APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5373691-73.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: SABRINA DOS SANTOS DA SILVA, STEFANI CAROLAINE SANTOS GONCALVES
REPRESENTANTE: LUIZ CARLOS GONCALVES
SUCEDIDO: MARIA APARECIDA DOS SANTOS DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA DE ALMEIDA SALVADOR - SP274992-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5373691-73.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: SABRINA DOS SANTOS DA SILVA, STEFANI CAROLAINE SANTOS GONCALVES Advogado do(a) APELANTE: JULIANA DE ALMEIDA SALVADOR - SP274992-N, APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por MARIA APARECIDA DOS SANTOS DA SILVA e SABRINA DOS SANTOS DA SILVA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o benefício de pensão por morte, na condição de cônjuge e filha, respectivamente, de Valdir Alves da Silva, falecido em 15 de outubro de 2006. A r. sentença recorrida julgou improcedente o pedido (id 41374317 – p. 1/6). Em suas razões recursais, pugnam as autoras pela reforma da sentença, com o decreto de procedência do pleito, ao argumento de que restaram preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício. Aduzem que, ao tempo do falecimento, Valdir Alves da Silva estava a exercer o labor campesino, sem formal registro em CTPS, o que teria sido demonstrado pela prova documental corroborada depoimentos das testemunhas, colhidos em juízo. Sustentam, ademais, que a dependência econômica da esposa e da filha menor é presumida por expressa disposição legal (id 41374319 – p. 1/11). Sem contrarrazões. Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão. É o relatório.
REPRESENTANTE: LUIZ CARLOS GONCALVES
SUCEDIDO: MARIA APARECIDA DOS SANTOS DA SILVA
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5373691-73.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: SABRINA DOS SANTOS DA SILVA, STEFANI CAROLAINE SANTOS GONCALVES Advogado do(a) APELANTE: JULIANA DE ALMEIDA SALVADOR - SP274992-N, APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REPRESENTANTE: LUIZ CARLOS GONCALVES
SUCEDIDO: MARIA APARECIDA DOS SANTOS DA SILVA
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais, cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º."
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de 1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado, em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente atendido pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão previdenciariamente cobertos." (Curso de Direito Previdenciário. Tomo II - Previdência Social. São Paulo: LTr, 1998, p. 594).
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 (doze) meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo oral, ou pela percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição, acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
DO CASO DOS AUTOS
O óbito de Valdir Alves da Silva, ocorrido em 15 de outubro de 2006, está comprovado pela respectiva Certidão (id 41374266 – p. 1).
Depreende-se dos extratos do CNIS que o último contrato de trabalho havia sido estabelecido pelo de cujus junto a M.F. Comércio e Prestação de Serviços Rurais Ltda., entre 26 de setembro de 2003 e 30 de novembro de 2003 (id 41374267 – p. 1).
Entre a data da cessação do último vínculo empregatício e o óbito transcorreu interregno superior a 2 (dois) anos e 10 (dez) meses, o que, ante a ausência de prorrogação do período de graça (art. 15, §§1º e 2º da Lei nº 8.213/91), implicaria, em princípio, na perda da qualidade de segurado.
Não obstante, sustentam as postulantes que, por ocasião do falecimento, Valdir Alves da Silva estava a laborar como rurícola, sem formal registro em CTPS, carreando aos autos início de prova material, consubstanciado nos documentos que destaco:
-Ficha de Atendimento Hospitalar, emitida pela Santa Casa de Misericórdia de Chavantes – SP, em 03 de outubro de 2006, na qual constou sua profissão de “trabalhador rural” (id 41374268 – p. 2);
-Certidão de Óbito, na qual restou assentado que, por ocasião do falecimento, o de cujus ainda ostentava a profissão de lavrador (id 41374266 – p. 1).
Em audiência realizada em 01 de outubro de 2018, foram colhidos em mídia audiovisual, os depoimentos de duas testemunhas.
Os depoentes Luiz Carlos Gonçalves e Cleuza Maria Teodoro Alves asseveraram que, por ocasião do falecimento, Valdir Alves da Silva ainda exercia o labor campesino, na condição de “boia-fria”, sem formal registro em CTPS, inclusive detalhando os nomes dos empregadores.
Desta forma, tenho por comprovada a condição de trabalhador rural de Valdir Alves da Silva, ao tempo do falecimento.
Não obstante, as duas testemunhas supracitadas foram unânimes em afirmar que a autora Maria Aparecida dos Santos da Silva não mais convivia maritalmente com o de cujus. Com efeito, o depoente Luiz Carlos Gonçalves admitiu que ao tempo do óbito ela já era sua companheira, pois já moravam juntos e, inclusive, tiveram uma filha (Stefani), nascida em 2005.
A testemunha Cleuza Maria Teodoro Alves também confirmou que, ao tempo em que faleceu, Valdir Alves da Silva já se encontrava separado da autora Maria Aparecida dos Santos da Silva.
Dentro deste quadro, conquanto a autora Maria Aparecida dos Santos da Silva tenha instruído a exordial com a respectiva Certidão de Casamento (id 41374264 – p.1), tenho por afastada sua dependência econômica em relação ao de cujus, ante a separação de fato comprovada pela prova testemunhal.
Com efeito, a esposa separada de fato é considerada dependente na hipótese de recebimento de pensão alimentícia ou caso comprove o restabelecimento do vínculo marital, o que não restou demonstrado na espécie sub examine.
Acerca do tema, trago à colação os seguintes julgados proferidos por esta Egrégia Corte:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CASAL SEPARADO. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE VIDA EM COMUM. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO DEMONSTRADA.
I - Não se concebe a concessão do benefício de pensão por morte à ex-mulher, que esteja separada de fato há mais de 2 anos, por mais duradouro que tenha sido o vínculo do matrimônio.
II - O cônjuge separado judicialmente ou de fato somente se habilitará à pensão por morte se comprovar a vida em comum com o de cujus ou o recebimento da pensão alimentícia.
III - Apelo do INSS provido.
IV - Sentença reformada.
V - Prejudicado o recurso da autora".
(TRF3, 9ª Turma, Des. Fed. Marianina Galante, j. 15/12/2003, DJU 03/03/2004, p. 263).
"PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO POR MORTE - DEPENDÊNCIA ECONÔMICA - AUSÊNCIA DE REQUISITO ESSENCIAL. RECURSO PROVIDO - SENTENÇA REFORMADA.
1. A fruição da pensão por morte tem como pressupostos a implementação de todos os requisitos previstos na legislação previdenciária para a concessão do benefício.
2. Sendo juris tantum a presunção de dependência econômica do art. 16 § 4°. da Lei 8213/91 imprescindível sua comprovação em juízo, pela cônjuge separada de fato.
3. Não provada nos autos a dependência econômica da esposa, separada de fato em relação ao de cujus, não procede o pedido.
4. Sucumbente isenta do pagamento das custas e despesas processuais por ser beneficiária da justiça gratuita.
5. No que concerne aos honorários advocatícios, os mesmos devem ser fixados em 10% sobre o valor da causa, ficando suspensa sua execução, a teor do que preceitua o art. 12 da Lei n.º 1.060/50.
6. Recurso do INSS provido.
7. Prejudicado o recurso da parte autora."
(TRF3, 7ª Turma, Des. Fed. Leide Polo, j. 17/11/2003, DJU 30/01/2004, p. 380).
Tendo em vista o falecimento da autora Maria Aparecida dos Santos Silva, ocorrido no curso da demanda, conforme demonstrado pela respectiva Certidão de Óbito (id 41374288 – p. 1), não há parcelas a serem percebidas pelos sucessores habilitados (id 41374303 – p. 1).
Passo à apreciação da dependência econômica da autora Sabrina dos Santos da Silva. A Certidão de Nascimento faz prova de que, nascida em 31/07/1989, ao tempo do falecimento do genitor (15/10/2006), contava 17 (dezessete) anos de idade, sendo sua dependência econômica presumida, conforme preconizado pelo artigo 16, §4º da Lei de Benefícios.
Em tese, portanto, faria jus ao recebimento das parcelas vencidas entre a data do falecimento do genitor (15/10/2006) e aquela em que atingiu o limite etário de 21 anos (31/07/2010).
Contudo, referidas parcelas foram atingidas pela prescrição quinquenal, uma vez que, ao pleitear administrativamente a pensão por morte, em 24/10/2016 (41374269 – p. 1), esta já contava com 27 anos de idade.
Ademais, a postulante já houvera adquirido plena capacidade postulatória ao completar 18 anos de idade, em 31/07/2007, pois já vigia o Código Civil instituído pela Lei nº 10.406/2002, o qual reduziu a maioridade civil para 18 anos de idade, a partir de quando se tornou dispensável a assistência do representante legal. No entanto, postergou o pedido administrativo para 24/10/2016, e o ajuizamento da presente demanda para 16/01/2017.
Não havendo nos autos menção a eventual invalidez ou qualquer outro fator determinante de prorrogação, há que ser observada a superveniência do limite idade (21 anos) antes mesmo da propositura desta ação, motivo pelo qual não remanescia sequer a condição de dependência, requisito essencial à concessão do direito pleiteado.
Nesse contexto, se torna inviável o acolhimento do pedido, sendo de rigor a manutenção do decreto de improcedência do pleito.
Em razão da sucumbência recursal, majoro em 100 % os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, ficando suspensa sua execução, em razão de ser beneficiário da Justiça Gratuita, enquanto persistir sua condição de miserabilidade.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e, em razão da sucumbência recursal, majoro em 100% os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO, EM 2006, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 8.213/91. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHAS. ESPOSA SEPARADA DE FATO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA AFASTADA. AJUIZAMENTO TARDIO DA DEMANDA. PRESCRIÇÃO DE TODAS AS PARCELAS PLEITEADAS PELA FILHA. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- O óbito de Valdir Alves da Silva, ocorrido em 15 de outubro de 2006, está comprovado pela respectiva Certidão.
- Há nos autos início de prova material do trabalho exercido pelo de cujus como agricultor, o qual restou corroborado pelos depoimentos de duas testemunhas inquiridas em juízo, sob o crivo do contraditório. Os depoentes asseveraram terem vivenciado o labor campesino, por terem sido colegas de trabalho do de cujus, inclusive, detalhando os nomes dos empregadores.
- A dependência econômica é presumida em relação ao cônjuge, conforme preconizado pelo artigo 16, I da Lei de Benefícios. No caso dos autos, no entanto, as testemunhas foram unânimes em afirmar que, ao tempo do falecimento, Valdir Alves da Silva e a autora Maria Aparecida dos Santos da Silva não mais conviviam maritalmente. Precedentes desta Egrégia Corte.
- Tendo em vista o falecimento da autora Maria Aparecida dos Santos Silva, ocorrido no curso da demanda, conforme demonstrado pela respectiva Certidão de Óbito, não há parcelas a serem percebidas pelos sucessores habilitados.
- A autora Sabrina dos Santos da Silva, ao tempo do óbito do genitor, contava com 17 anos, todavia, ao pleitear administrativamente o benefício, em 24/10/2016, sua idade era de 27 anos, ou seja, todas as parcelas vencidas entre a data do óbito (15/10/2006) e aquela em que atingiu o limite etário de 21 anos (31/07/2010) foram alcançadas pela prescrição quinquenal.
- Não havendo nos autos menção a eventual invalidez ou qualquer outro fator determinante de prorrogação, há que ser observada a superveniência do limite idade (21 anos) antes mesmo da propositura desta ação, motivo pelo qual não remanescia sequer a condição de dependência, requisito essencial à concessão do direito pleiteado.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal, nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
- Apelação da parte autora a qual se nega provimento.