APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008269-88.2023.4.03.6119
RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: NICOLE BERSANI
Advogado do(a) APELANTE: CAROLINE ANHAIA SOUZA E SILVA DO NASCIMENTO - MT30501-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008269-88.2023.4.03.6119 RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA APELANTE: NICOLE BERSANI Advogado do(a) APELANTE: CAROLINE ANHAIA SOUZA E SILVA DO NASCIMENTO - MT30501-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora): Trata-se de apelação apresentada por Nicole Bersani em face da União, objetivando a anulação do auto de infração lavrado por ter extrapolado o prazo de permanência no país. Narra a parte autora que é italiana e no dia 17/08/2021 foi autuada em R$ 10.000,00 (dez mil reais) no Aeroporto Internacional de Guarulhos, devido ao decurso de prazo para sua permanência no país. Afirma não ter sido a sua intenção extrapolar a sua permanência no território nacional, ocorrido por motivo de força maior, diante do avanço do Corona Vírus (Covid 19), que ocasionou fechamentos de aeroportos e remarcações de passagens aéreas. Requer a anulação do auto de infração. Apresentada a contestação. A r. sentença julgou improcedente o pedido, nos seguintes termos (ID 292017624): Diante da constatação inequívoca do excesso de estada, bem como da inércia em buscar sua regularização tempestivamente e por não haver previsão legal que socorra a autora no caso em tela, entendo ausente a probabilidade do direito. Ademais, a autora ingressou no país durante a pandemia (em dezembro de 2020), de modo que conhecia eventual risco de cancelamento de voo por causa da própria pandemia, no que afastada a alegação de força maior, pois tinha pleno conhecimento do risco corrido e com ele anuiu. Ante o exposto, rejeito o pedido e extingo o processo com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do Código Processo Civil. Condeno a autora ao pagamento das despesas processuais, que incluem custas e honorários advocatícios, ora arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, na forma do art. 85, § 2º, do CPC. Em síntese, apela a autora argumentando que não era a sua intenção permanecer no território nacional após o prazo avençado, de modo que isso somente ocorreu em razão da pandemia causada pelo COVID 19. Outrossim, a Portaria 21-DIREX/PF de 02/02/2021 não se aplica ao caso, mas sim àqueles que buscam sua regularização migratória de competência da Polícia Federal. Sem contrarrazões, vieram os autos a essa E. Corte Regional. É o relatório. cf
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008269-88.2023.4.03.6119 RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA APELANTE: NICOLE BERSANI Advogado do(a) APELANTE: CAROLINE ANHAIA SOUZA E SILVA DO NASCIMENTO - MT30501-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora): O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido. Cinge-se a controvérsia em dirimir sobre a anulação do auto de infração aplicado em razão de a autora ter extrapolado o tempo de permanência no território nacional (visto de visita), em período de pandemia causada pelo Covid 19. Está mencionado no auto de infração n. 1348-03889-2021 que a autora é italiana e ingressou no território nacional em 31/12/2020, pelo aeroporto Internacional Governador André Franco Montoro (Aeroporto de Guarulhos), com prazo de estada até 30/03/2021. Deixou o país somente em 17/08/2021, após 140 (cento e quarenta) dias do prazo legal, razão pela qual foi lavrado referido auto de infração, com aplicação da multa administrativa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) (ID 292017612 – p. 22). A multa foi aplicada com fulcro no artigo 109, II, da Lei n. 13.445/2017, que assim prescreve: Art. 109. Constitui infração, sujeitando o infrator às seguintes sanções: (...) II - permanecer em território nacional depois de esgotado o prazo legal da documentação migratória: Sanção: multa por dia de excesso e deportação, caso não saia do País ou não regularize a situação migratória no prazo fixado; Por sua vez, o artigo 108 do mesmo dispositivo legal prescreve que o valor da multa a ser aplicada à pessoa física não ultrapassará R$ 10.000,00 (dez mil reais) , considerando-se o seguinte: Art. 108. O valor das multas tratadas neste Capítulo considerará: I - as hipóteses individualizadas nesta Lei; II - a condição econômica do infrator, a reincidência e a gravidade da infração; III - a atualização periódica conforme estabelecido em regulamento; IV - o valor mínimo individualizável de R$ 100,00 (cem reais); V - o valor mínimo de R$ 100,00 (cem reais) e o máximo de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para infrações cometidas por pessoa física; VI - o valor mínimo de R$ 1.000,00 (mil reais) e o máximo de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para infrações cometidas por pessoa jurídica, por ato infracional. Carreando os autos, denota-se que a autora adquiriu as passagens de ida e volta em 03/12/2020, sendo que seu retorno à Itália estava marcado para 11/03/2021, mas o voo foi cancelado, como também foi cancelado aquele remarcado, que aconteceria no dia 02/04/2021 (ID 292017612 – p. 7/10), de modo que retornou somente em 17/08/2021, quando foi autuada no aeroporto de Guarulhos. Não se olvidando dos acontecimentos atípicos e inesperados que assolaram todas as nações causados pela pandemia do COVID 19, a questão aqui tratada envolve a inércia da autora em não requerer junto a Polícia Federal a prorrogação do prazo de permanência, justificando seus motivos. Consoante ao artigo 20 do Decreto n. 9.199/2017, que regulamenta a Lei de Migração, o visto de visita terá prazo de estada por até 90 (noventa) dias, prorrogáveis pela Polícia Federal por mais 90 (noventa) dias, in verbis: Art. 20. O visto de visita terá prazo de estada de até noventa dias, prorrogáveis pela Polícia Federal por até noventa dias, desde que o prazo de estada máxima no País não ultrapasse cento e oitenta dias a cada ano migratório, ressalvado o disposto no § 7º do art. 29. A Polícia Federal, sensível às dificuldades encontradas por aqueles que necessitavam de seus serviços durante a pandemia, editou a Portaria n. 21-DIREX/PF, de 02/02/2021, possibilitando o estrangeiro visitante solicitar a prorrogação extraordinária da data de sua saída, ainda que extrapolasse os limites do ano migratório. Confira-se: Art. 4º Em caso de impossibilidade de saída do Brasil dentro do prazo de estada concedido em razão de restrições impostas por terceiro país, o visitante poderá solicitar, justificadamente, a prorrogação extraordinária da data de sua saída, ainda que extrapole os limites do ano migratório Entretanto, a autora nada fez. Não há notícia nos autos de que tenha diligenciado junto a Polícia Federal, mesmo por e-mail, para ter prorrogada a sua data de saída do país, o que a afastaria o pagamento da multa. Anote-se que entre o vencimento do visto (30/03/2021) e o retorno (17/08/2021) à Itália transcorreram mais de 4 (quatro) meses, tempo suficiente para regularizar sua situação no país. Desse modo, a conduta omissiva da autora justifica a lavratura do auto de infração, não configurando o Covid 19 motivo de força maior apto a afastar a inércia dela. Por fim, cito recente julgado dessa E. Corte Regional, cujo entendimento é favorável à aplicação da multa: ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. ESTRANGEIRO. INGRESSO NO BRASIL PARA TURISMO. PERMANÊNCIA NO TERRITÓRIO NACIONAL APÓS EXPIRADO PRAZO LEGAL DE ESTADA. ART. 109, II DA LEI 13.445/2017. MULTA ADMINISTRATIVA. LEGALIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. 1. No caso, cuida-se de mandado de segurança impetrado por estrangeiro, nacional de Israel, com vistas à suspensão do auto de infração nº 0183-00767-2021 expedido no âmbito do PAD nº 08505.004243/2021-81, bem como afastamento de proibição de sua permanência no Brasil e redução da multa aplicada. 2. O impetrante, nacional de Israel, ingressou no território brasileiro em 28/02/2020, com visto de turista, porém, em razão da pandemia de COVID-19 ficou impossibilitado de retornar ao seu país. Em 29/04/2021 dirigiu-se à Polícia Federal para verificação de sua situação, ocasião em que lhe foi imposta a multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais), pela situação de irregularidade prevista no art. 109, inc. II, da Lei nº 13.445/2017. 3. A imposição da multa objeto da controvérsia está prevista no art. 109, inc. II, da Lei nº 13/445 (Lei de Migração), cujo dispositivo está devidamente regulamentado pelo art. 301 do Decreto nº 9.199/2017. 4. Verifica-se, desse modo, que a autuação em exame se encontra devidamente fundamentada em ato normativo vigente, tendo sido observado o princípio constitucional da legalidade. Além disso, a fixação do valor inicial observou os parâmetros legais, em especial, tendo sido estabelecida em patamar razoável uma vez que o período de estada foi extrapolado pelo impetrante em prazo superior a 01 (um) ano, uma vez que ingressou no território brasileiro em 28/02/2020 e sua saída do país foi registrada somente em 03/05/2021, apesar de ter vencido o prazo para sua permanência aos 28/05/2020. 5. O auto de infração de que trata o presente feito goza de presunção de veracidade, legitimidade e legalidade, inexistindo qualquer prova capaz de elidir tais presunções legais, como no caso deste feito, sendo de rigor a sua manutenção. 6. No que se refere ao valor da multa, tem-se que a penalidade inicialmente estabelecida em R$ 10.000,00 (dez mil reais) foi reduzida para o montante de R$ 885,00 (oitocentos e oitenta e cinco reais), com base na Instrução Normativa nº 198-DG/PF, de 16/06/2021, o que se revela proporcional e razoável diante da permanência obrigatória do impetrante no território nacional diante da Pandemia de Covid-19, tendo sido, inclusive, devidamente recolhida pelo impetrante que, inclusive, já retornou ao seu país de origem. 7. Remessa necessária e apelação desprovidas. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5034701-75.2021.4.03.6100, Rel. Juiz Federal ROBERTO MODESTO JEUKEN, julgado em 20/05/2025, Intimação via sistema DATA: 22/05/2025) Dispositivo Ante o exposto, nego provimento à apelação da autora, nos termos da fundamentação. É o voto.
Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5008269-88.2023.4.03.6119 |
Requerente: | NICOLE BERSANI |
Requerido: | UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL e outros |
DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. INFRAÇÃO MIGRATÓRIA. PERMANÊNCIA IRREGULAR NO BRASIL POR ESTRANGEIRA DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19. FALTA DE SOLICITAÇÃO DE PRORROGAÇÃO DE PRAZO. MULTA ADMINISTRATIVA. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME:
1. Apelação cível interposta por cidadã italiana contra sentença que manteve o auto de infração n. 1348-03889-2021, lavrado pela Polícia Federal, em razão de sua permanência irregular no território nacional por 140 dias além do prazo legal de estada permitido pelo visto de visita, durante o período da pandemia de COVID-19. A penalidade imposta consistiu em multa administrativa de R$ 10.000,00, com base no art. 109, II, da Lei n. 13.445/2017.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. A questão em discussão consiste em definir se a situação de pandemia causada pela COVID-19 configura motivo de força maior apto a afastar a aplicação da multa por extrapolação do prazo de permanência da estrangeira no Brasil, mesmo sem a solicitação de prorrogação junto à Polícia Federal.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. O artigo 109, II, da Lei n. 13.445/2017 considera infração a permanência no território nacional depois de esgotado o prazo legal da documentação migratória, sob pena da aplicação da multa prevista no artigo 108 do mesmo dispositivo legal.
4. Consoante ao artigo 20 do Decreto n. 9.199/2017, o visto de visita terá prazo de estada por até 90 (noventa) dias, prorrogáveis pela Polícia Federal por mais 90 (noventa) dias.
5. A Portaria n. 21-DIREX/PF/2021, de 02/02/2021, possibilitou aos visitantes estrangeiros solicitar a prorrogação extraordinária do prazo de estada, ainda que ultrapassados os limites regulares.
6. A autora, apesar de ciente do vencimento do visto em 30/03/2021, não efetuou qualquer diligência junto à Polícia Federal para prorrogar sua data de saída do país.
7. A conduta omissiva da autora justifica a lavratura do auto de infração, não configurando o Covid 19 motivo de força maior apto a afastar a inércia dela. Precedente.
IV. DISPOSITIVO
Recurso não provido.
Dispositivos relevantes citados: artigos 108 e 109, II, da Lei n. 13.445/2017; artigo 20, do Decreto n. 9.199/2017 e artigo 4º da Portaria n. 21-DIREX/PF, de 02/02/2021
Jurisprudência relevante citada: ApelRemNec n. 5034701-75.2021.4.03.6100, Rel. Juiz Federal Roberto Modesto Jeuken, julgado em 20/05/2025.