AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5000015-92.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
AGRAVANTE: GUILLERMO MARTINEZ CALDERON
Advogado do(a) AGRAVANTE: LUIZ GUSTAVO DOTTA SIMON - SP283396-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5000015-92.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA AGRAVANTE: GUILLERMO MARTINEZ CALDERON Advogado do(a) AGRAVANTE: LUIZ GUSTAVO DOTTA SIMON - SP283396 AGRAVADO: UNIAO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O agravante interpôs o presente agravo de instrumento, com pedido de liminar, em face de decisão proferida pelo R. Juízo da 1ª Vara Federal de São João da Boa Vista que, em sede de ação de rito ordinário, indeferiu a tutela antecipada objetivando autorização para permanência do Requerente no país, até o trânsito em julgado da demanda. Pretende o agravante a reforma da r. decisão agravada, alegando, em síntese, que o seu visto de turista expirou em 01/12/2017, momento em que deveria ter pedido a prorrogação, porém, por motivos alheios à sua vontade, não conseguiu se deslocar até a unidade da Polícia Federal em Campinas/SP, para realizar tais pedidos, tornando sua estadia irregular; que após ingressar neste país, contraiu núpcias com a Sra. Mônica Filomena Doná; que, em decorrência do decurso de prazo para regularizar a prorrogação do visto de permanência neste país, foi aplicada a multa no importe de R$ 10.000,00; que, ao vencer o visto de turista, não tinha condições financeiras de se deslocar até a cidade de Campinas/SP para a proceder ao pedido de prorrogação, deixando transcorrer o referido prazo; que, ainda que tivesse descumprido a norma de imigração, tal fato não afasta a necessidade de sua permanência no Brasil, junto à sua família. Requer seja concedida a tutela de urgência pleiteada, enquanto tramitar o presente recurso, evitando, assim, a deportação do Agravante, seja considerado realizado o pré-questionado o direito federal e constitucional incidente, para fins de recursos às superiores instâncias, em especial dos artigos 110, 31, 37, 65 e 66, todos da Lei 13.445/17. O pedido de tutela antecipada foi deferido. Processado o agravo, não foi apresentada contraminuta. Após, vieram os autos conclusos. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5000015-92.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA AGRAVANTE: GUILLERMO MARTINEZ CALDERON Advogado do(a) AGRAVANTE: LUIZ GUSTAVO DOTTA SIMON - SP283396 AGRAVADO: UNIAO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Assiste razão ao agravante. A decisão liminar proferida nos autos deste recurso consta com os seguintes dizeres, in verbis: A Sexta Turma desta Corte tem entendimento no sentido da legalidade da multa imposta por permanência irregular de estrangeiro em território nacional, verbis: AÇÃO ANULATÓRIA - MULTA IMPOSTA A ESTRANGEIROS POR PERMANÊNCIA IRREGULAR - POSTERIOR REQUERIMENTO DE PERMANÊNCIA DEFINITIVA EM DECORRÊNCIA DE PROLE BRASILEIRA - LEGALIDADE DA COBRANÇA – APELAÇÃO DA UNIÃO PROVIDA. 1. Não conheço do agravo retido, por perda de objeto. Nas razões de agravo a União insurge-se contra a decisão de antecipação de tutela, que determinou o livre trânsito dos estrangeiros e reingresso, enquanto perdurasse a ação (fls. 67/70). Ocorre que às fls. 133/134, o Departamento da Polícia Federal informou que, após procedimento administrativo, foi deferido, pelo Ministério da Justiça, a permanência definitiva dos estrangeiros, com base em prole brasileira. Desta forma, não há mais restrições quanto ao ingresso, permanência e eventual reingresso dos estrangeiros em território nacional. 2. No mérito, permanece a discussão a respeito da legalidade da multa aplicada, em decorrência de permanência irregular de estrangeiros, em período anterior ao deferimento da permanência definitiva dos autores, pelo Ministério da Justiça. 3. No caso concreto, o casal ingressou em território nacional, juntamente com seus três filhos menores, todos bolivianos, como turistas, e passaram a trabalhar informalmente. 4. Após o nascimento de mais uma filha, esta em território brasileiro, procuraram a Polícia Federal para regularizarem sua situação migratória, ocasião em que foram surpreendidos com a autuação e imposição de multa, no valor de R$ 827,75, em razão da situação irregular no país, nos termos do artigo 125, inciso II, da Lei Federal nº 6.915/80. 5. As multas possuem previsão legal e foram aplicadas em decorrência da situação de permanência irregular dos estrangeiros, portanto, a despeito da mudança da situação jurídica, com o nascimento de filha brasileira, permanecem legítimas. Precedente desta Turma. 6. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 20, § 3.º, do CPC/73, observada a gratuidade da justiça. 7. Agravo retido prejudicado. Apelação provida.Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar prejudicado o agravo retido e dar provimento à apelação da União, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. (APELAÇÃO CÍVEL n. 0013004-98.2012.4.03.6100, JUIZ CONVOCADO LEONEL FERREIRA, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/10/2018) Outro precedente no mesmo sentido: AG n. 0012762-67.2016.4.03.0000, Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, TRF3 - SEXTA TURMA, j. 16/2/2017, DJ 6/3/2017 Ocorre que, no caso em exame, alega o agravante que após o vencimento do seu visto de turista, não teve condições financeiras para se deslocar até a cidade de Campinas/SP, para solicitar a prorrogação do prazo. Afirma que atualmente não tem recursos para o pagamento da multa imposta no auto de infração n. 0229-00058-2018, decorrente de ter ultrapassado o prazo de sua estada legal no país, no importe de R$ 10.000,00, ora questionada. Sustenta, ainda, que precisa regularizar a sua situação migratória, para poder permanecer no país, com a sua esposa. A condição de hipossuficiência é comprovada pelo fato de o agravante ser assistido juridicamente por advogado nomeado conforme cadastro da assistência judiciária gratuita da Justiça Federal - AJG/CJF (ID Num. 12794650 - Pág. 2 dos autos originários), só podendo usufruir dessa assistência jurídica quem “se encontra em situação econômica que não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”, conforme previsto no art. 2º, parágrafo único, da Resolução CJF n. 305, de 07/10/2014. Assim, diante da comprovada hipossuficiência do agravante, a multa imposta no valor de R$ 10.000,00 é muito elevada, desproporcional a uma pessoa de baixa renda que afirma estar desempregada. Nesse sentido, o seguinte precedente desta Corte: DIREITO PROCESSUAL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ESTATUTO DO ESTRANGEIRO. MULTA. PERMANÊNCIA NO TERRITÓRIO NACIONAL APÓS ESGOTADO O PRAZO LEGAL DE ESTADA. DIREITO DE CIDADANIA. SOPESAMENTO DE DIREITOS HUMANOS. PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE. HIPOSSUFICIÊNCIA. FILHO MENOR BRASILEIRO. PERMANÊNCIA REGULAR NO MOMENTO DA LAVRATURA DO AUTO DE INFRAÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA. 1. A questão posta nos autos diz respeito à anulação do Auto de Infração e Notificação nº 7622/2013 lavrado contra nacional da República do Paraguai, para imposição de multa no valor de R$ 827,75, com fundamento no artigo 125, II, da Lei 6.815/1980, em razão de ter o autor permanecido no território nacional após esgotado o prazo legal de estada. 2. O autor ingressou em território brasileiro no ano de 2006, constituindo família. Em 12.12.2013, compareceu à Superintendência da Polícia federal para requerer a permanência definitiva em território nacional com base em prole brasileira, momento em que teve lavrado contra si o referido auto de infração, por infringência ao artigo 125, II, da Lei nº 6.815/1980. O pedido de permanência definitiva foi deferido e publicado no Diário Oficial da União em 24.09.2014. 3. O Decreto 6.975/2009, que promulga o Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercado Comum do Sul - Mercosul, Bolívia e Chile -, embora preveja hipótese de isenção de multas e outras sanções administrativas mais gravosas aos imigrantes dos países signatários (artigo 3º), dispõe expressamente que "a residência temporária poderá ser transformada em permanente, mediante a apresentação do peticionante, perante a autoridade migratória do país de recepção, 90 (noventa) dias antes do vencimento da mesma" (artigo 5º), prevendo, no entanto, que, vencida a residência temporária de até dois anos, os imigrantes que "não se apresentarem à autoridade migratória do país de recepção, ficam submetidos à legislação migratória interna de cada Estado Parte" (artigo 6º). 4. Porém, inicialmente deve ser discutida a proporcionalidade da multa aplicada diante da condição de hipossuficiência do autor, fazendo-se necessárias algumas considerações doutrinárias e jurisprudenciais. 5. A máxima da proporcionalidade encontra-se implicitamente consagrada na atual Constituição Federal e costuma ser deduzida do sistema de direitos fundamentais e do Estado Democrático de Direito, bem como da cláusula do devido processo legal substantivo. Ainda, está expressamente posta no artigo 2º da Lei nº 9.784/1999, que regula o processo administrativo federal e preceitua que a Administração Pública obedecerá, dentre outros, ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade. 6. A doutrina, por sua vez, opta muitas vezes por destrinchar o princípio da proporcionalidade em três subprincípios, viabilizando melhor exercício da ponderação de direitos fundamentais. Assim, surgem os vetores da adequação, que traduz a compatibilidade entre meios e fins; a necessidade enquanto exigência de utilizar-se o meio menos gravoso possível; e a proporcionalidade em sentido estrito que consiste no sopesamento entre o ônus imposto e o benefício trazido pelo ato administrativo. 7. Não se coaduna com essa postura a adoção de um formalismo jurídico simplista em detrimento da dignidade humana daqueles que o país se pretende a ajudar. Há muito no ordenamento jurídico brasileiro já é reconhecida a normatividade das normas constitucionais que não podem servir de letra morta frente a qualquer dispositivo de lei infraconstitucional. 8. Importa-se mencionar, portanto, que, na hipótese em comento, a teleologia da regra que rege a matéria em questão busca tutelar o controle e a ordem da situação dos estrangeiros em território nacional, de modo que não se pode considerar como intimidadora ou nociva a situação do autor que, além de demonstrar boa-fé na busca por sua regularização, obteve a concessão de permanência definitiva em território nacional com base em prole brasileira. 9. Nesse sentido, fica evidente que o prejuízo suportado pelo demandante, que tem seu direito de permanência fortemente ameaçado ante sua falta de condições financeiras para arcar com a multa imputada, é infinitamente maior do que a perda estatal em promover uma regularização fora do prazo prescrito em lei. 10. Por fim, destaca-se que a multa aplicada no valor de R$ 827,75 é maior do que o salário mínimo vigente à época de sua imputação, revelando-se totalmente desproporcional para uma pessoa com baixa renda, assistida da Defensoria Pública da União, sendo impossível quitá-la sem o sacrifício de 11. Ainda que seu sustento pessoal e de sua família assim não fosse, há uma particularidade no caso de fundamental importância para o deslinde da causa, qual seja, o autor aqui constituiu família e teve filho brasileiro, o que lhe garantiu a condição de estrangeiro regular no território nacional, nos termos do artigo 75, da Lei 6.815/1980. Tal especificidade, aliás, constou expressamente do respectivo auto de infração: "permanência definitiva por filho" (fl. 20). 12. Desta forma, no momento da lavratura do auto de infração (16.12.2013), a permanência do autor no país já estava assegurada pela existência do filho brasileiro, sob sua guarda e dependência econômica, eis que menor de idade. Assim, deve ser anulado o auto de infração lavrado. 13. Apelação provida. (Ap n. 0012815-52.2014.4.03.6100, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/04/2018, grifos meus) Cumpre ressaltar ainda que a Portaria n. 218 do Ministério da Justiça, de 27 de fevereiro de 2018, permite a isenção ao pagamento de multas que inviabilizem a regularização migratória, na hipótese de comprovação da condição de hipossuficiência econômica, verbis: “Art. 1º Esta Portaria regulamenta o procedimento de avaliação da condição de hipossuficiência econômica para fins de isenção de taxas para obtenção de documentos de regularização migratória e de pagamento de multas. Art. 2º São isentas as taxas previstas no art. 131 do Decreto nº 9.199, de 2017 e no art. 2º, V, da Lei Complementar nº 89, de 18 de fevereiro de 1997, aos indivíduos em condição de hipossuficiência econômica. Parágrafo único. A isenção mencionada no caput aplica-se ao pagamento de multas quando inviabilizarem a regularização migratória. Art. 3º A condição de hipossuficiência econômica será declarada pelo solicitante, ou por seu representante legal, de acordo com o que estabelece o art. 1º da Lei nº 7.115, de 29 de agosto de 1983, e conforme modelos previstos nos Anexos I e II. (...)” (grifos meus) Ante o exposto, DEFIRO a antecipação da tutela (CPC/2015, art. 1019, I), para garantir a permanência do agravante no país, durante o trâmite da demanda de origem e enquanto permanecer a condição de hipossuficiência. Em face de todo o exposto, mantendo as razões da decisão supra transcrita, dou provimento ao agravo de instrumento.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ESTATUTO DO ESTRANGEIRO. AUTORIZAÇÃO PARA PERMANÊNCIA NO PAÍS. PRAZO LEGAL DE ESTADA ESGOTADO. HIPOSSUFICIÊNCIA. ESPOSA BRASILEIRA.
1 - A Sexta Turma desta Corte tem entendimento no sentido da legalidade da multa imposta por permanência irregular de estrangeiro em território nacional.
2 - No caso em exame, alega o agravante que após o vencimento do seu visto de turista, não teve condições financeiras para se deslocar até a cidade de Campinas/SP, para solicitar a prorrogação do prazo.
3 - Afirma que atualmente não tem recursos para o pagamento da multa imposta no auto de infração n. 0229-00058-2018, decorrente de ter ultrapassado o prazo de sua estada legal no país, no importe de R$ 10.000,00, ora questionada.
4 - A condição de hipossuficiência é comprovada pelo fato de o agravante ser assistido juridicamente por advogado nomeado conforme cadastro da assistência judiciária gratuita da Justiça Federal - AJG/CJF (ID Num. 12794650 - Pág. 2 dos autos originários), só podendo usufruir dessa assistência jurídica quem “se encontra em situação econômica que não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”, conforme previsto no art. 2º, parágrafo único, da Resolução CJF n. 305, de 07/10/2014.
5 - Diante da comprovada hipossuficiência do agravante, a multa imposta no valor de R$ 10.000,00 é muito elevada, desproporcional a uma pessoa de baixa renda que afirma estar desempregada.
6 - A Portaria n. 218 do Ministério da Justiça, de 27 de fevereiro de 2018, permite a isenção ao pagamento de multas que inviabilizem a regularização migratória, na hipótese de comprovação da condição de hipossuficiência econômica.
7 - Agravo de Instrumento PROVIDO.