único. O disposto no caput não exime o transportador da obrigação de prestar informações sobre: I - a escala, com antecedência mínima de cinco horas, ressalvados prazos menores estabelecidos em rotas de exceção; e II - as cargas transportadas, antes da atracação ou da desatracação da embarcação em porto no País. Neste contexto, não se discute que os prazos mínimos, estabelecido no art. 22, II, alínea ‘d’, se tornaram obrigatórios a partir de 1º de abril de 2009, por disposição expressa do art. 50, caput, da IN RFB nº 800/2007, com redação dada pela IN RFB nº 899/2008. Igualmente, é inconteste a obrigação do transportador de prestar as informações sobre as cargas transportadas antes da atracação ou desatracação da embarcação e, porto no País, desde 31/03/2008, por expressa previsão do parágrafo único, inciso II, do art. 50 da IN RFB nº 800/2007. A apelada é agente de carga, devendo prestar, na forma e prazo estabelecidos, as informações sobre as cargas transportadas, consoante o art. 37, §1º, do Decreto-Lei 37/66, o qual dispõe que “o agente de carga, assim considerada qualquer pessoa que, em nome do importador ou do exportador, contrate o transporte de mercadoria, consolide ou desconsolide cargas e preste serviços conexos, e o operador portuário, também devem prestar as informações sobre as operações que executem e respectivas cargas”., comando reproduzido pelo art. 31, §2º, do Decreto 6.759/09; ademais, o próprio art. 107, IV, alínea “e”, que dispõe sobre a multa aplicada no caso em questão, expressamente menciona os agentes de carga, assim compreendida “qualquer pessoa que, em nome do importador ou do exportador, contrate o transporte de mercadoria, consolide ou desconsolide cargas e preste serviços conexos”, não havendo distinção entre agentes de carga aérea ou marítima; por sua vez, o art. 2º, IV, alínea “e” da IN RFB 800/2007 define que o transportador é classificado “agente de carga, quando se tratar de consolidador ou desconsolidador nacional”. Em suma, não prospera o argumento de que a apelada é parte ilegítima para inserir informações no Sistema Siscomex Carga – Sistema Integrado da Gerência do Manifesto, do Trânsito e do Armazenamento, específico de cargas marítimas. Nesse sentido: "ADUANEIRO. APELAÇÃO. PENA DE MULTA. ARTIGO 107, INCISO IV, ALÍNEA “E”, DO DECRETO-LEI N.º 37/99. INFORMAÇÕES PRESTADAS EXTEMPORANEAMENTE. AGENTE DE CARGAS. LEGITIMIDADE. NÃO INSERÇÃO DE DADOS NO SISCOMEX. MULTA. DECRETO-LEI N.º 37/66. LEGALIDADE. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. NÃO CARACTERIZADA. RECURSO DESPROVIDO. (...) - A Lei n.º 10.833/2003, que alterou a redação do artigo 37 do Decreto-Lei n.º 37/66, também determinou a responsabilidade do agente de cargas no cumprimento da obrigação de prestação de informações sobre as cargas transportadas. - As informações sobre as cargas foram lançadas no sistema após a atração no porto de destino, em contrariedade com a previsão do artigo 22, inciso II, alínea “d”, e III, da IN RFB n.º 800/2007. (...)"(TRF3, ApCiv 5003900-67.2021.4.03.6104/SP, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, 4ª Turma, DJ 18.05.2023) "AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCEDIMENTO COMUM. ADUANEIRO. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. AGENTE MARÍTIMO. PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES. RESPONSABILIDADE. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. INOCORRÊNCIA. MANTIDA A DECISÃO AGRAVADA. (...) 5. O art. 37, §1° do Decreto-Lei n. 37/1966 preceitua que o agente de cargas é considerado "... qualquer pessoa que, em nome do importador ou exportador, contrate o transporte de mercadoria, consolide ou desconsolide cargas e preste serviços conexos”, estando, pois, responsável pela prestação das informações discutidas. (...)"(TRF3, AI 5015865-21.2021.4.03.0000/SP, Rel. Des. Fed. Marli Ferreira, 4ª Turma, DJ 06.09.2022) Outrossim, os atos administrativos gozam de presunção de legitimidade e a presunção de liquidez e certeza (juris tantum) de que se reveste tais atos somente pode ser ilidida por prova inequívoca, o que não ocorreu no presente caso. Destarte, verifica-se que a autoridade fiscal agiu em consonância com o ordenamento jurídico, não havendo que se falar em ilegalidade ou inconstitucionalidade da multa prevista no art. 107, IV, "e" do Decreto-lei 37/66. Da denúncia espontânea. Dispõe o art. 138 do Código Tributário Nacional: Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração. O art. 102 do Decreto-lei nº 37/66 assim dispõe, por seu turno: Art.102 - A denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do imposto e dos acréscimos, excluirá a imposição da correspondente penalidade. § 1º - Não se considera espontânea a denúncia apresentada: a) no curso do despacho aduaneiro, até o desembaraço da mercadoria; b) após o início de qualquer outro procedimento fiscal, mediante ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, tendente a apurar a infração. § 2º - A denúncia espontânea exclui a aplicação de penalidades de natureza tributária ou administrativa, com exceção das penalidades aplicáveis na hipótese de mercadoria sujeita a pena de perdimento. Muito embora a denúncia espontânea tenha previsão nos art. 138 do CTN e art. 102 e § 2º do Decreto-Lei nº 37/66, tal instituto não se aplica às obrigações acessórias autônomas de caráter administrativo, tal como no caso em tela, uma vez que estas se consumam com a simples inobservância do prazo definido em lei. O fato de a apelada ter efetuado o registro antes da autuação pelo Fisco, não afasta a consequência legal da aplicação da multa, pois a infração não se resume a não prestação de informações, configurando-se também quando estas são apresentadas fora do prazo, isto é, o que a autora invoca como excludente de punibilidade é a própria infração. A multa constitui sanção pelo atraso na prestação das informações devidas, objetivando desestimular o descumprimento das obrigações aduaneiras. Com esta natureza, diversa da de tributo, pode ser instituída em percentual elevado, não se aplicando a ela o princípio do não-confisco, desde que proporcional, como ocorre neste caso. Ademais, a multa aplicada pelo fornecimento intempestivo de informações à autoridade aduaneira possui caráter extrafiscal e tem por objetivo viabilizar a fiscalização do controle aduaneiro da movimentação de embarcações e cargas nos portos alfandegados. A propósito, colaciono a jurisprudência desta E. Corte acerca da matéria: "TRIBUTÁRIO. ANULATÓRIA. PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÃO SOBRE CARGA TRANSPORTADA. AGÊNCIA MARÍTIMA. IN SRF 1473/13. AUSÊNCIA DE EXCLUSÃO DA SANÇÃO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. INOCORRÊNCIA. (...) 2. A informação intempestiva no que se refere ao registro das cargas para desembarque configura a infração contida no art. 107, IV “e”, do Decreto-Lei nº 37/66, que dispõe que o transportador de cargas tem o dever legal de prestar as informações à Receita Federal do Brasil sobre a chegada do veículo e sobre as cargas transportadas, na forma e prazo estabelecidos. (...) 6. Impende consignar que a responsabilidade da infração pode ser imputada ao agente marítimo, visto que assume a condição de representante do transportador perante os órgãos públicos nacionais, tanto é assim, que a parte autora foi a responsável pela inserção das informações, ainda que tardiamente, no sistema Siscomex, de modo que possui responsabilidade pelo pagamento da multa, nos termos do artigo 95, I, do Decreto-Lei nº 37/66. (...) 8. Apelo da União e remessa oficial providos."(TRF, ApelReex 0024265-89.2014.4.03.6100/SP, Rel. Des. Fed. Marcelo Saraiva, 4ª Turma, DJ 01.07.2021). "TRIBUTÁRIO E ADUANEIRO. ANULATÓRIA. MULTA ADMINISTRATIVA. SISCOMEX. AGENTE MARÍTIMO. LEGITIMIDADE PASSIVA. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. IMPOSSIBILIDADE EM OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO. 1. O parágrafo 1º do artigo 37 do Decreto-lei n. 37/66, dispõe que o agente de carga, assim considerada qualquer pessoa que, em nome do importador ou do exportador, contrate o transporte de mercadoria, consolide ou desconsolide cargas e preste serviços conexos, e o operador portuário, também devem prestar as informações sobre as operações que executem e respectivas cargas. Legitimidade do agente marítimo para a autuação fiscal. 2. Não é cabível a aplicação do instituto da denúncia espontânea na hipótese de prestação intempestiva de informações sobre cargas transportadas. (...) 4. Verifica-se que há documentos indicando que as informações foram prestadas de forma intempestiva. 5. Agravo de instrumento improvido. Embargos de declaração prejudicado."(TRF3, AI 5009728-86.2022.4.03.0000/SP, Rel. Des. Fed. Mônica Nobre, 4ª Turma, DJ 20.03.2023) "TRIBUTÁRIO ADUANEIRO. ATRASO NA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES. DESCONSOLIDAÇÃO. DECRETO-LEI 37/66. MULTAS MANTIDAS. DENÚNCIA ESPONTÂNEA AFASTADA. 1. No caso dos autos, a empresa foi multada pela inobservância de prestar informações sobre a carga transportada no devido prazo. 2. A intenção da norma é a de possibilitar a autoridade aduaneira ter conhecimento dos bens objeto do comércio exterior, o que facilitaria o controle do cumprimento das obrigações sanitárias e fiscais. 3. Mantido o valor da multa estabelecido por registro de dados de embarque intempestivo, pois não se mostra confiscatório e nem fere o princípio da razoabilidade. 4. Rejeitada a alegação de que deveria ter sido aplicada uma única multa, por se tratarem de infrações autônomas, porquanto se consumam com o simples atraso na prestação de informações acerca das cargas transportadas, e não da viagem em curso, sendo irrelevante o fato de as cargas terem sido transportadas pela mesma embarcação. 5. Impende consignar ser a multa prevista no art. 107, IV, “e” do DL 37/66 aplicável tanto ao caso de deixar de prestar informações quanto à situação de prestar informações a destempo, sendo incabível a alegação da ausência de cometimento de infração, porquanto as informações foram prestadas a destempo. 6. O instituto da denúncia espontânea (art. 138 do CTN) não se aplica no caso de obrigações acessórias autônomas. Assim como o disposto no art. 102, §2º, do DL 37/66, com a redação dada pela Lei n.º 12.350/2010, o qual prevê a aplicação do instituto da denúncia espontânea inclusive para as penalidades de natureza administrativa, pois ainda que as informações sejam prestadas posteriormente, a conduta, de todo modo, não terá respeitado o prazo legal, razão pela qual é inaplicável o instituto da denúncia espontânea na hipótese. 7. Honorários recursais no percentual de 1% sobre o valor da causa, a serem acrescidos aos fixados pelo Juízo de primeiro grau, a teor do disposto no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil.8. Apelação a que se nega provimento."(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000680-03.2017.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR, julgado em 21/11/2019, Intimação via sistema DATA: 25/11/2019) Grifei No caso dos autos, a Autora prestou a destempo as informações do Conhecimento Eletrônico, subsumindo-se a hipótese de infração previstas nos dispositivos acima. Destarte, não há nenhuma ofensa à proporcionalidade ou à razoabilidade na aplicação desta multa, tendo em vista o seu nítido caráter punitivo em razão do descumprimento ou cumprimento inexato de obrigação acessória imposta por lei. Ora, não se trata de tributo e sim de penalidade pelo descumprimento de obrigação acessória necessária ao bom exercício da Administração Tributária. Por isso, o legislador, no estabelecimento de valores, leva em conta a gravidade da infração, o caráter punitivo e preventivo da sanção, dentre outros fatores. Portanto, a aplicação da multa é necessária e não há que se falar em nulidade a ser afastada. Considerando a improcedência da demanda, o ônus sucumbencial deve ser invertido, de modo que a autora deve arcar com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85 §4º, III, do Código de Processo Civil. Ante o exposto, dou provimento ao apelo da União na forma da fundamentação acima. É como voto.
E M E N T A
TRIBUTÁRIO ADUANEIRO. ATRASO NA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES. DESCONSOLIDAÇÃO. DECRETO-LEI 37/66. MULTA MANTIDA. DENÚNCIA ESPONTÂNEA AFASTADA. APELAÇÃO DA UNIÃO PROVIDA. HONORÁRIOS.
1. Consta dos autos que, em desfavor da autora, foi lavrado Auto de Infração, com fundamento no artigo art. 107, inciso IV, alínea "e" do Decreto-Lei nº 37/66 com a redação dada pelo art. 77 da Lei n 10.833/03, dando origem ao Processo Administrativo fiscal nº 11128.735024/2013-96, em virtude de prestar informações sobre veículo ou carga transportada, ou sobre operações que executou, não obedecendo a forma e prazos estabelecidos pela Receita Federal do Brasil.
2. A informação intempestiva no que se refere ao registro das cargas para desembarque configura a infração contida no art. 107, IV “e”, do Decreto-Lei nº 37/66, que dispõe que o transportador de cargas provenientes do exterior tem o dever legal de prestar as informações à Receita Federal do Brasil sobre a chegada do veículo e sobre as cargas transportadas, na forma e prazo estabelecidos.
3. Ocorre que, no caso em tela, conforme constou no processo administrativo fiscal referido na inicial, a parte autora descumpriu a obrigação tributária acessória de registrar informações no Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX – CARGA), dentro do prazo legal estipulado, uma vez que referidas informações, que deveriam ter sido prestadas pela consignatária antes da atracação do navio, somente o foram após a consumação do evento, incluídas aqui eventuais alterações (reputadas pela autora como simples alteração de informação já prestada) — incorrendo-se na penalidade prevista no artigo 107, inciso IV, alínea “c”, do Decreto-lei nº 37/1966, com a redação da Lei nº 10.833/2003.
4. Ora, a prestação extemporânea de informações acerca da carga transportada ou das operações realizadas implica em infração, sendo, portanto, legítimo o auto de infração lavrado pela autoridade aduaneira, o qual imputou à apelante multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
5. Ademais a IN RFB nº 899, de 29 de dezembro de 2008, deu a seguinte redação ao caput art. 50 da IN RFB nº 800/2007 (mantendo inalterada as disposições do parágrafo único):"Art. 50. Os prazos de antecedência previstos no art. 22 desta Instrução Normativa somente serão obrigatórios a partir de 1º de abril de 2009. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 899, de 29 de dezembro de 2008)Parágrafo único. O disposto no caput não exime o transportador da obrigação de prestar informações sobre:I - a escala, com antecedência mínima de cinco horas, ressalvados prazos menores estabelecidos em rotas de exceção; e II - as cargas transportadas, antes da atracação ou da desatracação da embarcação em porto no País.
6. Neste contexto, não se discute que os prazos mínimos, estabelecido no art. 22, II, alínea ‘d’, se tornaram obrigatórios a partir de 1º de abril de 2009, por disposição expressa do art. 50, caput, da IN RFB nº 800/2007, com redação dada pela IN RFB nº 899/2008. Igualmente, é inconteste a obrigação do transportador de prestar as informações sobre as cargas transportadas antes da atracação ou desatracação da embarcação e, porto no País, desde 31/03/2008, por expressa previsão do parágrafo único, inciso II, do art. 50 da IN RFB nº 800/2007.
7. No tocante ao argumento da parte de ser simples mandatária, com efeito, a expressão “agente de carga” diz respeito a gênero que abarca todos os agentes de transporte de carga internacional, independente da via (marítima, terrestre, aérea ou lacustre). Nesse toar, o “agente marítimo” é aquele agente de carga que se dedica exclusivamente a carga marítima. Ademais, nos termos do artigo 37 do DL 37/66, o transportador de cargas procedentes do exterior tem o dever legal de prestar informações à Receita Federal do Brasil sobre a chegada do veículo e sobre as cargas transportadas, na forma e no prazo estabelecido pela Receita Federal.
8. Assim, o agente de cargas é considerado qualquer pessoa que em nome do importador ou do exportador contrate o transporte de mercadorias, consolide ou desconsolide cargas e preste serviços conexos, também tem o dever de prestar as informações sobre as operações que executa e respectivas cargas, ou seja, exatamente a atividade da embargante.
9. Outrossim, os atos administrativos gozam de presunção de legitimidade e a presunção de liquidez e certeza (juris tantum) de que se reveste tais atos somente pode ser ilidida por prova inequívoca, o que não ocorreu no presente caso.
10. Destarte, verifica-se que a autoridade fiscal agiu em consonância com o ordenamento jurídico, não havendo que se falar em ilegalidade ou inconstitucionalidade da multa prevista no art. 107, IV, "e" do Decreto-lei 37/66.
11. Muito embora a denúncia espontânea tenha previsão nos art. 138 do CTN e art. 102 e § 2º do Decreto-Lei nº 37/66, tal instituto não se aplica às obrigações acessórias autônomas de caráter administrativo, tal como no caso em tela, uma vez que estas se consumam com a simples inobservância do prazo definido em lei.
12. No caso dos autos, a Autora prestou a destempo as informações do Conhecimento Eletrônico, subsumindo-se a hipótese de infração e destarte, não há nenhuma ofensa à proporcionalidade ou à razoabilidade na aplicação desta multa, tendo em vista o seu nítido caráter punitivo em razão do descumprimento ou cumprimento inexato de obrigação acessória imposta por lei.
13. Considerando a improcedência da demanda, o ônus sucumbencial deve ser invertido, de modo que a autora deve arcar com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85 §4º, III, do Código de Processo Civil.
14. Apelação da União provida.