Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5018877-42.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: MAREMONTI CAMPO BELO RESTAURANTE LTDA, MAREMONTI FARIA LIMA RESTAURANTE LTDA., MAREMONTI PINHEIROS RESTAURANTE LTDA, NABRASA STEAK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA., NB STEAK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA, NB STEAK JK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA

Advogados do(a) APELANTE: FABIO TADEU RAMOS FERNANDES - SP155881-A, RAFAELLA LOWENTHAL - SP373739-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO)
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO, UNIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5018877-42.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: MAREMONTI CAMPO BELO RESTAURANTE LTDA, MAREMONTI FARIA LIMA RESTAURANTE LTDA., MAREMONTI PINHEIROS RESTAURANTE LTDA, NABRASA STEAK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA., NB STEAK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA, NB STEAK JK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA 

Advogados do(a) APELANTE: FABIO TADEU RAMOS FERNANDES - SP155881-A, RAFAELLA LOWENTHAL - SP373739-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO)
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO, UNIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
  

RELATÓRIO

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator):

Trata-se de apelação interposta por Maremonti Campo Belo Restaurante Ltda. e outros em face de sentença que denegou a segurança em mandado de segurança por eles impetrado contra ato do Delegado da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária em São Paulo.

A decisão afastou a preliminar de ilegitimidade passiva e, no mérito, entendeu que, embora a parte impetrante desenvolva atividade enquadrada na Lei nº 14.148/2021, a fruição do benefício fiscal do artigo 4º depende do cumprimento do requisito de inscrição regular no CADASTUR em 03/05/2021, nos termos da Portaria ME nº 7.163/2021, compatível com a Lei nº 11.771/2008.

Nas razões recursais, o apelante sustenta que a Portaria ME nº 7.163/2021 inovou indevidamente ao impor requisito não previsto na Lei nº 14.148/2021, violando os princípios da legalidade e da isonomia.

Argumenta que a inscrição no CADASTUR, embora realizada após a publicação da lei, não retira o direito ao benefício fiscal. Requer, assim, a reforma da sentença para assegurar o recolhimento de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS à alíquota zero por 60 meses, bem como a restituição dos valores pagos.

Existentes contrarrazões.

Manifestação ministerial pelo prosseguimento do feito.

É o relatório.

 

 


 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5018877-42.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: MAREMONTI CAMPO BELO RESTAURANTE LTDA, MAREMONTI FARIA LIMA RESTAURANTE LTDA., MAREMONTI PINHEIROS RESTAURANTE LTDA, NABRASA STEAK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA., NB STEAK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA, NB STEAK JK COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA

Advogados do(a) APELANTE: FABIO TADEU RAMOS FERNANDES - SP155881-A, RAFAELLA LOWENTHAL - SP373739-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO)
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO, UNIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

VOTO
 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator):

Consoante relatado, a controvérsia posta nos autos diz respeito à possibilidade de fruição do benefício fiscal previsto no artigo 4º da Lei nº 14.148/2021, no âmbito do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), por empresa cuja inscrição no CADASTUR se deu após a data de 18/03/2022 fixada por atos infralegais, mas antes da data-limite de 30/05/2023 estabelecida pela Lei nº 14.859/2024.

Pois bem.

A Lei 14.148/21 criou o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), com o objetivo de “compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da Covid-19”, conforme se extrai de sua própria ementa.

Dentre os benefícios previstos na referida Lei, está a redução à alíquota zero, pelo prazo de 60 meses, do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), bem como das contribuições ao Programa de Integração Social (PIS) e Financiamento da Seguridade Social (COFINS) às pessoas jurídicas que exercem atividades elencadas em seu art. 4º.

Por seu turno, o art. 21 da Lei 11.771/08 – que dispõe sobre a Política Nacional de Turismo, possui a seguinte redação:


“Art. 21.  Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo:
I - meios de hospedagem;
II - agências de turismo;
III - transportadoras turísticas;
IV - organizadoras de eventos;
V - parques temáticos; e
VI - acampamentos turísticos.
Parágrafo único.  Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços:
I - restaurantes, cafeterias, bares e similares;
II - centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares;
III - parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer;
IV - marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva;
V - casas de espetáculos e equipamentos de animação turística;
VI - organizadores, promotores e prestadores de serviços de infra-estrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos;
VII - locadoras de veículos para turistas; e
VIII - prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.” (grifos meus) 

(...)

Art. 22.  Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação.

(...)."

 

Como se vê, o art. 21 da Lei 11.771/08 estabelece em seu “caput” as atividades econômicas que considera como “serviços turísticos”, e em seu parágrafo único as atividades que podem ser assim consideradas, mediante cadastro no Ministério do Turismo (CADASTUR).

Destaque-se que, consoante o art. 22 da referida Lei, “os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação” – do que se depreende que a inscrição dos estabelecimentos que exercem as atividades descritas no parágrafo único do art. 21 da Lei 11.771/08 é facultativa, até mesmo porque o referido dispositivo utiliza-se da expressão “poderão ser cadastradas”.

Assim, embora o cadastro dos estabelecimentos previstos no indigitado parágrafo único do art. 21 da Lei 11.771/08 no Ministério do Turismo não seja obrigatório, tal cadastro pode servir como parâmetro para se verificar quais atividades são, de fato, consideradas como turísticas. Desta feita, nada impede que a Lei estabeleça como condição para a fruição de tal benefício a inscrição nesse cadastro.

Nesse contexto é que a previsão inicial de inscrição no CADASTUR restou prevista no § 2º do art. 1º da Portaria ME 7.163/21, que assim determinou:


“§ 2º. As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.” (grifos meus)

 

Registre-se que a data de publicação da Lei 14.148/21 a que se refere o parágrafo acima era, inicialmente, 04/05/2021. Porém, como o dispositivo que previu o benefício de redução à zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS foi vetado pelo Presidente da República, a data a ser considerada, para fins do benefício, é a data da nova publicação da Lei, que se deu após a derrubada do veto presidencial pelo Congresso Nacional, isto é, 18/03/2022.  

Desta feita, ao disciplinar a aplicação desse benefício fiscal, a Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa 2.114, de 31/10/2022, prevendo em seu art. 4º, dentre outros, que tal benefício aplica-se às pessoas jurídicas de que trata o Anexo II da Portaria ME 7.163/21, desde que, em 18/03/2022, estivessem com inscrição em situação regular no CADASTUR (inciso II, alínea “b”).

Posteriormente, sobreveio a Portaria ME 11.266/22 (DOU de 02/01/2023) que atualizou a lista de CNAEs abrangidos pelo benefício fiscal do PERSE e que também previu a data de 18/03/2022 como base para que as empresas do setor de turismo possuíssem regular inscrição no CADASTUR para que pudessem usufruir de tal benesse.

Desse modo, de acordo com a referida regulamentação, o benefício do PERSE poderia ser usufruído pelas empresas somente se, em 18/03/2022, estivessem com inscrição em situação regular no CADASTUR.

E, à vista da aludida legislação, este relator possuía entendimento no sentido de que normas infralegais, a pretexto de regulamentarem determinado benefício fiscal, não poderiam estabelecer condição temporal não previstas em lei, sob pena de violar o princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, e no art. 150, I, ambos da Constituição Federal, sendo abusiva a exigência de inscrição da pessoa jurídica no CADASTUR como condição para que seja considerada empresa atuante no setor turístico e assim usufruir o benefício fiscal.

Fato, porém, que apreciando a matéria o c. Superior Tribunal de Justiça manifestou-se em sentido diverso ao aludido entendimento, assentando a legalidade da exigência de cadastro no CADASTUR, para fruição do PERSE, ao firmar a seguinte tese:

 

"1) É necessário que o prestador de serviços turísticos esteja previamente inscrito no CADASTUR, conforme previsto na Lei 11.771/2008, para que possa se beneficiar da alíquota zero relativa ao PIS/COFINS, à CSLL e ao IRPJ, instituído pelo art. 4º da Lei 14.148/2021 no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE);

2) O contribuinte optante pelo Simples Nacional não pode se beneficiar da alíquota zero relativa ao PIS/COFINS, à CSLL e ao IRPJ, instituída pelo art. 4º da Lei 14.148 /2021 no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), considerando a vedação legal inserta no art. 24, § 1º, da LC 123/2006."  (Tema Repetitivo 1283)

 

Destarte, em resumo, a Corte Superior de Justiça chancelou a legalidade da legislação que trata do PERSE, inclusive das normas infralegais que previram a necessidade de inscrição no CADASTUR para a fruição do benefício.

Registre-se, por importante, que a Lei 14.592, de 30/05/23, acrescentou o §5º ao art. 4º da Lei 14.148/21, estabelecendo a obrigatoriedade de regularidade, em 18/03/2022, da inscrição no CADASTUR às pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas que elenca. Confira-se:


5º Terão direito à fruição de que trata este artigo, condicionada à regularidade, em 18 de março de 2022, de sua situação perante o Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), nos termos dos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 (Política Nacional de Turismo), as pessoas jurídicas que exercem as seguintes atividades econômicas: serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00)."       (Incluído pela Lei nº 14.592, de 2023)” 

 

Por outro lado, com o advento da Lei 14.859, de 23/05/2024, foi dada nova redação ao referido § 5º do art. 4º da Lei 14.148/21, para permitir que as pessoas jurídicas que exerçam as atividades econômicas que elenca, terão direito à fruição do benefício do PERSE caso tenham adquirido sua regular inscrição no CADASTUR até 30/05/23 (data de publicação da Lei 14.592/23). Eis a nova redação:

 

“§ 5º. Terão direito à fruição do benefício fiscal de que trata este artigo, condicionada à regularidade, em 18 de março de 2022, ou adquirida entre essa data e 30 de maio de 2023, de sua situação perante o Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), nos termos dos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 (Política Nacional de Turismo), as pessoas jurídicas que exercem as seguintes atividades econômicas: restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00).” (destaquei)

 

Portanto, à vista da legislação de regência e do entendimento firmado pelo c. Superior Tribunal de Justiça, têm direito à fruição do benefício as pessoas jurídicas que estivessem com a situação regular no CADASTUR em 18/03/2022, ou, para aquelas empresas que exercem as atividades econômicas elencadas na nova redação do § 5º do art. 4º da Lei 14.148/21, dada pela Lei nº 14.859/2024, que regularizaram tal cadastro até 30/05/2023.

Do caso concreto

Na espécie, a atividade das impetrantes - restaurante e similares - é considerada atividade de serviços turísticos, sendo, portanto, beneficiada pela Lei nº 14.148/21, conforme previsto no inciso IV, do § 1º do seu artigo 2º, sendo certo, outrossim, que exercia suas atividades durante o período da pandemia da COVID-19.

Por outro lado verifica-se que as impetrantes tiveram suas inscrições no CADASTUR deferidas pelo Ministério do Turismo anteriormente a 30/05/2023 (v. ID 270732975), tendo, portanto, regularizado o cadastro no prazo previsto no  § 5º do art. 4º da Lei 14.148/21, na redação dada pela Lei nº 14.859/2024, motivo pelo qual fazem jus ao benefício.

No que diz respeito à repetição do indébito, a Súmula 461 do STJ, dispõe que “O contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”. Por sua vez, a Segunda Turma da Corte Superior de Justiça, no julgamento do REsp 1.596.218/SC, consignou pela possibilidade de aplicação da Súmula 461 do STJ aos casos de mandado de segurança.

Conforme entendimento firmado no âmbito desta Corte, em observância aos princípios da celeridade e economia processual, não seria razoável a exigência de ajuizar nova demanda para pleitear a restituição do indébito reconhecido na ação mandamental, desde que observado o regime de precatórios. Nesse sentido: TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5023342-31.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 23/10/2023, Intimação via sistema DATA: 23/10/2023.                                

Contudo, filio-me ao entendimento de que o mandado de segurança pode ser utilizado para a devolução de indébitos tributários recolhidos a partir da data da impetração até a implementação da medida correspondente à ordem, mediante requisição de precatório, com base no entendimento firmado pelo STF, no Tema 831 de Repercussão Geral, cabendo ao contribuinte a opção pela compensação ou pela restituição por precatório, conforme disposto na aludida Súmula 461 do STJ.

Já com relação aos indébitos anteriores à impetração, há necessidade de ação própria para sua restituição em dinheiro, diante da vedação da utilização do mandado de segurança como substitutivo da ação de cobrança, a teor do disposto nas Súmulas 269 e 271 do STF, ressalvando-se, contudo, as hipóteses nas quais a própria administração tributária dispensa precatórios para restituir valores.

Corroborando esse entendimento, o Supremo Tribunal Federal, ao converter os embargos de declaração opostos no RE 1.480.775 em agravo interno, negando-lhe provimento, reafirmou sua jurisprudência ao consignar expressamente que “A restituição por precatório no âmbito de mandado de segurança já foi expressamente admitida por esta CORTE no Tema 831 da repercussão geral, apenas quanto aos valores entre a data da impetração e a efetiva implementação da ordem concessiva.” (STF, RE 1.480.775, ED/SP, Primeira Turma, Relator Min. ALEXANDRE DE MORAES, Julgamento: 05/06/2024, Publicação: 12/06/2024).

Ainda, cabe consignar a impossibilidade de restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, por ser indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal, conforme a tese jurídica fixada no Tema 1.262 (RE 1.420.691): “Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal”.

Registra-se, ademais, que o reconhecimento, em sede de mandado de segurança, do direito à compensação de eventuais indébitos recolhidos anteriormente à impetração do writ, ainda não atingidos pela prescrição, está em conformidade com entendimento firmado pela Primeira Seção da Corte Superior de Justiça, no EREsp 1.770.495-RS.

O contribuinte poderá realizar a compensação do indébito fiscal, observada a prescrição quinquenal, conforme critérios consagrados na jurisprudência e previstos no artigo 168 do CTN, sendo vedada a compensação tributária antes do trânsito em julgado da decisão judicial, conforme prevê o art. 170-A do CTN (tema n.º 345/STJ). 

 O direito à compensação tributária somente pode ser declarado em decisão judicial com base na legislação vigente à época do ajuizamento da ação, destacando-se que eventuais modificações legislativas posteriores podem ser reconhecidas diretamente na esfera administrativa, mas não integram o objeto do processo, conforme o decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.º 1.137.738/SP, alçado como representativo de controvérsia (tema n.º 265) e decidido sob a sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC de 1973).

Dito isso, deve ser observado o disposto no art. 74 da Lei nº 9.430/1996, bem como o art. 26-A da Lei nº 11.457/2007, incluído pela Lei nº 13.670/2018, aplicando-se os critérios de juros e correção monetária estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.

A compensação pode se dar na via administrativa, mediante procedimento próprio, com comprovação e liquidação dos valores envolvidos.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta, para reformar a sentença recorrida, e conceder a segurança pleiteada, nos termos da fundamentação supra.

É o voto.



EMENTA

DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS (PERSE). BENEFÍCIO FISCAL. INSCRIÇÃO NO CADASTUR. LEI Nº 14.148/2021. REGULARIDADE FORMAL EM 18/03/2022 OU ATÉ 30/05/2023. RESTITUIÇÃO E COMPENSAÇÃO DE INDÉBITO. RECURSO PROVIDO.

- Apelação interposta por empresa do setor de alimentação contra sentença que denegou a segurança pleiteada em mandado de segurança impetrado contra ato do Delegado da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária em São Paulo, que indeferiu o direito à fruição do benefício fiscal previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/2021.

- A sentença entendeu que a parte impetrante, embora desenvolvesse atividade econômica contemplada pela norma, não havia comprovado inscrição regular no CADASTUR na data de 18/03/2022, requisito exigido por atos infralegais, especialmente pela Portaria ME nº 7.163/2021.

- A Lei nº 14.148/2021, que instituiu o PERSE, estabeleceu benefício fiscal de alíquota zero de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS pelo prazo de 60 meses às pessoas jurídicas que desenvolvam atividades econômicas específicas. A exigência de inscrição regular no CADASTUR passou a constar expressamente no § 5º do art. 4º da referida lei, introduzido pela Lei nº 14.592/2023.

- Posteriormente, a Lei nº 14.859/2024 alterou o § 5º do art. 4º da Lei nº 14.148/2021 para admitir a regularização da inscrição no CADASTUR até 30/05/2023, para fins de fruição do benefício fiscal, desde que a atividade econômica da empresa esteja listada na norma. A atividade exercida pelas impetrantes – restaurantes e similares – encontra-se contemplada na nova redação legal.

- A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema Repetitivo 1283, reconheceu a legalidade da exigência de inscrição no CADASTUR para fruição do benefício do PERSE. A legislação superveniente ampliou a possibilidade de fruição ao admitir a regularização do cadastro, para a atividade desempenhada pelas impetrantes, até 30/05/2023, o que restou comprovado nos autos.

- Em relação à restituição dos valores indevidamente recolhidos, é possível a devolução via compensação ou precatório apenas em relação aos valores pagos entre a impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da decisão concessiva, nos termos do Tema 831 da Repercussão Geral do STF e da Súmula 461 do STJ.

- Para os valores pagos anteriormente à impetração, a restituição em dinheiro somente pode ser pleiteada em ação própria, observando-se as vedações das Súmulas 269 e 271 do STF. É admitida a compensação administrativa dos valores, respeitados os requisitos legais, especialmente os arts. 74 da Lei nº 9.430/1996 e 26-A da Lei nº 11.457/2007, bem como o art. 170-A do CTN.

- Apelação provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RUBENS CALIXTO
Desembargador Federal