Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014051-66.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

AGRAVANTE: BAMS PARTICIPACOES S/A

Advogados do(a) AGRAVANTE: CARLOS ALBERTO DE MELLO IGLESIAS - SP162566-A, DANILO SILVA ORLANDO - SP305569-A, ERICO RODRIGUES PILATTI - SP235366-A, GIOVANNA SANTANA LOPES - SP469449, KELZER HERNANDES - SP486328

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014051-66.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

AGRAVANTE: BAMS PARTICIPACOES S/A

Advogados do(a) AGRAVANTE: CARLOS ALBERTO DE MELLO IGLESIAS - SP162566-A, DANILO SILVA ORLANDO - SP305569-A, ERICO RODRIGUES PILATTI - SP235366-A, GIOVANNA SANTANA LOPES - SP469449, KELZER HERNANDES - SP486328

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator):  Trata-se de agravo de instrumento interposto BAMS PARTICIPACOES S/A, em face de decisão que, em mandado de segurança, indeferiu a liminar objetivando a suspensão da exigibilidade do IRRF incidente sobre a cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, exigida pelo art. 27 da Lei 14.754/2023.

A recorrente alega, em síntese, que é um fundo fechado e, como regra, estava sujeita à tributação pelo Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre os seus rendimentos apenas nos casos de amortização de seu patrimônio líquido ou de liquidação do fundo, sendo que o art. 26 da Lei 14.754/23 determinou a obrigatoriedade de recolhimento de tal imposto no último dia útil dos meses de maio e novembro, caso não ocorra antes a distribuição de rendimentos, amortização ou do resgate de cotas. Sustenta que a variação positiva do valor patrimonial das cotas de fundo de investimento não corresponde a um direito novo, mas uma expectativa de direito decorrente de um investimento já incorporado ao patrimônio, dado que as cotas podem sofrer variação negativa.

Pleiteia a concessão de efeito suspensivo para: “a) suspender a exigibilidade do IRRF supostamente incidente sobre a variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023 (diferença entre valor a mercado nessa data e o custo de aquisição/ integralização das cotas), consoante inconstitucional e ilegal determinação contida no art. 27 da Lei 14.754; b) permitir que o fundo efetue distribuições ou repasses de recursos à Agravante e novos investimentos durante a vigência da liminar; e, c) determinar que a d. Agravada se abstenha de praticar qualquer ato de cobrança do tributo em questão contra a Impugnante ou o Administrador do fundo que poderá ser alterado a qualquer tempo.” (id 291632160)

O pedido de tutela foi parcialmente deferido.

A agravante e a União opuseram embargos de declaração da decisão que apreciou o pedido de tutela.

A agravada apresentou contraminuta.

O Ministério Público Federal manifestou-se pela desnecessidade de sua intervenção no feito.

É o relatório. 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014051-66.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

AGRAVANTE: BAMS PARTICIPACOES S/A

Advogados do(a) AGRAVANTE: CARLOS ALBERTO DE MELLO IGLESIAS - SP162566-A, DANILO SILVA ORLANDO - SP305569-A, ERICO RODRIGUES PILATTI - SP235366-A, GIOVANNA SANTANA LOPES - SP469449, KELZER HERNANDES - SP486328

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): De se ressaltar, inicialmente, que nenhuma das partes trouxe aos autos qualquer argumento apto a infirmar o entendimento já manifestado quando da apreciação do pedido de antecipação de tutela, cuja decisão foi lavrada nos seguintes termos:

“Trata-se de agravo de instrumento interposto BAMS PARTICIPACOES S/A, em face de decisão que, em mandado de segurança, indeferiu a liminar objetivando a suspensão da exigibilidade do IRRF incidente sobre a cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, exigida pelo art. 27 da Lei 14.754/2023.

A recorrente alega, em síntese, que é um fundo fechado e, como regra, estava sujeita à tributação pelo Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre os seus rendimentos apenas nos casos de amortização de seu patrimônio líquido ou de liquidação do fundo, sendo que o art. 26 da Lei 14.754/23 determinou a obrigatoriedade de recolhimento de tal imposto no último dia útil dos meses de maio e novembro, caso não ocorra antes a distribuição de rendimentos, amortização ou do resgate de cotas. Sustenta que a variação positiva do valor patrimonial das cotas de fundo de investimento não corresponde a um direito novo, mas uma expectativa de direito decorrente de um investimento já incorporado ao patrimônio, dado que as cotas podem sofrer variação negativa.

Pleiteia a concessão de efeito suspensivo para:

“a) suspender a exigibilidade do IRRF supostamente incidente sobre a variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023 (diferença entre valor a mercado nessa data e o custo de aquisição/ integralização das cotas), consoante inconstitucional e ilegal determinação contida no art. 27 da Lei 14.754;

b) permitir que o fundo efetue distribuições ou repasses de recursos à Agravante e novos investimentos durante a vigência da liminar; e,

c) determinar que a d. Agravada se abstenha de praticar qualquer ato de cobrança do tributo em questão contra a Impugnante ou o Administrador do fundo que poderá ser alterado a qualquer tempo.” (id 291632160)

 Decido.

O Código de Processo Civil vigente prevê expressamente, no caput do art. 9º e em seu parágrafo único, inc. I, que a concessão de tutela provisória de urgência, antes do contraditório, é medida excepcional. E, conforme art. 300 do CPC, para que referida tutela seja concedida, devem estar presentes dois requisitos: a probabilidade do direito e a evidente situação de urgência.

A parte recorrente impetrou mandado de segurança, objetivando suspender a exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) incidente sobre a variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, conforme determinado pelo art. 27 da Lei 14.754/23.

A exigência antecipada de IRRF sobre os rendimentos dos Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDC) fechados – tal qual o caso em análise, em que a impetrante é única detentora das cotas do EXP 1 Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não Padronizados, CNPJ 17.024.362/0001-15 (EXP 1 FIDC) - , foi introduzida pela Lei 14.754/23.

De acordo com a redação do art. 26 da Lei 14.754/23:

“Art. 26. Os rendimentos das aplicações nos FIPs, nos ETFs e nos FIDCs que não forem classificados como entidades de investimentos ficarão sujeitos à retenção na fonte do IRRF à alíquota de 15% (quinze por cento), nas datas previstas nos incisos I e II do caput do art. 17 desta Lei”

Os incisos I e II do art. 17 da Lei 14.754/23 acima mencionada, por sua vez, estabelecem as seguintes datas para retenção na fonte do IRRF incidente sobre os rendimentos das aplicações dos fundos de investimento:

I - no último dia útil dos meses de maio e novembro; ou

II - na data da distribuição de rendimentos, da amortização ou do resgate de cotas, caso ocorra antes.

Anteriormente à referida alteração legislativa, a incidência do IRRF sobre os rendimentos auferidos pelos FIDC fechados ocorria apenas na distribuição de rendimentos, amortização, resgate ou venda de cotas, às alíquotas regressivas de 22,5% a 15%, de acordo com o prazo do investimento e a categorização da carteira do fundo como de longo ou curto prazo.

Ocorre que, ao introduzir essa nova tributação antecipada, a Lei 14.754/23 pretendeu atingir fatos geradores ocorridos anteriormente à sua vigência. Vejamos a redação de seu art. 27:

“Art. 27. Os rendimentos apurados até 31 de dezembro de 2023 nas aplicações nos fundos de investimento que não estavam sujeitos até o ano de 2023 à tributação periódica nos meses de maio e novembro de cada ano e que estarão sujeitos à tributação periódica a partir do ano de 2024, com base nos arts. 17 ou 26 desta Lei, serão apropriados pro rata tempore até 31 de dezembro de 2023 e ficarão sujeitos à incidência do IRRF à alíquota de 15% (quinze por cento).

§ 1º Os rendimentos de que trata o caput deste artigo corresponderão à diferença positiva entre o valor patrimonial da cota em 31 de dezembro de 2023, incluídos os rendimentos apropriados a cada cotista, e o custo de aquisição calculado de acordo com as regras previstas nos §§ 2º, 3º e 4º do art. 17 desta Lei.”

Portanto, o art. 27 da Lei 14.754/23 determinou a incidência do IRRF sobre os rendimentos auferidos em data anterior ao início de sua vigência, estabelecendo que a base de cálculo de tal tributação seria o valor da diferença positiva entre o valor patrimonial da cota em 31/12/23 – incluindo eventuais rendimentos apropriados pelos cotistas – e o valor do respectivo custo de aquisição.

Nesse ponto, vislumbro que a nova lei não respeitou o princípio da irretroatividade da lei tributária, previsto no art. 150, III, “a”, da CF/88, com a seguinte redação:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;”

Verifica-se, em exame preambular da questão, que a nova lei, que passou a produzir efeitos somente a partir de 1/1/2024, não poderia incidir sobre os rendimentos auferidos até 31/12/23, pois tais fatos geradores ocorreram anteriormente a sua vigência.

Nesse mesmo sentido foi o entendimento do STF em situação substancialmente análoga, em que a MP 2.158-35 em seu art. 74 determinou a antecipação, para 31 de dezembro de cada ano, do IRPJ e da CSLL devidos sobre os lucros auferidos no exterior por pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, e o seu parágrafo único, por sua vez, determinou a tributação antecipada obrigatória de todo lucro auferido anteriormente, entre 1996 e 2001. 

Na ocasião, o STF entendeu que tal tributação retroativa não seria possível, por violar os princípios da anterioridade e da irretroatividade da lei tributária, previstos na Constituição Federal.

“TRIBUTÁRIO. INTERNACIONAL. IMPOSTO DE RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA. PARTICIPAÇÃO DE EMPRESA CONTROLADORA OU COLIGADA NACIONAL NOS LUCROS AUFERIDOS POR PESSOA JURÍDICA CONTROLADA OU COLIGADA SEDIADA NO EXTERIOR. LEGISLAÇÃO QUE CONSIDERA DISPONIBILIZADOS OS LUCROS NA DATA DO BALANÇO EM QUE TIVEREM SIDO APURADOS (“31 DE DEZEMBRO DE CADA ANO”). ALEGADA VIOLAÇÃO DO CONCEITO CONSTITUCIONAL DE RENDA (ART. 143, III DA CONSTITUIÇÃO). APLICAÇÃO DA NOVA METODOLOGIA DE APURAÇÃO DO TRIBUTO PARA A PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS APURADA EM 2001. VIOLAÇÃO DAS REGRAS DA IRRETROATIVIDADE E DA ANTERIORIDADE. MP 2.158-35/2001, ART. 74. LEI 5.720/1966, ART. 43, § 2º (LC 104/2000). 1. Ao examinar a constitucionalidade do art. 43, § 2º do CTN e do art. 74 da MP 2.158/2001, o Plenário desta Suprema Corte se dividiu em quatro resultados: 1.1. Inconstitucionalidade incondicional, já que o dia 31 de dezembro de cada ano está dissociado de qualquer ato jurídico ou econômico necessário ao pagamento de participação nos lucros; 1.2. Constitucionalidade incondicional, seja em razão do caráter antielisivo (impedir “planejamento tributário”) ou antievasivo (impedir sonegação) da normatização, ou devido à submissão obrigatória das empresas nacionais investidoras ao Método de de Equivalência Patrimonial – MEP, previsto na Lei das Sociedades por Ações (Lei 6.404/1976, art. 248); 1.3. Inconstitucionalidade condicional, afastada a aplicabilidade dos textos impugnados apenas em relação às empresas coligadas, porquanto as empresas nacionais controladoras teriam plena disponibilidade jurídica e econômica dos lucros auferidos pela empresa estrangeira controlada; 1.4. Inconstitucionalidade condicional, afastada a aplicabilidade do texto impugnado para as empresas controladas ou coligadas sediadas em países de tributação normal, com o objetivo de preservar a função antievasiva da normatização. 2. Orientada pelos pontos comuns às opiniões majoritárias, a composição do resultado reconhece: 2.1. A inaplicabilidade do art. 74 da MP 2.158-35 às empresas nacionais coligadas a pessoas jurídicas sediadas em países sem tributação favorecida, ou que não sejam “paraísos fiscais”; 2.2. A aplicabilidade do art. 74 da MP 2.158-35 às empresas nacionais controladoras de pessoas jurídicas sediadas em países de tributação favorecida, ou desprovidos de controles societários e fiscais adequados (“paraísos fiscais”, assim definidos em lei); 2.3. A inconstitucionalidade do art. 74 par. ún., da MP 2.158-35/2001, de modo que o texto impugnado não pode ser aplicado em relação aos lucros apurados até 31 de dezembro de 2001. Ação Direta de Inconstitucionalidade conhecida e julgada parcialmente procedente, para dar interpretação conforme ao art. 74 da MP 2.158-35/2001, bem como para declarar a inconstitucionalidade da clausula de retroatividade prevista no art. 74, par. ún., da MP 2.158/2001.” (STF, ADI 2.588, Tribunal Pleno, Redator para o Acórdão Min. Joaquim Barbosa, julgada em 10/04/2013, grifos meus). 

Existe, portanto, a probabilidade de provimento do agravo, bem como o risco objetivo de danos relevantes aos interesses da agravante, relacionada à cobrança do crédito ora discutido e ao reportado impedimento de efetuar suas atividades, enquanto não recolhido o imposto em questão.

Ressalto que a suspensão da exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) diz respeito exclusivamente à variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, imposta pelo art. 27 da Lei 14.754/23, não abarcando eventuais fatos geradores futuros.

Em face do exposto, DEFIRO PARCIALMENTE o efeito suspensivo (art. 1.019, inc. I, CPC/2015), para determinar a suspensão da exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) incidente sobre a variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, conforme determinado pelo art. 27 da Lei 14.754/23.”

 

Considerando que os litigantes não trouxeram quaisquer outros argumentos com aptidão para afastar o entendimento acima manifestado e por reputar que os fundamentos outrora lançados apresentam-se suficientes à solução da controvérsia neste grau recursal, adoto as mesmas razões de decidir para, neste julgamento colegiado, prover parcialmente o presente recurso. 

Por fim, de se destacar que houve oposição de embargos de declaração em face da decisão que apreciou o pedido de tutela por ambas as partes, agravante e agravado.

No julgamento que ora se faz, passo a examinar as razões deduzidas nos aclaratórios de ambas as partes. 

Nos embargos de declaração da parte agravante, sustenta-se que a decisão embargada padece de contradição, pois, na verdade, houve a concessão integral do efeito suspensivo pleiteado (suspender a aplicação do art. 27 da Lei 14.754/2023), e não parcial, como constou da decisão. Aduz, ainda, que há que ser sanada também a omissão ao deixar de mencionar explicitamente dois efeitos da decisão, quais sejam, (i) proibir a Embargada de praticar qualquer ato de cobrança do IRRF sobre a Embargante ou sobre o administrador do fundo durante a vigência da liminar; bem como (ii) afastar a proibição de distribuição ou repasses de recursos aos cotistas e a realização de novos investimentos, nos termos do §9º, artigo 27, da Lei 14.754/2023.

Contudo, não se verifica da decisão a existência de vício a ser corrigido.

Com efeito, como se vê da leitura da decisão atacada, embora tenha se reconhecido a suspensão da aplicação do art. 27 da Lei 14.754/2023 como pleiteado, houve a ressalva de que “a suspensão da exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) diz respeito exclusivamente à variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, imposta pelo art. 27 da Lei 14.754/23, não abarcando eventuais fatos geradores futuros”, daí a parcialidade.

No tocante à declaração dos efeitos da decisão, também não se verifica o vício de omissão alegado.

Como bem observado pela agravante em suas razões de embargos, os efeitos da decisão decorrem do quanto já decidido, que reconheceu o “risco objetivo de danos relevantes aos interesses da agravante, relacionada à cobrança do crédito ora discutido e ao reportado impedimento de efetuar suas atividades, enquanto não recolhido o imposto em questão”, deferindo o efeito suspensivo para “para determinar a suspensão da exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) incidente sobre a variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, conforme determinado pelo art. 27 da Lei 14.754/23”.

As razões deduzidas pela União, por sua vez, buscam, em síntese, seja sanada a omissão quanto à ausência de análise da aplicabilidade da norma geral do art. 105 do CTN, como suporte válido para autorizar a incidência tributária determinada pelo art. 27, §1º da Lei 14.754/23, dada a sua compatibilidade com o princípio constitucional da irretroatividade tributária, albergado no art. 150, III, “a”, da CF/88.

Não assiste razão à União ao aduzir a ocorrência de omissão, eis a matéria necessária ao enfrentamento da controvérsia foi devidamente abordada e o magistrado não está obrigado a rebater cada uma das alegações das partes, se expôs motivação suficiente para sustentar juridicamente sua decisão, restando evidenciado que o inconformismo veiculado pela parte embargante extrapola o âmbito da devolução admitida na via dos declaratórios, caracterizando-se o objetivo infringente que pretende emprestar ao presente recurso, ao pleitear a revisão e a reforma do julgado, rediscutindo matéria já decidida.

Ante o exposto, dou parcial provimento ao agravo de instrumento e julgo prejudicados os embargos de declaração.

É o voto.



E M E N T A

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO.  IRRF. INCIDÊNCIA SOBRE A CTA DO FUNDO EXP 1 FIDC EM 31/12/2023. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. ART. 27 DA LEI 14.754/2023. PRODUÇÃO DE EFEITOS A PARTIR DE 1/1/2024. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE RENDIMENTOS AUFERIDOS ANTES DE SUA VIGÊNCIA. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO.

- A parte recorrente impetrou mandado de segurança, objetivando suspender a exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) incidente sobre a variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, conforme determinado pelo art. 27 da Lei 14.754/23.

- A exigência antecipada de IRRF sobre os rendimentos dos Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDC) fechados – tal qual o caso em análise, em que a impetrante é única detentora das cotas do EXP 1 Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não Padronizados, CNPJ 17.024.362/0001-15 (EXP 1 FIDC) -, foi introduzida pela Lei 14.754/23.

- De acordo com a redação do art. 26 da Lei 14.754/23, os rendimentos das aplicações nos FIPs, nos ETFs e nos FIDCs que não forem classificados como entidades de investimentos ficarão sujeitos à retenção na fonte do IRRF à alíquota de 15% (quinze por cento), nas datas previstas nos incisos I e II do caput do art. 17 da referida lei.

Os incisos I e II do art. 17 da Lei 14.754/23, por sua vez, estabelecem as seguintes datas para retenção na fonte do IRRF incidente sobre os rendimentos das aplicações dos fundos de investimento: I - no último dia útil dos meses de maio e novembro; ou II - na data da distribuição de rendimentos, da amortização ou do resgate de cotas, caso ocorra antes.

- Anteriormente à referida alteração legislativa, a incidência do IRRF sobre os rendimentos auferidos pelos FIDC fechados ocorria apenas na distribuição de rendimentos, amortização, resgate ou venda de cotas, às alíquotas regressivas de 22,5% a 15%, de acordo com o prazo do investimento e a categorização da carteira do fundo como de longo ou curto prazo.

- Ocorre que, ao introduzir essa nova tributação antecipada, a Lei 14.754/23, em seu art. 27, pretendeu atingir fatos geradores ocorridos anteriormente à sua vigência.

- Portanto, o art. 27 da Lei 14.754/23 determinou a incidência do IRRF sobre os rendimentos auferidos em data anterior ao início de sua vigência, estabelecendo que a base de cálculo de tal tributação seria o valor da diferença positiva entre o valor patrimonial da cota em 31/12/23 – incluindo eventuais rendimentos apropriados pelos cotistas – e o valor do respectivo custo de aquisição.

- Nesse ponto, vislumbra-se que a nova lei não respeitou o princípio da irretroatividade da lei tributária, previsto no art. 150, III, “a”, da CF/88

- Verifica-se, pois, que a nova lei, que passou a produzir efeitos somente a partir de 1/1/2024, não poderia incidir sobre os rendimentos auferidos até 31/12/23, pois tais fatos geradores ocorreram anteriormente a sua vigência.

- Nesse mesmo sentido foi o entendimento do STF em situação substancialmente análoga, em que a MP 2.158-35 em seu art. 74 determinou a antecipação, para 31 de dezembro de cada ano, do IRPJ e da CSLL devidos sobre os lucros auferidos no exterior por pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, e o seu parágrafo único, por sua vez, determinou a tributação antecipada obrigatória de todo lucro auferido anteriormente, entre 1996 e 2001. 

- Na ocasião, o STF entendeu que tal tributação retroativa não seria possível, por violar os princípios da anterioridade e da irretroatividade da lei tributária, previstos na Constituição Federal.

- Ressalte-se que a suspensão da exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) diz respeito exclusivamente à variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, imposta pelo art. 27 da Lei 14.754/23, não abarcando eventuais fatos geradores futuros.

- Efeito suspensivo parcialmente deferido para determinar a suspensão da exigibilidade do imposto de renda retido na fonte (IRRF) incidente sobre a variação positiva da cota do fundo EXP 1 FIDC verificada em 31/12/2023, conforme determinado pelo art. 27 da Lei 14.754/23.

- Agravo de instrumento parcialmente provido. Embargos de declaração prejudicados.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao agravo de instrumento, prejudicados os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RUBENS CALIXTO
Desembargador Federal