APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005377-28.2013.4.03.6126
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: EURIDICE ALEXANDRE EVANGELISTA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA APARECIDA GONCALVIS STIVAL ICHIURA - SP282658-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005377-28.2013.4.03.6126 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: EURIDICE ALEXANDRE EVANGELISTA Advogado do(a) APELANTE: MARIA APARECIDA GONCALVIS STIVAL ICHIURA - SP282658-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação em ação de rito comum ajuizada pelo INSS em face de Euridice Alexandre Evangelista, objetivando a anulação de sentença que homologou acordo entre as partes junto ao Juizado Especial Federal da Subseção Judiciária de Santo André. Valor da causa R$ 1.000,00 Após a contestação, em 10.02.13, às fls. 199/201, id 81679844, foi deferida a liminar pretendida, determinando a suspensão do pagamento do beneficio de aposentadoria por invalidez a ré (NB 541767373-71). A r. sentença julgou procedente o pedido e condenou a parte autora em honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a gratuidade da justiça. Apela a autora e alega cerceamento de defesa, pois com a apresentação da proposta de acordo a apelante foi impedida de manifestar-se sobre o laudo no feito cuja homologação do acordo se pretende anular. Requer seja reconhecida a prescrição e aduz não estarem presentes as causas de anulabilidade da sentença. Com contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal. Inicialmente distribuído o feito ao Des. Fed. Marcelo Saraiva, Sua Excelência entendeu ser a competência para apreciação do feito de uma das Turmas da 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, pelo que encaminhou os autos à UFOR para proceder à redistribuição do recurso. Vieram os autos conclusos. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005377-28.2013.4.03.6126 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: EURIDICE ALEXANDRE EVANGELISTA Advogado do(a) APELANTE: MARIA APARECIDA GONCALVIS STIVAL ICHIURA - SP282658-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O ADMISSIBILIDADE Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria objeto de devolução. DO CABIMENTO DA AÇÃO ANULATÓRIA Dispõe o Art. 966 e seu §4º, do CPC que: “Art.966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (...) § 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.” Sobre o tema, confira-se doutrina e jurisprudência, respectivamente: “(...) 19. Âmbito da ação anulatória – parágrafo quarto. Não há mais a dúvida quanto a qual seria o instituto adequado para impugnar os atos de disposição de direitos – reconhecimento jurídico do pedido, renúncia à pretensão, transação – homologados em juízo serão anuláveis, e não rescindíveis. Também sujeitos à ação anulatória (art. 966, §4º.) são atos homologatórios praticados durante a execução e a sentença que homologa partilha amigável (art. 655).” (Primeiro Comentários ao Novo Código de Processo Civil artigo por artigo/ coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier. 2ª ed. São Paulo: Revista os Tribunais, 2016, p. 1537) “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. PRETENSÃO DE RESCINDIR ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. MEIO INADEQUADO. NECESSIDADE DE AÇÃO ANULATÓRIA. PRECEDENTES. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta eg. Corte entende que a ação anulatória é o meio adequado para desconstituir/rescindir acordo homologado judicialmente. Precedentes. 2. Inadequação da interposição de ação de rescisão contratual cumulada com pedido indenizatório para demanda que pretende rescindir acordo homologado judicialmente em outra ação. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt no REsp 1714591/SP, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 24/04/2018, DJe 30/04/2018) COMPETÊNCIA A competência para anular homologação de acordo é do juízo que o homologou. Todavia, nos termos do art. 6º da Lei 10259/01, o INSS não pode figurar como parte autora no Juizado Federal, pelo que deduz de forma acertada a presente pretensão perante Vara Federal de Santo André. PRESCRIÇÃO/DECADÊNCIA Dispõe o artigo 178 do Código Civil: “Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: I - no caso de coação, do dia em que ela cessar; II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico; III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade. Com efeito, é de quatro anos o prazo para o pedido de anulação de negócio jurídico. Considerando a data do ajuizamento da ação em 06.11.13 e que a sentença homologatória foi proferida em 31.05.10, não há que se falar em decadência/prescrição. DO DIREITO DA ADMINISTRAÇÃO REVER SEUS ATOS É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados, com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal: "A administração pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos". "A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial". Também é pacífico o entendimento de que a mera suspeita de irregularidade, sem o regular procedimento administrativo, não implica na suspensão ou cancelamento unilateral do benefício, por ser um ato perfeito e acabado. Aliás, é o que preceitua o artigo 5º, LV, da Constituição Federal, ao consagrar como direito e garantia fundamental, o princípio do contraditório e da ampla defesa, in verbis: "Aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". Ainda, o art. 115, II da lei 8213/91 impõe à autarquia a cobrança dos valores pagos indevidamente. DO CASO DOS AUTOS Narra o INSS que a ré ajuizou ação objetivando o restabelecimento de auxílio-doença e concessão de aposentadoria por invalidez. Diante da concessão administrativa antecedente de auxílio-doença e do resultado da perícia, fora proposto acordo pelo INSS para a concessão de aposentadoria por invalidez com DIB em 09.10.09 (citação) e pagamento de atrasados. Aceita a proposta, foi proferida decisão homologatória do acordo, nos seguintes termos: “(...)Defiro a gratuidade de Justiça. Conforme petição acostada aos autos, o Procurador Federal, representante do INSS, ofereceu acordo para implantação em favor da parte autora do benefício de APOSENTADORIA POR INVALIDEZ em até 45 dias a contar da data desta Sentença e pagamento de atrasados, com expressa renúncia a eventuais direitos decorrentes do mesmo fato ou fundamento jurídico que deu origem à ação judicial, bem como o compromisso de não pleitear nenhum tipo de indenização a título de danos morais. Na hipótese, ainda, de a parte Autora já receber ou vier a receber benefício incompatível com este, o INSS se reserva desde já o direito de cessar o de menor valor." Dada a devida ciência à parte autora, foi aceito o acordo, conforme petição acostada aos autos.HOMOLOGO o acordo realizado. Posto isso, julgo extinto o processo com resolução de mérito, com fundamento no artigo 269, III, do Código de Processo Civil, homologando a transação realizada entre as partes, que consistirá no restabelecimento de auxílio -doença, NB 519.030.296-9 e posterior conversão em APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, desde a citação (09.10.2009), com renda mensal atual de R$ 1.280,85 (UM MIL DUZENTOS E OITENTA REAIS E OITENTA E CINCO CENTAVOS), para abril de 2010. As prestações atrasadas, no valor de R$ 18.000,00 (DEZOITO MIL REAIS), para maio/2010, serão pagas por meio de RPV. Expeça-se ofício à agência do INSS para cumprimento do acordo. Expeça-se RPV. As partes renunciam ao prazo para recurso. Publique-se, registre-se e intimem-se.” (trânsito em julgado em 11.06.10, fl. 56) DA NULIDADE DO ACORDO Após a conclusão do laudo elaborado nos autos do processo 0006052-39.2009.4.03.6317, o INSS propôs acordo para concessão de aposentadoria por invalidez com DIB em 09.10.09, data da citação. Ocorre que posteriormente à homologação do acordo judicial constatou o INSS irregularidade na concessão administrativa do benefício de auxílio-doença NB 31/519.030.296-9 cuja conversão em aposentadoria por invalidez a autora pugnava na demanda em que houve o acordo. Especificamente foi constatada que incorreta a data fixada do início da incapacidade em 2006, quando o correto seria 02.07.04, data do AVC e que consta do laudo pericial produzido na ação 2009.63.17.006052-1, id 81679844, fl. 32. Conforme extrato do CNIS a autora (id 81679844), a autora, possuía vínculo empregatício de 22.03.72 a 25.01.87, 06.07.87 a 14.02.88, 16.05.88 a 24.12.88 e 04.02.93 a 23.09.93 e verteu contribuições ao sistema, na qualidade de contribuinte individual de 09/2005 a 06/2006 e 11/2006 e percebeu auxílio-doença de 01.12.06 a 31.05.08. Deveras, verifica-se que a ré apresentou incapacidade total e permanente para o trabalho a partir de 02/07/2004, sendo que a DII coincide com a data do acidente vascular cerebral e possuía vínculo empregatício até 1993, reingressando no sistema, na qualidade de contribuinte individual, 12 anos depois, em 09/2005, após o acidente vascular cerebral. Como se vê, não possuía a autora qualidade de segurado quando da data do início da incapacidade em 02.07.04, firmada pelo perito no laudo pericial produzido na ação em que se deu a homologação do acordo, pelo que de rigor a nulidade da sentença que homologou acordo alicerçado em erro, dado que a Administração ao propor o acordo embasou-se em DII equivocada. O art. 2º, c, da Lei 4717/65 prevê a nulidade dos atos lesivos ao patrimônio público no caso de ilegalidade do objeto, que no caso é representada pelo erro na data do início da incapacidade que repercute na qualidade de segurado e na concessão administrativa equivocada de auxílio-doença que precedeu a aposentadoria por invalidez. Em razão do exposto, não merece prosperar o apelo da autora, sendo de rigor a manutenção da sentença com a imposição de desconstituição da transação homologada com desarquivamento e prosseguimento do feito, abrindo-se vista às partes para manifestação sobre o laudo e posterior julgamento de mérito do feito 00006052-39.2009.4.03.6317 que tramitava perante o Juizado Especial Federal de Santo André. Por derradeiro, não há que se falar em coisa julgada administrativa, dada a supremacia do interesse público em relação ao privado. CERCEAMENTO DE DEFESA Considerando que com a nulidade da homologação judicial, o feito de n. 0006052-39.2009.4.03.6317 terá prosseguimento, com abertura de vista para manifestação sobre o laudo, fica prejudicada a alegação de cerceamento de defesa. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00, a teor do disposto no art. 85, §8, do CPC/2015, suspensos em função da gratuidade da justiça. DISPOSITIVO Ante o exposto, nego provimento à apelação, estabelecidos os honorários advocatícios nos termos da fundamentação. É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA. ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA PREJUDICADA. NULIDADE DA HOMOLOGAÇÃO. CONSECTÁRIOS.
- A ação anulatória é o meio adequado para desconstituir acordo homologado judicialmente. Precedentes do STJ.
- A competência para anular homologação de acordo é do juízo que o homologou. Todavia, nos termos do art. 6º da Lei 10259/01, o INSS não pode figurar como parte autora no Juizado Federal, pelo que correto o ajuizamento perante a Vara Federal de Santo André.
- Considerando a data do ajuizamento da ação em 06.11.13 e que a sentença homologatória foi proferida em 31.05.10, não há que se falar em decadência/prescrição.
- É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados, com base no seu poder de autotutela, conforme enunciados das Súmulas n.º 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
- No caso, posteriormente à homologação do acordo judicial constatou o INSS alicerçar-se o acordo em data equivocada do início da incapacidade, sendo certo que na data correta do início da incapacidade em 02.07.2004, fixada no laudo pericial produzido na ação de n. 2009.63.17.006052-1, conforme extrato do CNIS, a autora não ostentava qualidade de segurado.
- Manutenção da sentença com a imposição de desconstituição da transação homologada com desarquivamento e prosseguimento do feito, abrindo-se vista às partes para manifestação sobre o laudo e posterior julgamento de mérito do feito 00006052-39.2009.4.03.6317 que tramitava perante o Juizado Especial Federal de Santo André.
- Considerando que com a nulidade da homologação judicial, o feito de n. 0006052-39.2009.4.03.6317 terá prosseguimento, com abertura de vista para manifestação sobre o laudo, fica prejudicada a alegação de cerceamento de defesa.
- Honorários advocatícios fixados em conformidade com o §8º do art. 85 do CPC/2015, suspensos em função da gratuidade da justiça.
- Apelação desprovida.