APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005529-05.2023.4.03.6202
RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO
APELANTE: HEVAIR SANTOS PRUDENCIO, JAQUELINE LIMA PERES PRUDENCIO
Advogados do(a) APELANTE: JOAO OTAVIO PEREIRA - SP441585-A, ROSANA BARBOZA DE OLIVEIRA - SP375389-A, VITOR RODRIGUES SEIXAS - SP457767-A
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogados do(a) APELADO: ANA PAULA MOURA GAMA - BA834-A, DIEGO MARTIGNONI - RS65244-A, FERNANDO ANDRE PINHEIRO GOMES JUNIOR - MA20211-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005529-05.2023.4.03.6202 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: HEVAIR SANTOS PRUDENCIO, JAQUELINE LIMA PERES PRUDENCIO Advogados do(a) APELANTE: JOAO OTAVIO PEREIRA - SP441585-A, ROSANA BARBOZA DE OLIVEIRA - SP375389-A, VITOR RODRIGUES SEIXAS - SP457767-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) APELADO: ANA PAULA MOURA GAMA - BA834-A, DIEGO MARTIGNONI - RS65244-A, FERNANDO ANDRE PINHEIRO GOMES JUNIOR - MA20211-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada por HEVAIR SANTOS PRUDENCIO E OUTROS em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF, com pedido de tutela antecipada, objetivando a revisão do contrato de mútuo para aquisição de imóvel com alienação fiduciária em garantia, celebrado em 21/10/2019, eivado de supostas cláusulas abusivas. Em contestação, a CEF sustenta, em síntese, a inexistência de abusividades, a legalidade da pactuação e a aplicação do princípio do Pacta Sunt Servanda. Em cumprimento ao despacho (ID 328634513), os autos foram encaminhados ao setor de cálculos para a verificação das supostas irregularidades aventadas. Informações prestadas pelo setor de cálculos judiciais (ID 328634515). A sentença julgou improcedente o pedido de revisão contratual c.c. repetição de indébito e condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados nos valores mínimos previstos no §3º do artigo 85 do CPC, atualizado e acrescido de juros, observada a condição prevista no §3º do artigo 98 do Código de Processo Civil. Em apelação, a parte autora alega que o contrato entabulado deixa de informar que o sistema de amortização adotado (método SAC) enseja a cobrança de juros em regime composto, com capitalização mensal, onerando excessivamente o mutuário. Aduz, ainda, a ilegalidade da taxa de administração contratual e da cobrança do seguro habitacional obrigatório, por configurar venda casada. Requer a reforma da sentença para que seja determinada a revisão contratual com a substituição do sistema de amortização SAC (juros compostos) pelo método GAUSS (juros linear), e a conseqüente repetição do indébito, além da condenação da ré ao pagamento das verbas de sucumbência. Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte Regional. É o relatório. AFS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005529-05.2023.4.03.6202 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: HEVAIR SANTOS PRUDENCIO, JAQUELINE LIMA PERES PRUDENCIO Advogados do(a) APELANTE: JOAO OTAVIO PEREIRA - SP441585-A, ROSANA BARBOZA DE OLIVEIRA - SP375389-A, VITOR RODRIGUES SEIXAS - SP457767-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) APELADO: ANA PAULA MOURA GAMA - BA834-A, DIEGO MARTIGNONI - RS65244-A, FERNANDO ANDRE PINHEIRO GOMES JUNIOR - MA20211-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Em apelação, a parte autora alega que o contrato entabulado deixa de informar que o sistema de amortização adotado (método SAC) enseja a cobrança de juros em regime composto, com capitalização mensal, onerando excessivamente o mutuário. Aduz, ainda, a ilegalidade da taxa de administração contratual e da cobrança do seguro habitacional obrigatório, por configurar venda casada. Requer a reforma da sentença para que seja determinada a revisão contratual com a substituição do sistema de amortização SAC (juros compostos) pelo método GAUSS (juros linear), e a conseqüente repetição do indébito, além da condenação da ré ao pagamento das verbas de sucumbência. Do sistema de amortização O contrato de mútuo é uma das essências da atuação das instituições financeiras, que emprestam determinado montante de dinheiro e se remuneram pela cobrança da taxa de juros. Atualmente, no mercado, existem sistemas de amortização que são mais utilizados, dentre eles, o Sistema de Amortização Constante – SAC, adotado no contrato em questão. A base do sistema SAC é adotar amortização constante e gerar prestações variáveis em regime decrescente ao longo do tempo. Mensalmente, o devedor quita uma prestação de valor fixo e uma quantia relacionada aos juros. A adoção do sistema SAC, por si só, não implica irregularidade contratual. Compete ao devedor comprovar a ocorrência de outros fatores que, aliados ao sistema SAC de amortização, afetem o equilíbrio do contrato. Por certo, incabível a substituição unilateral do sistema de amortização, sob pena de evidente ofensa à autonomia da vontade privada. Da aplicabilidade dos juros No que tange à taxa de juros, dispõe o art. 192 da CF/88 com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 40/2003: “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram”. A citada emenda revogou o § 3º do art. 192, que previa que as taxas de juros reais não poderiam ser superiores a 12% ao ano, sob pena da cobrança superior a este limite ser enquadrada como crime de usura, punido nos termos que a lei determinar. A Lei Complementar regulamentadora, entretanto, nunca foi editada. Sobre a matéria, o c. STF editou a súmula vinculante nº 07, que dispõe: “A norma do §3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar”. A Lei da usura (Decreto nº 22.626/33) dispõe sobre os juros nos contratos e veda expressamente a incidência de taxas superiores a 12% ao ano e juros compostos, de acordo com os arts. 4º e 5º e não se aplica às instituições financeiras por força da Lei 4.595/64, que dispõe sobre política e as instituições bancárias, monetárias e creditícias, excluindo a aplicação nas operações e serviços bancários do limite de juros previstos da Lei da Usura, e fixando que devem ser observadas as normas editadas pelo Conselho Monetário Nacional – CMN e Banco Central – BACEN. Vejamos as disposições: “Art. 4º Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República: (...) IX - Limitar, sempre que necessário, as taxas de juros, descontos comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central da República do Brasil, assegurando taxas favorecidas aos financiamentos que se destinem a promover” Confirmando a inaplicabilidade da Lei de Usura, sobreveio a súmula 596 do C. STF, in verbis: “As disposições do Decreto 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional”. Com isso, conclui-se que não há impedimento legal para cobrança de taxa de juros superior a 12% ao ano, quando se trata de instituição integrante do Sistema Financeiro Nacional – SFN. Neste sentido, foi o julgamento do REsp repetitivo nº 1.061.530/RS de relatoria da Min. Nanci Andrighi, julgado em 22/10/2008, cujo informativo segue abaixo transcrito: “No julgamento de recurso repetitivo (art. 543-C do CPC), confirmou-se a pacificação da jurisprudência da Segunda Seção deste Superior Tribunal nas seguintes questões. Quanto aos juros remuneratórios: 1) as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Dec. n. 22.626/1933), como já dispõe a Súm. n. 596-STF; 2) a simples estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano não indica abusividade; 3) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/2002; 4) é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada, diante das peculiaridades do caso concreto. Quanto à configuração da mora: 1) afasta a caracterização da mora a constatação de que foram exigidos encargos abusivos no contrato, durante o período da normalidade contratual; 2) não afasta a caracterização da mora quando verificada a simples propositura de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual. Quanto aos juros moratórios: nos contratos bancários não alcançados por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês. Quanto à inscrição em cadastro de inadimplentes: 1) a abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: a) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; b) ficar demonstrada que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; c) for depositada a parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz; 2) a inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção. Quanto às disposições de ofício: é vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. A Min. Relatora e o Min. Luís Felipe Salomão ficaram vencidos nesse específico ponto. Anote-se, por último, que as questões a respeito da capitalização dos juros e a comissão de permanência não foram tratadas. REsp 1.061.530-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/10/2008”. Sobreveio a súmula 382 do c. STJ, segundo a qual “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. O entendimento é repetido ainda hoje nos julgamentos do C. STJ, vejamos: “79210510 - AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. VIOLAÇÃO. ARTS. 394, 396 E 591 DO CC E 525, § 1º, DO CPC. CERCEAMENTO DE DEFESA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. AUSÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO PERMITIDA. NÃO PROVIMENTO. 1. A ausência de pertinência temática entre o dispositivo legal tido por violado e razões levantadas no Recurso Especial ou os fundamentos do acórdão de segundo grau atrai o disposto no verbete n. 284 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. 2. "A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RESP nº 1.061.530/RS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, submetido ao regime dos recursos repetitivos, firmou posicionamento do sentido de que: (1) as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto nº 22.626/1933) - Súmula nº 596/STF; (2) a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; (3) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591, c/c o art. 406 do CC/2002; e, (4) é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, haja vista as peculiaridades do julgamento em concreto. " (AgInt no AREsp n. 1.148.927/MS, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 22/3/2018, DJe de 4/4/2018.) 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ; AgInt-AREsp 2.091.280; Proc. 2022/0078732-1; RJ; Quarta Turma; Relª Min. Maria Isabel Gallotti; DJE 11/04/2023)” Embora a Súmula nº 121 do Supremo Tribunal Federal tenha estabelecido ser vedada “a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada”, a Corte Constitucional, posteriormente, editou outro entendimento por meio da Súmula nº 596, já mencionada: "as disposições do Dec. n. 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional". Após, a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, reeditada por medidas provisórias posteriores até a MP n 2.170-36/2001, passou a autorizar de forma expressa a capitalização de juros, desde que pactuada, nos moldes do art. 5º. A norma foi objeto do Tema 33 de repercussão geral do c. STF que resultou na edição da Tese a seguir indicada: “Os requisitos de relevância e urgência previstos no art. 62 da Constituição Federal estão presentes na Medida Provisória 2.170-36/2001, que autoriza a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional”. Abaixo a ementa do citado julgamento: “10274250 - CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO. 1. A jurisprudência da suprema corte está consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência. 2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país. 3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados. 4. Recurso extraordinário provido. (STF; RE 592377; Tribunal Pleno; Rel. Des. Marco Aurélio; Julg. 04/02/2015; DJE 20/03/2015; Pág. 65)”. Corroborando o entendimento, é a redação da súmula 539 do c. STJ, in verbis: “É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada”. E o julgamento do REsp repetitivo nº 973.827/RS de relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 08/08/12, abaixo transcrito: “EMENTA. CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO. 1. A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros. 2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de "taxa de juros simples" e "taxa de juros compostos", métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933. 3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada". 4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios. 5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado de inadimplência, que decorre da falta de demonstração da abusividade das cláusulas contratuais questionadas. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido”. Cumpre ressaltar, ainda, que a simples previsão de taxas de juros efetiva e nominal não configura capitalização indevida de juros, mas sim, indica o processo de definição da taxa de juros pelo método composto. Ademais, em relação aos contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, a Lei 11.977, de 07/07/2009, alterou a Lei 4.380/64, que passou a dispor no art. 15-A o seguinte: "É permitida a pactuação de capitalização de juros com periodicidade mensal nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro da Habitação - SFH." Conclui-se, assim, que, considerando a previsão legal explícita, não é necessária a prova técnica para verificar a possível capitalização mensal dos juros em contratos firmados após a entrada em vigor da Lei 11.977, de 07/07/2009. No caso em tela, o contrato com a CEF foi firmado em data posterior ao advento da Lei 11.977/2009. Acrescente-se que, segundo a Lei 9.514/97, que rege o Sistema Financeiro de Habitação, a capitalização dos juros é condição essencial ao negócio, conforme alude o inciso III do art. 5º: Art. 5º As operações de financiamento imobiliário em geral, no âmbito do SFI, serão livremente pactuadas pelas partes, observadas as seguintes condições essenciais: I - reposição integral do valor emprestado e respectivo reajuste; II - remuneração do capital emprestado às taxas convencionadas no contrato; III - capitalização dos juros; IV - contratação, pelos tomadores de financiamento, de seguros contra os riscos de morte e invalidez permanente. No caso, no tocante ao método de aplicação dos juros, o contrato firmado entre as partes prevê as condições de financiamento, estabelecendo, além do sistema de amortização SAC (item B.2 do Quadro Resumo), a taxa de juros balcão anual de 4,8411% (nominal) e de 4,9500% (efetiva). Ademais, segundo informações prestadas pelos setor de cálculos da Justiça Federal, não se constatou a capitalização de juros no caso. Não se vislumbra, portanto, cobrança de juros ou forma de cálculo de amortização em desacordo com as práticas usuais do mercado, tampouco prática abusiva. Da contratação do seguro A contratação de seguro é obrigatória quando da celebração de contratos no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação – SFH por expressa disposição do art. 5º, inciso IV da Lei 9.514/97. O mutuário, entretanto, tem a faculdade de contratar seguradora diversa daquela indicada pela CEF, nos termos da súmula 473 do C. STJ, in verbis: “O mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada”. A parte autora não comprovou que foi compelida a contratar o seguro. As disposições relacionadas ao seguro também estão expressamente disciplinadas no contrato, inclusive quanto às respectivas condições e pagamento do prêmio. Da taxa de administração Em relação à taxa de administração, importa observar que a própria Lei 8.036/1990, que dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, atribuiu ao Conselho Curador do FGTS a fixação de normas e valores de remuneração do agente operador e dos agentes financeiros envolvidos nas operações de financiamento (art. 5º, VIII). Exercendo essa atribuição, foi editada, pelo Conselho Curador, a Resolução nº 702, de 04/10/2012, de acordo com a qual exclusivamente nas operações com pessoas físicas, será cobrado um valor máximo de R$ 25,00 referente à taxa de administração (art. 38). Por sua vez, o Banco Central do Brasil – BACEN editou a Resolução nº 4.676, de 31/07/2018, que dispõe, dentre outros assuntos, sobre os integrantes do Sistema Financeiro de Habitação – SFH, ao qual também se insere o contrato ora analisado. Conforme disposto no ato normativo, art. 14, as operações no âmbito do SFH podem incluir tarifas mensais de administração de contrato limitada a R$ 25,00 pela prestação desse serviço a pessoas naturais. No contrato, a referida taxa está prevista, dentre outros dispositivos, no Item B.10.1 do Quadro Resumo (ID 328634378). A partir desse cenário, percebe-se que a taxa de administração encontra fundamento em lei e foi prevista contratualmente, não havendo que se falar em abusividade a ser reparada judicialmente. Não é outro o entendimento do C. STJ e desta E. Turma: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL. COBRANÇA DE TAXAS DE ADMINISTRAÇÃO E DE RISCO DE CRÉDITO. FINANCIAMENTOS CONTRAÍDOS JUNTO À CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. RECURSOS DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO. CONSELHO CURADOR. ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA PREVISTA EM LEI. ABUSIVIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. INFORMAÇÃO AO CONSUMIDOR E FUNDAMENTO EM LEI. 1. Ação ajuizada em 13/07/07. Recurso especial interposto em 08/05/15 e atribuído ao gabinete em 25/08/18. 2. Ação civil pública ajuizada sob o fundamento de existir abusividade na cobrança de taxa de administração e taxa de risco de crédito em todos os financiamentos habitacionais, na qual se requer a suspensão da cobrança e a devolução aos mutuários dos valores indevidamente pagos. 3. O propósito recursal consiste em definir sobre a legalidade da cobrança de taxa de administração e taxa de risco de crédito do agente operador, nos contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), entre mutuários e a Caixa Econômica Federal (CEF). 4. O FGTS é regido por normas e diretrizes estabelecidas por um Conselho Curador, composto por representação de trabalhadores, empregadores e órgãos e entidades governamentais, na forma estabelecida pelo Poder Executivo. Já a gestão da aplicação do fundo é efetuada pelo Ministério da Ação Social, cabendo à CEF o papel de agente operador, nos termos do art. 4º, da Lei 8.036/90. 5. Por ordem de estrita legalidade foi atribuída a competência ao Conselho Curador do FGTS (CCFGTS) de estabelecer as diretrizes e os programas de alocação de todos os recursos do FGTS, em consonância com a política nacional de desenvolvimento urbano e as políticas setoriais de habitação popular, saneamento básico e infra-estrutura urbana estabelecidas pelo Governo Federal. 6. Além de acompanhar e avaliar a gestão econômica e financeira dos recursos, bem como os ganhos sociais e o desempenho dos programas aprovados, compete ao Conselho Curador fixar as normas e valores de remuneração do agente operador e dos agentes financeiros (art. 5º, I, II, VIII, da Lei 8.036/90). 7. A previsão em contrato da taxa de administração e da taxa de risco de crédito encontra fundamento em lei e, uma vez informada ao consumidor, não há se falar em abusividade a ser reparada judicialmente. 8. Recurso especial conhecido e não provido”. (REsp n. 1.568.368/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 11/12/2018, DJe de 13/12/2018.) PROCESSO CIVIL. CONTRATO DE MÚTUO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REVISÃO CONTRATUAL. REGULARIDADE DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. SEGURO HABITACIONAL. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. O contrato é um negócio jurídico bilateral que retrata o acordo de vontades com o fim de criar, modificar ou extinguir direitos, gerando com isso obrigações aos envolvidos. 2. A cobrança da taxa de administração está prevista no contrato livremente pactuado entre as partes, incluindo-se nos acessórios que compõem o encargo mensal, além de não contrariar norma de ordem pública, não havendo, portanto, que se falar em abusividade. 3. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, ao se debruçar sobre a questão, firmou entendimento no sentido de que a própria lei atribuiu competência ao conselho curador do FGTS para estabelecer as diretrizes e os programas de alocação de todos os recursos do fundo, competindo ao referido conselho fixar normas e valores de remuneração do agente operador e dos agentes financeiros. 4. A referida taxa, ademais, pode ser cobrada no valor de até R$ 25,00 por mês, exclusivamente nas operações com pessoas físicas, nos termos do art. 38 da Resolução nº 702, de 04.10.2012, do Conselho Curador do FGTS e do art. 14, II da Resolução CMN nº 4.676, de 31.07.2018. 5. No que diz respeito ao seguro, o artigo 14 da Lei nº 4.380/64 dispõe ser obrigatória a contratação para os imóveis que são objeto de financiamento no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, conforme artigos 20 e 21 do Decreto-Lei nº 70/1966. 6. Ainda que seja de livre escolha do mutuário a seguradora que melhor lhe aprouver, cumpria à parte autora demonstrar a recusa do agente financeiro em aceitar a contratação com empresa diversa ou a proposta de cobertura securitária por outra companhia, o que não configura “venda casada”. Precedente. 7. Se a autora, no momento da contratação, não manifestou a intenção de contratar seguradora de sua escolha, é possível concluir que houve a aceitação da seguradora convencionada, mormente porque as cláusulas do contrato dão ciência aos autores acerca da possibilidade de contratação de seguradora diversa, com o que eles concordaram ao assinar o instrumento contratual. 8. Não obstante tratar-se de contrato de adesão, inexiste qualquer dificuldade na interpretação das cláusulas contratuais. Só caberia a mitigação do princípio do “pacta sunt servanda”, com adoção da Teoria da Imprevisão, que autoriza a revisão das obrigações previstas em contrato, se demonstrado que as condições econômicas do momento da celebração se alteraram de tal maneira, em razão de algum acontecimento inevitável, que passaram a gerar para o mutuário extrema onerosidade e para o credor excessiva vantagem, o que não é o caso dos autos. 9. Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005789-59.2021.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 29/02/2024, DJEN DATA: 05/03/2024) Não há prova de cobrança perpetrada pela CEF que não esteja prevista expressamente no contrato ou dissociada das práticas normais ou taxas médias do mercado de financiamento imobiliário. In casu, o contrato de alienação fiduciária em garantia celebrado entre as partes é negócio jurídico válido, ato jurídico perfeito (art. 5º, inciso XXXVI da CF/88) que merece tutela jurisdicional, considerando que não foram trazidos fundamentos para afastar a validade e a eficácia. E, como não foram apuradas irregularidades, o contrato deve ser mantido em seus termos originais, em atenção à segurança jurídica, ao princípio da intervenção mínima e à excepcionalidade da revisão contratual, nos termos do art. 421, parágrafo único e art. 421-A, inciso III, ambos do CC/02, além do princípio da pacta sunt servanda. O devedor não era obrigado a contratar. Assim o fez para construir o próprio patrimônio e tinha no mercado oferta de diversas instituições financeiras atuantes. Se optou livremente por contratar junto a CEF, certamente foi o banco que ofereceu melhores condições, inclusive de juros e taxas. O autor estava ciente, desde a contração, de todos os encargos legais que seriam cobrados, inexistente irregularidade que possa resultar na alteração das bases da negociação, em atenção à segurança jurídica. Não havendo prova de cobrança abusiva, fica afastado o pedido de devolução em dobro (repetição). Dos honorários advocatícios Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, deve ser majorada em 2% a verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, mantida a suspensão da exigibilidade da cobrança, com fulcro no § 3º do artigo 98 do CPC, por ser a parte beneficiária da Justiça Gratuita. Conclusão Ante o exposto, nego provimento à apelação, fixados os consectários na forma da fundamentação acima. Consigno que a oposição de embargos declaratórios infundados pode ensejar aplicação de multa nos termos do art. 1.026, § 2°, do CPC. É como voto.
E M E N T A
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO. CONTRATO DE MÚTUO IMOBILIÁRIO. SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO CONSTANTE (SAC). CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. SEGURO HABITACIONAL. REVISÃO CONTRATUAL INDEVIDA. RECURSO DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. A parte autora sustenta a ilegalidade da capitalização de juros no sistema de amortização SAC, alegando cobrança excessiva e oneração indevida do mutuário. Argumenta também que a taxa de administração e a imposição do seguro habitacional configuram venda casada. Pede a substituição do sistema de amortização para o método GAUSS e a repetição do indébito.
II. Questão em discussão
2. Há três questões em discussão: (i) saber se há ilegalidade ou abusividade na adoção do sistema SAC de amortização; (ii) saber se a contratação de seguro habitacional foi imposta de forma irregular; e (iii) saber se a taxa de administração cobrada encontra respaldo legal e contratual.
III. Razões de decidir
3. A adoção do sistema SAC, com amortizações constantes e prestações decrescentes, é usual e não caracteriza por si só cláusula abusiva ou prática irregular.
4. As instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional estão autorizadas a estipular taxas de juros superiores a 12% ao ano e a capitalização mensal, desde que expressamente pactuada, conforme entendimento do STF, do STJ e da legislação de regência.
5. A contratação de seguro habitacional é obrigatória no SFH, e não foi comprovada imposição de contratação com seguradora vinculada à instituição financeira.
6. A taxa de administração está prevista contratualmente e tem respaldo legal em resoluções do Conselho Curador do FGTS e do Banco Central, sendo limitada ao valor máximo legalmente estipulado.
7. Não restou demonstrado qualquer vício de consentimento, abuso de direito ou prática bancária lesiva ao consumidor.
8. Ausente comprovação de cobrança indevida, descabe a restituição em dobro de valores.
9. Verba honorária majorada para 12% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §11, do CPC, observada a gratuidade judiciária.
IV. Dispositivo e tese
10. Recurso desprovido.
Tese de julgamento: “1. A utilização do sistema de amortização SAC não configura, por si só, cobrança abusiva de juros. 2. A capitalização de juros é permitida nos contratos firmados com instituições do Sistema Financeiro Nacional, desde que pactuada."
Dispositivos relevantes citados: Lei 9.514/97, art. 5º, IV; Resolução 702/2012 do Conselho Curador do FGTS.
Jurisprudência relevante citada: STF, Súmula Vinculante 07; STJ, Súmula 382; STJ, REsp repetitivo nº 1.061.530/RS, Rel. Min. Nanci Andrighi, j. 22/10/2008; STJ, REsp repetitivo nº 973.827/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 08/08/2012.