APELAÇÃO (198) Nº 5004305-65.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: PAULO ROGERIO DE LIMA
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO LUIS FARIAS NAZARIO - SP361365
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO (198) Nº 5004305-65.2018.4.03.6183 RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO APELANTE: PAULO ROGERIO DE LIMA Advogado do(a) APELANTE: THIAGO LUIS FARIAS NAZARIO - SP3613650A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL R E L A T Ó R I O A Exma. Sra. Juíza Federal Convocada Sylvia de Castro (Relatora): Trata-se de apelação de sentença pela qual foi julgado parcialmente procedente pedido formulado em ação previdenciária, para declarar a especialidade do labor desempenhado pelo autor nos períodos de 01.05.1999 a 15.10.2009 e 01.01.2011 a 25.07.2013, restando improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria especial, bem como revogada a tutela antecipada anteriormente deferida em sede de agravo de instrumento. Face à sucumbência recíproca, foi determinada a distribuição proporcional entre as partes das despesas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% do valor da causa. Não houve condenação em custas. Em suas razões recursais, requer a parte autora seja reconhecida a insalubridade do intervalo de 11.12.1997 a 31.11.1998, argumentando que a sentença “se baseou no sentido de um entendimento que ainda está em discussão, qual seja, a possibilidade de retroagir o decreto lei 4882/03 para considerar atividade especial o segurado que labora em níveis de Ruído acima de 85 db, pois deve-se valer que as medições podem conter erros de medição, pelos fatores externos, e, ainda, devemos avaliar todo o histórico do segurado”. Pugna pela concessão de aposentadoria especial ou, sucessivamente, aposentadoria por tempo de contribuição. O demandante ingressou com o pedido de concessão de efeito suspensivo à apelação nº 5002354-58.2018.4.03.0000, o qual restou acolhido por este Tribunal, com fundamento no art. 1.012, § 4º, do CPC 2015, para o fim de fosse mantido o pagamento da aposentadoria especial, deferido em sede de antecipação dos efeitos da tutela revogada na sentença. Sem contrarrazões das partes, os autos vieram a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5004305-65.2018.4.03.6183 RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO APELANTE: PAULO ROGERIO DE LIMA Advogado do(a) APELANTE: THIAGO LUIS FARIAS NAZARIO - SP3613650A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL V O T O Recebo a apelação da parte autora, na forma do artigo 1.011 do CPC de 2015. Inicialmente, cumpre consignar que a sentença prolatada nestes autos não se submete ao reexame necessário, tendo em vista que a Lei nº 10.352/2001, que entrou em vigor em 27.03.2002, alterou a redação do artigo 475 do Código de Processo Civil, determinando, em seu §2º, que não se aplica o duplo grau de jurisdição quando a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, sendo que, no caso em tela, a expressão econômica do direito controvertido não ultrapassa tal limite. Sendo assim, resta controversa apenas a possibilidade de reconhecimento como especial daquele período pleiteado na inicial e assim não admitido na sentença, qual seja, 11.12.1997 a 31.11.1998, a fim de que seja concedido ao autor o benefício de aposentadoria especial ou, sucessivamente, aposentadoria por tempo de contribuição. De início, cumpre distinguir a aposentadoria especial prevista no art. 57, caput, da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de serviço, prevista no art. 52 da Lei nº 8.213/91; a aposentadoria especial pressupõe o exercício de atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, e, cumprido esse requisito o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da E.C. nº 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, assim como não se submete ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de serviço há tanto o exercício de atividade especial como o exercício de atividade comum, sendo que o período de atividade especial sofre a conversão em atividade comum aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da E.C. nº 20/98. No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida. Em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto 2.172/1997 somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482. Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS. Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014). Dessa forma, é de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis. O Perfil Profissiográfico Previdenciário, instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico. No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF estabeleceu que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração de eficácia do EPI feita pelo empregador no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) não descaracteriza o tempo de serviço especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos. No caso em tela, verifica-se da análise do PPP apresentado (doc. ID Num. 3303080 - Pág. 10/11) que de 05.08.1986 a 30.11.1998 o demandante laborou exposto a ruído superior a 86,1 decibéis. No entanto, durante referido interregno, ele laborou na Rede Ferroviária Federal S/A - Superintendência Regional SP (atual MRS Logistica S/A), no cargo de manobrador, categoria profissional análoga à maquinista em transporte ferroviário, prevista no código 2.4.3 do Decreto n. 53.831/1964 e no código 2.4.1 do Decreto n. 83.080/1979, enquadramento permitido até 10.12.1997. No período de 01.12.1998 a 25.07.2013 (data do requerimento administrativo), o autor esteve exposto a ruído superior a 90 decibéis, agente nocivo previsto no código 1.1.6 do Decreto 53.831/64, 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 e 1.1.5, Anexo I, do Decreto 83.080/79. Computado o período de atividade especial ora reconhecido (05.08.1986 a 10.12.1997), somado aos incontroversos, totaliza o autor 26 anos e 01 dia de tempo de serviço exercido exclusivamente sob condições especiais até 25.07.2013, data do requerimento administrativo, fazendo jus, portanto, à aposentadoria especial com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (25.07.2013), consoante firme entendimento jurisprudencial nesse sentido. A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência. Fixo os honorários advocatícios em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, em conformidade com o entendimento desta 10ª Turma, tendo em vista que o pedido foi julgado parcialmente procedente pelo Juízo a quo. As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), devendo reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único). Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para julgar parcialmente procedente o pedido, a fim de considerar como atividade especial o período de 05.08.1986 a 10.12.1997, totalizando 26 anos e 01 dia de atividade exclusivamente desempenhada sob condições especiais até 25.07.2013, data do requerimento administrativo. Em consequência, condeno o réu a lhe conceder o benefício de aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, a partir da data de 25.07.2013. Verbas acessórias conforme legislação de regência. Honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença. As prestações vencidas serão resolvidas em sede de liquidação, compensando-se os valores recebidos por força da antecipação dos efeitos da tutela, a qual torno definitiva. Expeça-se e-mail ao INSS, dando-lhe ciência da procedência do pedido que concedeu ao autor o benefício de aposentadoria especial, com DIB em 25.07.2013. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. LABOR INSALUBRE. RUÍDO. MANOBRADOR. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto n. 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95.
II - Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014). Dessa forma, é de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
III – Verifica-se da análise do PPP apresentado que de 05.08.1986 a 30.11.1998 o demandante laborou exposto a ruído superior a 86,1 decibéis. No entanto, durante referido interregno, ele laborou na Rede Ferroviária Federal S/A - Superintendência Regional, no cargo de manobrador, categoria profissional análoga à maquinista em transporte ferroviário, prevista no código 2.4.3 do Decreto n. 53.831/1964 e no código 2.4.1 do Decreto n. 83.080/1979, enquadramento permitido até 10.12.1997.
IV - No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF expressamente se manifestou no sentido de que caberá ao Judiciário verificar, no caso concreto, se a utilização do EPI descaracterizou (neutralizou) a nocividade da exposição ao alegado agente nocivo (químico, biológico, etc.), ressaltando, inclusive, que havendo divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a decisão deveria ser pelo reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria especial, caso dos autos.
V - Considerando que o autor totaliza mais de 25 anos de tempo de serviço exclusivamente desempenhado sob condições insalubres, faz jus à aposentadoria especial, com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
VI - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, ante o firme entendimento jurisprudencial nesse sentido.
VII – Honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, em conformidade com o entendimento desta 10ª Turma, tendo em vista que o pedido foi julgado parcialmente procedente pelo Juízo a quo.
VIII - Apelação do autor parcialmente provida.