APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001486-64.2024.4.03.6113
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: EDINALDO MANARIM BARBOSA
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO PEDROSA OLIVEIRA - SP330483-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001486-64.2024.4.03.6113 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS APELANTE: EDINALDO MANARIM BARBOSA Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO PEDROSA OLIVEIRA - SP330483-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator): Trata-se de ação destinada a viabilizar o restabelecimento do benefício de incapacidade e/ou a concessão do auxílio-acidente. Foi proferida sentença de indeferimento da petição inicial por falta de interesse de agir em relação ao pedido de auxílio-acidente, nos termos do artigo 321, do Código de Processo Civil e declarou a decadência em relação à revisão do benefício concedido em 27/07/2011 (ID 300370306). A parte autora interpôs apelação visando a nulidade da sentença com base do Tema 350/STF (ID 300370308), o que foi acolhido por esta Corte, com determinação de novo julgamento (ID 304860696). O processo retornou à origem e em seguida o juízo determinou em decisão (ID 324413731) que a parte autora emendasse a inicial “a) juntando a cópia integral do procedimento administrativo, incluídos eventuais laudos de análise técnica; b) esclarecendo as possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial discutida, nos termos acima, ambos sob pena de extinção; c) manifestando-se sobre o interesse na tramitação do feito pelo juízo 100% digital. (...) Cumpridas as providências, voltem conclusos para designação de perícia médica, se o caso.” A parte autora fez a emenda da inicial juntando o processo administrativo do benefício de incapacidade (ID 324415883) e cópia dos resultados das perícias administrativas (ID 324415884). Nova sentença foi proferida (ID 324415886) indeferindo a petição inicial e por conseguinte, julgou extinto o feito sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 485, inciso I, do Código de Processo Civil. Transcrevo trecho a decisão: “A decisão de ID 351130166 determinou à parte autora a emenda da inicial, para a juntada ao feito da cópia do procedimento administrativo, incluídos eventuais laudos de análise técnica; para que a inicial preencha os requisitos previstos no art. 129 da Lei n. 8.213/1991 notadamente, as possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial discutida. O autor deixou, contudo, de cumprir integralmente a determinação de emenda, não indicando as possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial discutida, referindo apenas que “avaliação medico-pericial realizada no INSS concedeu benefício de auxílio doença de 04/06/2011 a 04/10/2011, porém trata- se de sequela GRAVE, estando parcialmente incapaz para o trabalho; O apontamento de inconsistências consiste na articulação dos eventuais erros das conclusões do perito, para além da mera discordância, precisamente para contornar o mau, vez de meramente sobrepor a perícia judicial à administrativa, como se o Judiciário fosse órgão recursal do INSS. Sem o apontamento referido, isto é, sem atendimento completo da emenda, a extinção é de rigor, como advertido. Do exposto: 1. Indefiro a petição inicial e julgo extinto o feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, I, do Código de Processo Civil. 2. Custas pela parte autora, suspenso o recolhimento ante a gratuidade deferida. 3. Sem condenação em honorários advocatícios, eis que não instalada a relação processual. 4. Intime-se para ciência. 5. Oportunamente, arquivem-se.” Apelação da parte autora (ID 324415887) em que requer a nulidade da sentença. Afirma que as obrigações processuais impostas na decisão judicial foram cumpridas; requer o retorno dos autos à vara de origem para regular processamento do feito. Sem contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001486-64.2024.4.03.6113 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS APELANTE: EDINALDO MANARIM BARBOSA Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO PEDROSA OLIVEIRA - SP330483-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator): Pretende a parte autora o restabelecimento de auxílio-doença ou a concessão de auxílio-acidente desde a cessação administrativa do auxílio-doença, em 07/10/2011. A sentença fundamenta a extinção da ação na falta de cumprimento da determinação judicial que visava a emenda da inicial para indicar as possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial feita pela autarquia para indeferir o benefício, afirmando que “O apontamento de inconsistências consiste na articulação dos eventuais erros das conclusões do perito, para além da mera discordância, precisamente para contornar o mau, vez de meramente sobrepor a perícia judicial à administrativa, como se o Judiciário fosse órgão recursal do INSS.” (ID 324415886) O fundamento para tal exigência estaria na disposição do artigo 129-A, da Lei nº 8.213/91. “Art. 129-A. Os litígios e as medidas cautelares relativos aos benefícios por incapacidade de que trata esta Lei, inclusive os relativos a acidentes do trabalho, observarão o seguinte: (Incluído pela Lei nº 14.331, de 2022) I – quando o fundamento da ação for a discussão de ato praticado pela perícia médica federal, a petição inicial deverá conter, em complemento aos requisitos previstos no art. 319 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil): (Incluído pela Lei nº 14.331, de 2022) a) descrição clara da doença e das limitações que ela impõe; (Incluído pela Lei nº 14.331, de 2022) b) indicação da atividade para a qual o autor alega estar incapacitado; (Incluído pela Lei nº 14.331, de 2022) c) possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial discutida; e (Incluído pela Lei nº 14.331, de 2022) d) declaração quanto à existência de ação judicial anterior com o objeto de que trata este artigo, esclarecendo os motivos pelos quais se entende não haver litispendência ou coisa julgada, quando for o caso; (Incluído pela Lei nº 14.331, de 2022)”. A rigor, o que o artigo 129-A da Lei nº 8.213/91 exige não é um exame técnico aprofundado na peça inicial sobre os motivos do indeferimento do pedido administrativo, mas sim a exposição dos elementos fáticos que motivaram a sua pretensão. Na análise dos autos, verifico que a petição inicial fez um quadro descritivo, demonstrando, um a um, o preenchimento dos requisitos para a formulação do pedido judicial. Juntou documentos e anexou o processo administrativo relativo à incapacidade por exigência do d. juiz: descrição da doença/limitações que o segurado possui: sequela incapacitante causada por fratura exposta do rádio com lesões dos tendões, exigindo a realização de cirurgia; indicação da atividade para a qual o autor alega estar incapacitado: sapateiro/aparador e prespontador porque os movimentos realizados de maneira repetitiva são incompatíveis com as lesões apresentadas (ID 324415883 – Págs. 30/44); possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial discutida: afirma que há redução da capacidade decorrente da lesão que causa incapacidade para o trabalho. O laudo pericial administrativo afirma que não existe incapacidade (ID 324415883 – Pág. 45); Declaração quanto à existência de ação judicial anterior com o mesmo objeto esclarecendo os motivos pelos quais se entende não haver litispendência ou coisa julgada, quando for o caso: não houve propositura de outra ação. Logo, o que a lei de benefícios exigiu foi cumprido. A exigência feita pelo Juízo a quo deixou de considerar a vulnerabilidade do segurado na relação com a autarquia, não sendo exigível que o autor faça um estudo médico sobre sua incapacidade a fim de pleitear o que considera como seu direito. Tal encargo cabe, no caso, ao perito judicial, que como assistente do juízo, de forma imparcial, aclarará a questão para a resolução do conflito instaurado. Assim, a exigência de um juízo valorativo médico por parte do segurado extrapola a razoabilidade e ignora sua condição de vulnerabilidade, transferindo-lhe um ônus técnico que compete ao perito judicial, profissional imparcial encarregado da análise especializada. Neste contexto, ficou caracterizado o cumprimento dos requisitos exigidos pela legislação brasileira para o ajuizamento de ação, visando à obtenção de benefício previdenciário por incapacidade. Por conseguinte, impõe-se a anulação da sentença de 1º grau para garantir o regular processamento do feito, com citação da autarquia e produção de prova pericial, assegurando-se o contraditório e a ampla defesa. Por tais fundamentos, dou provimento à apelação da parte autora para anular a sentença de 1º grau e determinar o retorno dos autos à vara de origem para regular processamento do feito, devendo haver a citação da autarquia e a determinação de perícia médica judicial e novo julgamento. É o voto.
Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5001486-64.2024.4.03.6113 |
Requerente: | EDINALDO MANARIM BARBOSA |
Requerido: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 129-A DA LEI Nº 8.213/91. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. VULNERABILIDADE DO SEGURADO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RETORNO À ORIGEM. RECURSO PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Ação previdenciária proposta com o objetivo de restabelecimento de auxílio-doença ou concessão de auxílio-acidente. A petição inicial foi indeferida sob o fundamento de não ter sido cumprida integralmente a determinação judicial para emenda, notadamente quanto à indicação das possíveis inconsistências da perícia administrativa. A sentença extinguiu o feito sem resolução de mérito, com base no art. 485, I, do CPC/2015.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão consiste em definir se a parte autora atendeu aos requisitos do art. 129-A da Lei nº 8.213/91, especialmente no que tange à identificação das possíveis inconsistências da perícia médica administrativa, de modo a viabilizar o regular prosseguimento da demanda.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A petição inicial descreve com clareza a doença (sequela grave decorrente de fratura exposta do rádio com lesões tendíneas), a atividade exercida (sapateiro/aparador e prespontador), as limitações funcionais enfrentadas e a discordância com o laudo administrativo que atestou ausência de incapacidade.
4. O artigo 129-A da Lei nº 8.213/91 não exige exame técnico aprofundado na peça inicial, mas sim a exposição dos elementos fáticos que motivam a pretensão. Tais requisitos foram atendidos pela parte autora, inclusive com a juntada do processo administrativo e manifestação sobre eventual litispendência.
5. A exigência de um juízo valorativo médico por parte do segurado extrapola o razoável e ignora sua condição de vulnerabilidade, transferindo-lhe um ônus técnico que compete ao perito judicial, profissional imparcial encarregado da análise especializada.
6. Caracterizado o cumprimento da exigência legal, impõe-se a anulação da sentença para garantir o regular processamento do feito, com citação da autarquia e produção de prova pericial, assegurando-se o contraditório e a ampla defesa.
IV. DISPOSITIVO E TESE
7. Apelação da parte autora provida. Sentença anulada. Determinado o retorno dos autos à vara de origem para regular prosseguimento do feito, com citação do INSS, realização de perícia médica e novo julgamento.
Tese de julgamento:
1. A petição inicial em ações de benefício por incapacidade cumpre os requisitos do art. 129-A da Lei nº 8.213/91 quando descreve a doença, as limitações alegadas, a atividade exercida e as razões da discordância com o laudo pericial administrativo.
2. É indevida a exigência de análise técnica aprofundada na inicial, devendo-se considerar a vulnerabilidade do segurado frente à administração.
3. Preenchidos os requisitos legais, deve ser anulada a sentença que extingue o feito sem julgamento do mérito por suposto descumprimento da determinação de emenda da inicial.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incisos XXXV e LV; CPC/2015, arts. 319, 321 e 485, I; Lei nº 8.213/91, art. 129-A.
Jurisprudência relevante citada:
– STF, RE 631.240/MG (Tema 350), Rel. Min. Roberto Barroso, j. 03.09.2014.
– STJ, EDcl no AgRg no AREsp 837.634/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 12/05/2016.