APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5021655-24.2018.4.03.6100
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CECÍLIA MARCONDES
APELANTE: COQUI DISTRIBUICAO DE PRODUTOS EDUCATIVOS LTDA
Advogados do(a) APELANTE: RICARDO AZEVEDO SETTE - SP138486-S, MARISTELA FERREIRA DE SOUZA MIGLIOLI - SP111964-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5021655-24.2018.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CECÍLIA MARCONDES APELANTE: COQUI DISTRIBUICAO DE PRODUTOS EDUCATIVOS LTDA Advogados do(a) APELANTE: RICARDO AZEVEDO SETTE - SP138486-S, MARISTELA FERREIRA DE SOUZA MIGLIOLI - SP111964-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por COQUI DISTRIBUIÇÃO E DE PRODUTOS EDUCATIVOS LTDA. em face de sentença que julgou liminarmente improcedente o pedido, nos termos do art. 332, II, do CPC, em mandado de segurança, cujo objeto consiste na obtenção de provimento jurisdicional que assegure à impetrante o direito à imunidade tributária, prevista no art. 150, VI, “d”, da CF, sobre importação de livros, álbuns e cards da série Magic the Gathering, consubstanciados na Invoice n.º 029351 e HAWB n.º 12562525. Em suas razões recursais, a apelante alegou que a sentença se equivocou ao considerar que o pedido contraria o precedente firmado pelo STF no julgamento do RE n.º 330.817. Destacou que referido precedente analisou a questão acerca da aplicação da imunidade tributária sobre e-books, o que nada se relaciona com o presente caso, no qual os produtos, objeto da demanda, consistem em livros em suporte físico, álbuns e cards da série Magic the Gathering. Aduziu que, em relação aos produtos efetivamente por ela importados, o STF já se posicionou favoravelmente à extensão da imunidade tributária estabelecida no art. 150, VI, “d”, da CF, no mesmo sentido que vem decidindo este Tribunal. Pugnou pelo integral provimento da apelação, a fim de que seja adotado o entendimento da STF quanto à possibilidade de aplicação da norma que assegura a imunidade tributária sobre as mercadorias por ela importadas. A União Federal apresentou contrarrazões. O Ministério Público Federal se manifestou pelo provimento da apelação. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5021655-24.2018.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CECÍLIA MARCONDES APELANTE: COQUI DISTRIBUICAO DE PRODUTOS EDUCATIVOS LTDA Advogados do(a) APELANTE: RICARDO AZEVEDO SETTE - SP138486-S, MARISTELA FERREIRA DE SOUZA MIGLIOLI - SP111964-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O No caso dos autos, a impetrante ajuizou o presente mandado de segurança para obter provimento jurisdicional que reconheça o direito à imunidade tributária, prevista no art. 150, VI, “d”, da CF, sobre importação dos produtos listados na Invoice n.º 029351 e HAWB n.º 12562525, os quais, segundo alega, consistem em livros, álbuns e cards da série “Magic the Gathering”. Sem que fosse determinada a notificação da autoridade impetrada para apresentar informações sobre a demanda, o MM. Juízo de primeiro grau julgou liminarmente improcedente o pedido com fundamento no art. 332, II, do CPC que preconiza: Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar: (...) II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; Constou na sentença que o pedido da impetrante contraria o precedente firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 330.817/RJ, processado sob o rito da repercussão geral. Por oportuno, transcrevo a ementa do julgado: Recurso extraordinário. Repercussão geral. Tributário. Imunidade objetiva constante do art. 150, VI, d, da CF/88. Teleologia multifacetada. Aplicabilidade. Livro eletrônico ou digital. Suportes. Interpretação evolutiva. Avanços tecnológicos, sociais e culturais. Projeção. Aparelhos leitores de livros eletrônicos (ou e-readers). 1. A teleologia da imunidade contida no art. 150, VI, d, da Constituição, aponta para a proteção de valores, princípios e ideias de elevada importância, tais como a liberdade de expressão, voltada à democratização e à difusão da cultura; a formação cultural do povo indene de manipulações; a neutralidade, de modo a não fazer distinção entre grupos economicamente fortes e fracos, entre grupos políticos etc; a liberdade de informar e de ser informado; o barateamento do custo de produção dos livros, jornais e periódicos, de modo a facilitar e estimular a divulgação de ideias, conhecimentos e informações etc. Ao se invocar a interpretação finalística, se o livro não constituir veículo de ideias, de transmissão de pensamentos, ainda que formalmente possa ser considerado como tal, será descabida a aplicação da imunidade. 2. A imunidade dos livros, jornais e periódicos e do papel destinado a sua impressão não deve ser interpretada em seus extremos, sob pena de se subtrair da salvaguarda toda a racionalidade que inspira seu alcance prático, ou de transformar a imunidade em subjetiva, na medida em que acabaria por desonerar de todo a pessoa do contribuinte, numa imunidade a que a Constituição atribui desenganada feição objetiva. A delimitação negativa da competência tributária apenas abrange os impostos incidentes sobre materialidades próprias das operações com livros, jornais, periódicos e com o papel destinado a sua impressão. 3. A interpretação das imunidades tributárias deve se projetar no futuro e levar em conta os novos fenômenos sociais, culturais e tecnológicos. Com isso, evita-se o esvaziamento das normas imunizantes por mero lapso temporal, além de se propiciar a constante atualização do alcance de seus preceitos. 4. O art. 150, VI, d, da Constituição não se refere apenas ao método gutenberguiano de produção de livros, jornais e periódicos. O vocábulo “papel” não é, do mesmo modo, essencial ao conceito desses bens finais. O suporte das publicações é apenas o continente (corpus mechanicum) que abrange o conteúdo (corpus misticum) das obras. O corpo mecânico não é o essencial ou o condicionante para o gozo da imunidade, pois a variedade de tipos de suporte (tangível ou intangível) que um livro pode ter aponta para a direção de que ele só pode ser considerado como elemento acidental no conceito de livro. A imunidade de que trata o art. 150, VI, d, da Constituição, portanto, alcança o livro digital (e-book). 5. É dispensável para o enquadramento do livro na imunidade em questão que seu destinatário (consumidor) tenha necessariamente que passar sua visão pelo texto e decifrar os signos da escrita. Quero dizer que a imunidade alcança o denominado “audio book”, ou audiolivro (livros gravados em áudio, seja no suporte CD-Rom, seja em qualquer outro). 6. A teleologia da regra de imunidade igualmente alcança os aparelhos leitores de livros eletrônicos (ou e-readers) confeccionados exclusivamente para esse fim, ainda que, eventualmente, estejam equipados com funcionalidades acessórias ou rudimentares que auxiliam a leitura digital, tais como dicionário de sinônimos, marcadores, escolha do tipo e do tamanho da fonte etc. Esse entendimento não é aplicável aos aparelhos multifuncionais, como tablets, smartphone e laptops, os quais vão muito além de meros equipamentos utilizados para a leitura de livros digitais. 7. O CD-Rom é apenas um corpo mecânico ou suporte. Aquilo que está nele fixado (seu conteúdo textual) é o livro. Tanto o suporte (o CD-Rom) quanto o livro (conteúdo) estão abarcados pela imunidade da alínea d do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal. 8. Recurso extraordinário a que se nega provimento. TESE DA REPERCUSSÃO GERAL: 9. Em relação ao tema nº 593 da Gestão por Temas da Repercussão Geral do portal do STF na internet, foi aprovada a seguinte tese: “A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo.” (RE 330817, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 08/03/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-195 DIVULG 30-08-2017 PUBLIC 31-08-2017). Entendo que o pedido veiculado neste mandado de segurança, em tese, não contraria o precedente firmado pelo C. STF no julgamento do RE 330.817, indicado na sentença apelada. Naquele julgado, a Suprema Corte adotou interpretação teleológica da norma contida no art. 150, VI, “d”, da CF a fim de que a imunidade tributária alcance também os e-books. A seu turno, na presente demanda, a impetrante alega que estão sendo cobrados tributos sobre a importação dos componentes integrantes da série “Magic the Gathering” (livros em suporte físico, álbuns e cards), razão pela qual pleiteia que tais mercadorias sejam abarcadas pela imunidade em questão. O pedido formulado pela impetrante não pode ser sumariamente entendido como incompatível com o acórdão do E. STF que reconheceu a imunidade tributária sobre os livros eletrônicos. De outro modo, a tese veiculada pela impetrante se encontra em harmonia com a exegese adotada naquele julgado no sentido de conferir interpretação teleológica e extensiva da imunidade prevista no art. 150, VI, “d”, da CF. Nesse sentido, verifico que a Suprema Corte, em recentíssimos julgados, vem reconhecendo a imunidade tributária sobre os produtos da série Magic the Gathering. Confira-se, nesse sentido, o seguinte precedente: Vistos etc. Contra o acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, maneja recurso extraordinário, com base no art. 102, III, da Lei Maior, Mario Peixoto de Oliveira Netto Comércio de Livros — ME. Aparelhado o recurso na alegação de afronta aos arts. 5º, caput, e 150, VI, “d”, da Constituição Federal. A matéria debatida, em síntese, diz com a extensão da imunidade prevista no art. 150, VI, “d”, da Constituição da República aos álbuns de figurinhas e os respectivos cromos e “cards”. Trata-se, na origem, de ação declaratória de inexistência de relação jurídica ajuizada pelo ora recorrente visando afastar a incidência de “tributos relacionados à importação de ‘Cards’ denominados Magic The Gathering, equiparando-o a complemento de livro, NCM 4901.99.00 da Tabela Externa Comum - TEC ou Tabela do Imposto sobre Produtos industrializados TIPI, bem como o direito à aplicação de alíquota zero para o recolhimento de PIS/COFINS decorrente deste tipo de mercadoria”. A Corte de origem concedeu a segurança em acórdão assim ementado: "TRIBUTÁRIO - PIS - COFINS - ALÍQUOTA ZERO - CARD GAMES: INAPLICABILIDADE - INTERPRETAÇÃO ESTRITA DO BENEFÍCIO FISCAL. 1- A interpretação do beneficio fiscal é estrita (artigo 111, do Código Tributário Nacional). 2 - No caso concreto, os "cards games" são destacáveis do álbum. 3 - Ou seja: são cartas colecionáveis que podem ser destacadas do álbum, com a finalidade de uso em jogo. 4 - Não possuem a natureza de livro, nos termos do artigo 2º, parágrafo único, I, da Lei Federal nº. 10.753/03. 5 - Apelação provida.” Admitido na origem, subiram os autos. É o relatório. Decido. Preenchidos os pressupostos extrínsecos. Da detida análise dos fundamentos do recurso extraordinário, bem como à luz da jurisprudência firmada no âmbito desta Suprema Corte, concluo assistir razão ao recorrente. O entendimento adotado no acórdão recorrido diverge da jurisprudência firmada no âmbito deste Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a imunidade prevista no art. 150, IV, “d”, da Lei Maior alcança os álbuns de figurinhas e os respectivos cromos e “cards”, ainda que possam ser destacados ou vendidos separadamente. Nesse sentido: (...) Acresço que, ao julgamento do RE 595.676, Rel. Min. Marco Aurélio, e do RE 330.817, Rel. Min. Dias Toffoli, processados segundo a sistemática da repercussão geral, esta Suprema Corte concedeu interpretação extensiva ao dispositivo constitucional que autoriza a imunidade e fixou as teses de que “A imunidade da alínea d do inciso VI do artigo 150 da Constituição Federal alcança componentes eletrônicos destinados, exclusivamente, a integrar unidade didática com fascículos” e que “A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/1988 aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo.” Os acórdãos estão assim ementados: (...)Ante o exposto, forte no art. 21, § 1º, do RISTF, dou provimento ao recurso extraordinário para reformar o acórdão recorrido e restabelecer a sentença das fls. 54-9. Publique-se. Brasília, 03 de abril de 2019. Ministra Rosa Weber Relatora (RE 1193910, Relator(a): Min. ROSA WEBER, julgado em 03/04/2019, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG 08/04/2019 PUBLIC 09/04/2019) Dessa forma, a sentença se equivocou ao julgar liminarmente improcedente o pedido, com fundamento no art. 332, II, do CPC, pois, repise-se, em tese, a demanda veiculada neste Mandado de Segurança não contraria o procedente do C. STF firmado no julgamento do RE 330.817. Dessa forma, torna-se de rigor a cassação da sentença. Anulada a sentença, entendo que não se encontram nos autos todos os elementos necessários para o imediato julgamento da causa. Com efeito, os únicos documentos juntados pela impetrante que são realmente pertinentes à operação de importação, objeto dessa demanda, consistem no conhecimento de carga (ID 33676858) e no invoice (ID 33676859). De tais documentos, não é possível se extrair com suficiente grau de certeza quais motivos que levaram a autoridade impetrada a interromper o despacho das mercadorias, assim como os eventuais tributos que estariam sendo cobrados na operação de importação, bem como sua respectiva fundamentação legal. Assim sendo, embora entenda prematura a concessão de qualquer ordem judicial, no atual estágio processual, que permita o prosseguimento do desembaraço aduaneiro das mercadorias relacionadas no mencionado invoice e no conhecimento de carga, independentemente do recolhimento de impostos, é cediço que essa questão poderá ser melhor esclarecida após a vinda das informações por parte da autoridade impetrada. Afigura-se necessário o retorno dos autos ao juízo de primeira instância, a fim de que seja promovido o regular prosseguimento da demanda, de modo a ser aperfeiçoado o contraditório com a notificação da autoridade impetrada para prestar informações sobre o pedido, especialmente sobre a operação de importação objeto desta ação (Invoice n.º 029351 e HAWB n.º 12562525). Nesse sentido, foi a solução conferida pelo C. STJ, em caso análogo: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE "ASSÉDIO SEXUAL" SOFRIDO NO INTERIOR DE COMPOSIÇÃO DO METRÔ. ALEGADA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA TRANSPORTADORA. INTERESSE DE AGIR E LEGITIMIDADE AD CAUSAM. EXISTÊNCIA. TEORIA DA ASSERÇÃO. 1. A manifesta ilegitimidade ad causam e a falta de interesse processual do autor caracterizam vícios da petição inicial que, uma vez detectados pelo magistrado antes da citação do réu, devem ensejar o indeferimento da exordial e, consequentemente, a extinção do processo sem resolução do mérito (artigos 267, incisos I e VI, 295, incisos II e III, do CPC de 1973; 330 e 485 do CPC de 2015). 2. No âmbito do STJ, prevalece a chamada teoria da asserção ou da prospettazione (em contraposição à teoria da apresentação ou da exposição). Sob essa ótica, o exame da legitimidade ad causam e do interesse processual deve ser realizado in statu assertionis, ou seja, à luz das afirmações do autor constantes na petição inicial, sem qualquer inferência sobre a veracidade das alegações ou a probabilidade de êxito da pretensão deduzida. 3. No caso concreto, verifica-se que a autora postulou indenização por danos materiais e morais em face da concessionária de transporte metroviário, sob a alegação de que fora vítima de ato libidinoso, praticado por outro usuário, no interior de vagão. 4. Como causa de pedir, a demandante apontou a responsabilidade objetiva da transportadora, que teria negligenciado seu dever de segurança, ao não adotar todas as medidas preventivas para garantir a incolumidade física e psíquica de todos os usuários do serviço público. Aduziu, desse modo, defeito do serviço, por falta de segurança no interior da composição metroviária. Alegou que, além de não ter sido transportada ao seu destino, foi alvo de uma violência sexual que deveria ter sido evitada pela fornecedora, máxime por não se tratar de evento imprevisível ou inevitável. 5. Ao contrário do consignado pelo acórdão estadual (que manteve o indeferimento da inicial, adentrando o juízo de mérito da demanda, por considerar rompido o nexo de causalidade por ato de terceiro), as assertivas feitas pela autora - sem qualquer juízo sobre a probabilidade de sucesso de sua pretensão - preenchem, satisfatoriamente, os requisitos da legitimidade ad causam e do interesse de agir. 6. Com efeito, a legitimidade ad causam extrai-se do fato de a demandante - usuária do serviço público supostamente vítima de ato libidinoso no interior de vagão - ter pleiteado indenização por danos morais e materiais em face da fornecedora, imputando-lhe ato omissivo, qual seja a negligência em adotar todas as medidas possíveis para garantir sua incolumidade física e psíquica. A pertinência subjetiva é, portanto, evidente. 7. Por outro lado, o interesse processual também se revela em razão da notória resistência da transportadora em assumir a responsabilidade por atos praticados por usuários em situações similares, no interior de composição metroviária, o que demonstra a necessidade da tutela jurisdicional e a aptidão do pedido indenizatório de colocar a autora em situação mais favorável, ao menos do ponto de vista financeiro. 8. Ademais, observando-se as normas do CPC de 2015, em especial o artigo 332, verifica-se que a hipótese dos autos não pode sequer ser enquadrada na figura da "improcedência liminar do pedido", pois a pretensão deduzida pela autora não contraria súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, nem acórdão proferido em recurso extraordinário ou especial repetitivo, tampouco entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência. 9. Recurso especial provido para, cassando a sentença e o acórdão, determinar o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau, a fim de que seja dado prosseguimento à demanda, como for de direito. Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau, a fim de que se promova o regular prosseguimento da demanda. É o voto.
(RESP - RECURSO ESPECIAL - 1678681 2017.00.99743-0, LUIS FELIPE SALOMÃO, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:06/02/2018).
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO. ART. 332, II, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE. PEDIDO QUE NÃO AFRONTA ACÓRDÃO DO STF PROFERIDO NO JULGAMENTO DO RE 330.817/RJ. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. PROSSEGUIMENTO DO FEITO.
1. A impetrante ajuizou o presente mandado de segurança para obter provimento jurisdicional que reconheça o direito à imunidade tributária, prevista no art. 150, VI, “d”, da CF, sobre importação dos produtos listados na Invoice n.º 029351 e HAWB n.º 12562525, os quais, segundo alega, consistem em livros, álbuns e cards da série “Magic the Gathering”.
2. Sem que fosse determinada a notificação da autoridade impetrada para apresentar informações sobre a demanda, o MM. Juízo de primeiro grau julgou liminarmente improcedente o pedido com fundamento no art. 332, II, do CPC. Constou na sentença que o pedido do autor contraria o precedente firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 330.817/RJ, processado sob o rito da repercussão geral.
3. O pedido veiculado neste mandado de segurança, em tese, não contraria o precedente firmado pelo C. STF no julgamento do RE 330.817, indicado na sentença apelada. Naquele julgado, a Suprema Corte adotou interpretação teleológica da norma contida no art. 150, VI, “d”, da CF a fim de que a imunidade tributária também alcance os e-books. A seu turno, na presente demanda, a impetrante almeja que os componentes integrantes da série “Magic the Gathering” (livros em suporte físico, álbuns e cards), também sejam abarcados pela imunidade em questão.
4. O pedido formulado pela impetrante não pode ser sumariamente entendido como incompatível com o acórdão do E. STF que reconheceu a imunidade tributária sobre os livros eletrônicos. De outro modo, a tese veiculada pela impetrante se encontra em harmonia com a exegese adotada naquele julgado no sentido de conferir interpretação teleológica e extensiva da imunidade prevista no art. 150, VI, “d”, da CF. Nesse sentido, verifico que a Suprema Corte, em recentíssimos julgados, vem reconhecendo a imunidade tributária sobre os produtos da série Magic the Gathering.
5. A sentença se equivocou ao julgar liminarmente improcedente o pedido, com fundamento no art. 332, II, do CPC, pois, em tese, a demanda veiculada neste Mandado de Segurança não contraria o procedente do C. STF firmado no julgamento do RE 330.817. Dessa forma, torna-se de rigor a cassação da sentença.
6. Anulada a sentença, entendo que não se encontram nos autos todos os elementos necessários para o imediato julgamento da causa. Afigura-se necessário o retorno dos autos ao juízo de primeira instância, a fim de se promover o regular prosseguimento da demanda, de modo a ser aperfeiçoado o contraditório com a notificação da autoridade impetrada para prestar informações sobre o pedido, especialmente sobre a operação de importação objeto desta ação (Invoice n.º 029351 e HAWB n.º 12562525).
7. Apelação parcialmente provida. Sentença anulada.