
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5010788-76.2023.4.03.6332
RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: ASSOCIACAO EDUCACIONAL NOVE DE JULHO, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO
Advogados do(a) RECORRENTE: ANA CAROLINA GONCALVES LAMBERT - SP492151-A, CAROLINE FERNANDA GIANNASI GHEORGHIU - SP363288-A, TATTIANA CRISTINA MAIA - SP210108-A
RECORRIDO: MARIA EDUARDA DE RESENDE
Advogado do(a) RECORRIDO: DEBORA CRISTINA LOPES - SP311393-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5010788-76.2023.4.03.6332 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: ASSOCIACAO EDUCACIONAL NOVE DE JULHO, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO Advogados do(a) RECORRENTE: ANA CAROLINA GONCALVES LAMBERT - SP492151-A, CAROLINE FERNANDA GIANNASI GHEORGHIU - SP363288-A, TATTIANA CRISTINA MAIA - SP210108-A RECORRIDO: MARIA EDUARDA DE RESENDE Advogado do(a) RECORRIDO: DEBORA CRISTINA LOPES - SP311393-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5010788-76.2023.4.03.6332 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: ASSOCIACAO EDUCACIONAL NOVE DE JULHO, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO Advogados do(a) RECORRENTE: ANA CAROLINA GONCALVES LAMBERT - SP492151-A, CAROLINE FERNANDA GIANNASI GHEORGHIU - SP363288-A, TATTIANA CRISTINA MAIA - SP210108-A RECORRIDO: MARIA EDUARDA DE RESENDE Advogado do(a) RECORRIDO: DEBORA CRISTINA LOPES - SP311393-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
E M E N T A
VOTO-EMENTA
CÍVEL. FIES. ADITAMENTO CONTRATO. MATRÍCULA. DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSOS DO FNDE E DA UNINOVE. NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS.
1. Pedido para realização de aditamento referente ao semestre de 02/2022 e matrícula no semestre 01/2023, bem como pagamento de danos morais.
2. Conforme consignado na sentença:
“Vistos.
Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38, da Lei 9.099/95.
Decido.
O objeto da ação é a necessidade de regularização, pelo corréu FNDE, dos aditamentos do contrato de financiamento estudantil FIES e a determinação à corré UNINOVE que proceda à matrícula da autora, além de pedido de indenização por danos morais.
Ao longo do curso processual, com a concessão parcial, por duas vezes, de tutelas de urgência, discussão remanescente relativa ao devido cumprimento, ou não, do determinado, e apresentação de defesa pelas rés, restou claro que não foi a autora quem deu causa aos obstáculos enfrentados à continuidade de seus estudos.
O Fundo corréu, em sua contestação, sequer tratou dos entraves administrativos que a autora encontrou para realizar sua matrícula. Fato é que a autora demonstrou ter realizado regular pagamento dos valores por ela devidos e, por alguma razão nunca esclarecida nestes autos, não foi realizado o repasse à corré UNINOVE, o que impediu sua matrícula ao primeiro semestre de 2023.
Anote-se, a respeito da matrícula, que a concessão tardia de rematrícula, no mês de maio, relativa ao primeiro semestre de 2023, impediu que a autora efetivamente realizasse o curso, visto que já tinha perdido boa parte das aulas e de avaliações. Pelo que consta, a mesma situação ocorreu posteriormente, no segundo semestre.
Não é possível atribuir culpa ou responsabilidade seja à autora ou à UNINOVE. Trata-se da demora natural, frente aos obstáculos enfrentados pela autora, com necessidade de ingresso de ação judicial, a demora do Fundo corréu em regularizar os repasses e deste próprio Judiciário em prover respostas.
A responsabilidade pelo ocorrido, resta evidente, é do FNDE, que não negou em momento algum a regularidade dos pagamentos da autora, e nunca justificou, nestes autos, os entraves burocráticos enfrentados pela autora e pela UNINOVE em regularizar a situação.
Pelo contrário, mesmo regularmente representado nestes autos, após receber intimação para que prestasse os esclarecimentos devidos nesta ação, manifestou-se no sentido de que não era possível por existirem homônimos da autora. Inaceitável desídia.
Outrossim, também não é razoável que se exija da autora que arque com o pagamento das mensalidades por supostas dependências havidas em razão da matrícula tardia. A autora é a parte vulnerável na relação e os obstáculos por ela enfrentados são resultado da ação desidiosa do corréu FNDE.
A melhor solução para a lide, considerando o passar do tempo e o cumprimento das decisões interlocutórias aqui proferidas, bem como o disposto no art. 302 do CPC, é que: (i) confirmada a tutela de urgência, o corréu FNDE seja condenado a regularizar a situação contratual da autora, reconhecendo o pagamento de todas as parcelas devidas e providenciando a continuidade dos estudos da autora, nos moldes do contrato firmado, até sua graduação ou abandono do curso; (ii) confirmada a tutela de urgência, a corré UNINOVE seja condenada a realizar a matrícula da autora para que dê continuidade à sua graduação.
Com natureza de concessão de tutela de urgência em sentença, concedo novo prazo de quinze dias, a partir da prolação desta sentença, para cumprimento, pelas rés, das respectivas obrigações, com imposição de multa mensal de cinco mil reais, até o limite de cinquenta mil reais, para cada uma delas, em caso de descumprimento.
O FNDE deve ser responsabilizado pelos débitos existentes junto à corré UNINOVE em face da autora, frutos do semestre tardiamente cursado, por ser ele o responsável pelo ocorrido, conforme acima fundamentado.
Quanto aos danos extrapatrimoniais, sua caracterização depende de grave ofensa a direitos tutelados desprovidos de valor econômico imediato, atingimento da honra, do nome, da imagem do ofendido, aptos a lhe causar dor, sofrimento, vexame, humilhação.
Em se tratando de demanda consumerista, o desrespeito ao consumidor, com o descaso demonstrado pelo corréu FNDE quanto à situação da autora, obrigando-a a interromper seus estudos por dois anos, sem sequer fornecer qualquer explicação pelo ocorrido, atinge a vítima de modo a lhe causar sensação de impotência, de injustiça e de pequenez. Não só isso, como impede o início da nova profissão, a concretização de planos pessoais e profissionais.
Ademais, a conduta impõe desgaste ao consumidor, a quem cabe perder seu tempo útil, desviar sua produção, gastar seu tempo de vida (extra e judicialmente) para solucionar problema. Caracterizado, portanto, o dano.
Em termos de quantificação, o dano extrapatrimonial deve levar em consideração o grau de ofensa ao bem jurídico violado, o grau de culpa do ofensor e sua condição econômica.
No caso concreto, o grau da ofensa é elevado, por afetar o projeto de vida da autora. A condição econômica do corréu é relevante. O grau de culpa é elevado, dada a ausência de qualquer justificativa para o ocorrido.
Com fulcro, assim, nestes critérios, arbitro a indenização por danos extrapatrimoniais sofridas pela parte autora em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor por ela requerido, com correção monetária do arbitramento (enunciado 362 da súmula do STJ) e juros de mora da citação (art. 405 do CC).
Dispositivo.
Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, resolvo o mérito do processo e JULGO PROCEDENTE o pedido, para (i) confirmada a tutela de urgência, condenar o corréu FNDE a regularizar a situação contratual da autora, reconhecendo o pagamento de todas as parcelas devidas e providenciando a continuidade dos estudos da autora, nos moldes do contrato firmado, até sua graduação ou abandono do curso; (ii) confirmada a tutela de urgência, condenar a corré UNINOVE a realizar a matrícula da autora para que dê continuidade à sua graduação; (iii) condenar o corréu FNDE ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de indenização por danos extrapatrimoniais.
Correção monetária e juros de mora conforme critérios previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal da 3ª Região. Termos iniciais de incidência conforme fundamentação.
Com natureza de concessão de tutela de urgência em sentença, concedo novo prazo de quinze dias, a partir da prolação desta sentença, para cumprimento, pelas rés, das respectivas obrigações, com imposição de multa mensal de cinco mil reais, até o limite de cinquenta mil reais, para cada uma delas, em caso de descumprimento.
Sem custas e honorários nesta instância, a teor do art. 1º da Lei n. 10.259/2001, c/c art. 55, da Lei n. 9.099/1995.
Gratuidade concedida à parte autora.
Havendo recurso tempestivo, intime-se a parte recorrida para contra-arrazoar no prazo de 10 (dez) dias. Transcorrido o prazo, remetam-se os autos virtuais à colenda Turma Recursal.
Oportunamente, arquivem-se os autos.
Publique-se. Intime-se. Registrada eletronicamente.”
3. Recurso do FNDE: sustenta sua ilegitimidade passiva e a não comprovação dos danos morais. Subsidiariamente, requer seja fixado o termo inicial dos juros de mora na data do arbitramento ou da citação. Por fim, pleiteia a revogação da penalidade de multa, em razão da ausência de resistência da Autarquia Federal no cumprimento da ordem judicial.
4. Recurso da UNINOVE: afirma que a regularização do contrato de financiamento da recorrida, o reconhecimento de pagamento das parcelas devidas e a matrícula em 2023/01 foram realizados, sendo que o contrato de financiamento foi encerrado partir de 2023/02. Afirma que a sentença proferida também extrapola os limites dos pedidos contidos na inicial ao determinar que “o corréu FNDE regularize a situação contratual da autora, reconhecendo o pagamento de todas as parcelas devidas e providenciando a continuidade dos estudos da autora, nos moldes do contrato firmado, até sua graduação ou abandono do curso;” e que “a corré UNINOVE realize a matrícula da autora para que dê continuidade à sua graduação;” Sustenta que o juiz não pode condicionar que o contrato de financiamento seja válido até a graduação ou abandono, sendo que existem outros requisitos para manter o financiamento ativo que não são pauta desta lide, como por exemplo o número de semestres contratados e o prazo para utilização do financiamento, que no caso da recorrida já se encerrou. Consequentemente, a Instituição de Ensino não pode ser obrigada a realizar a matrícula da recorrida para que dê continuidade ao curso sem a devida contraprestação, uma vez o financiamento estudantil não mais arcará com os valores das mensalidades em vista do seu encerramento. Incontroverso, portanto, que a sentença foi omissa em relação a perda superveniente do objeto, devendo extinguir o feito, sem resolução do mérito, no tocante a obrigação de fazer do FNDE e da Instituição recorrente, mantendo a procedência somente para a condenação do FNDE ao pagamento dos danos morais em vista da sua comprovada falha. Todavia, caso esta corte não entenda pela perda superveniente do objeto, a sentença deve apenas confirmar as liminares anteriormente deferidas e já cumpridas ante a efetivação da matrícula em 2023/01, reconhecimento das parcelas devidas e regularização do contrato de financiamento para 2022/01, 2022/02 e 2023/01, não cabendo qualquer condenação a obrigação de fazer, sob pena de caracterização de decisão ultra petita e violação do artigo 492 do Código de Processo Civil.
5. Afasto a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo FNDE. Com efeito, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, na qualidade de agente operador e de administrador dos ativos e passivos do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior - FIES, nos termos do art. 3º, inc. II, da Lei nº 10.260/01, tem atuação fundamental no deslinde da presente causa, em face de sua função na autorização do financiamento estudantil; daí resultando a sua legitimidade passiva ad causam.
6. Por sua vez, a multa diária fixada pelo juiz a quo, de acordo com o artigo 537 do Código de Processo Civil, afigura-se plenamente possível no intuito de assegurar o cumprimento da decisão judicial. O Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento de que é cabível a cominação de multa diária (astreintes) em face da Fazenda Pública, como meio de vencer a obstinação quanto ao cumprimento da obrigação de fazer (fungível ou infungível) ou entregar coisa, incidindo a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância (REsp nº 987.280). Assim sendo, a alegação de multa diária prematura e excessiva não merece acolhida. Deveras, ao ser imputada a astreinte ao Ente Público, a valoração deve levar em consideração o princípio da razoabilidade, ponderando-se o valor da própria obrigação, de modo que não seja mais vantajoso para a Fazenda o descumprimento da obrigação e pagamento da multa, mas também não seja esta estipulada em patamar capaz de causar grave dano ao Erário. In casu, tendo em conta a relevância do bem jurídico em discussão e os elementos consignados na sentença, entendo que o valor da multa e o prazo concedido para o cumprimento da decisão judicial são adequados, não se verificando nenhuma ilegalidade.
7. No mais, a despeito das alegações recursais, reputo que a sentença analisou corretamente todas as questões trazidas nos recursos inominados, de forma fundamentada, não tendo os recorrentes apresentado, em sede recursal, elementos que justifiquem sua modificação. Outrossim, considerando que a presente demanda foi ajuizada em 2023, entendo que as providências determinadas na sentença atendem à pretensão formulada na inicial. Conforme consignado, pelo juízo de origem, em sede de embargos de declaração: “A sentença observou o contexto da ação, das tutelas concedidas e o cumprimento, sendo certo que o pedido inicial deve ser interpretado de boa-fé, e que é princípio do processo a cooperação e a efetividade da decisão de mérito (art. 6º do CPC).”
8. Posto isso, não obstante a relevância das razões apresentadas pelos recorrentes, o fato é que todas as questões suscitadas pelas partes foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Origem razão pela qual a r. sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. RECURSOS DO FNDE E DA UNINOVE A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
9. Recorrentes condenados ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação.