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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares, dar parcial provimento ao apelo para reduzir a pena-base do crime do artigo 231 do Código Penal ao patamar mínimo e, de ofício, afastar a pena de multa quanto a este delito e reduzir a pena de multa do crime de rufianismo para 12 (doze) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
Trata-se de apelação criminal interposta por ELI ALVES PINTO contra sentença que o condenou pela prática, em concurso material (artigo 69), dos crimes descritos nos artigos 230 e 231, este c.c. o artigo 71, todos do Código Penal.
Narra a denúncia que o apelante ELI ALVES PINTO, vulgo Stela, e Adriano Alves dos Reis, mediante prévio ajuste, de forma consciente, livre e voluntariamente, promoveram a saída de mulheres brasileiras para exercerem a prostituição em Roma e tiraram proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros.
Consta da exordial, verbis:
A denúncia foi recebida em 11 de fevereiro de 2008 (fl.125) e seu aditamento em 20 de fevereiro de 2008 (fl.137).
Determinou-se o desmembramento do feito (fl.181).
Após regular instrução, foi proferida sentença (fls.584/591) que julgou procedente a ação penal, condenando o acusado à pena total de 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semi-aberto, e ao pagamento de 65 (sessenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de um décimo do salário mínimo, negada a substituição da pena.
Inconformado, apela o acusado (fls.598/608), postulando o reconhecimento da nulidade das provas obtidas através de escuta telefônica, não autorizada judicialmente e sem o reconhecimento de voz; sua absolvição por ausência de provas quanto à autoria, ao dolo e à materialidade, inexistindo elementos que demonstrem ter alcançado proveito com a prostituição alheia ou que tenha facilitado a saída de mulheres do país; redução da pena-base ao patamar mínimo; afastamento da condenação em concurso material e formal, no que foi excedida a denúncia; regime aberto.
Contrarrazões do Ministério Público Federal no sentido de se negar provimento ao apelo (fls.617/625).
Parecer da Procuradoria Regional da República em prol de ser desprovido o recurso (fls.627/632).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada RAQUEL PERRINI:
De início, ratifico o relatório.
1. Das nulidades.
Pleiteia a defesa o reconhecimento da nulidade das provas obtidas através de escuta telefônica, não autorizada judicialmente e sem o reconhecimento da voz dos interlocutores.
No entanto, não subsiste qualquer razão ao inconformismo apresentado.
As escutas telefônicas e respectivas prorrogações foram devidamente autorizadas judicialmente no bojo de procedimento específico que, como sói acontecer, foi processado em autos próprios, sob o nº 2007.61.24.001527-3.
Por óbvio o procedimento, que precedeu as ações penais, vertido em apartado, não se faz presente, em sua íntegra, no feito atual. Estão nos autos, além de arquivo digital dos áudios citados (fl.113), as degravações pertinentes, relacionadas aos fatos trazidos à lume pela denúncia (fls.89/104).
Acerca do tema, julgado desta Corte:
Ademais, absolutamente prescindível a realização de perícia para comprovar a titularidade das vozes havidas através das conversas telefônicas interceptadas.
Além de estar em plena consonância com os ditames da lei 9.296/96, os elementos de convicção trazidos aos autos apontam seguramente para a identificação das vozes colhidas, sobretudo porque comprovado pelos demais elementos constantes dos autos, como a admissão, pelo apelante, em seu interrogatório, de ter mantido conversa telefônica com o corréu Adriano, que reconheceu ser sua a voz constante das interceptações.
Tal é o entendimento pacificado no E. Superior Tribunal de Justiça:
Rejeito, por conseguinte, as nulidades argüidas.
2. Do mérito.
Quanto ao mérito, melhor sorte não assiste ao apelante.
A materialidade dos crimes descritos nos artigos 230 e 231 do Código Penal está amplamente demonstrada, assim como a autoria atribuída ao apelante.
Através das transcrições das escutas telefônicas autorizadas judicialmente (fls. 89/104) constata-se que o apelante Eli (Stela) residia na cidade de Roma e, em conluio com o corréu Adriano (condenado nos autos principais), osquestrava esquema de tráfico de mulheres para a exploração de prostituição na Itália.
Nos diálogos interceptados entre o apelante e Adriano em 25/09/2007 e 04/10/2007, resta cristalino que as mulheres eram aliciadas por Adriano na região de Jales para se prostituírem na Europa, sendo o apelante Eli (Stela) responsável pela gestão financeira do esquema: arrecadava todo o ganho auferido pelas meretrizes no exercício de seu mister, pagava-lhes remunerações mensais fixas e custeava-lhes todas as despesas, com passagens aéreas, aluguel, anúncio das atividades oferecidas, comida, bebida, cigarros e ligações telefônicas (fls. 89/104).
Em seu interrogatório em juízo, o corréu Adriano negou qualquer envolvimento com o esquema de tráfico de mulheres para prostituição, admitindo tão-somente a versão de que convidava as moças para fazerem companhia a Eli (Stela), tendo-lhes comprado passagens aéreas com o dinheiro que foi enviado por Stela, a qual teria interesse em que todas as garotas fossem para a Itália auxiliá-la em seu salão de estética (fls.152/153).
As testemunhas de acusação, prostitutas que foram contatadas por Adriano, relatam os fatos em Juízo de forma uníssona:
As testemunhas Maíra (fl.392) e Mariele (fl.391) prestam depoimento no mesmo sentido das explanações acima.
As testemunhas de acusação, como visto, apontaram que todo o dinheiro recebido com os programas era entregue ao apelante Stela (Eli), que lhes fornecia moradia, alimentação e vestuário, o que indica que tirava proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros.
Resta demonstrado detalhadamente, em especial pela escuta telefônica e pelos depoimentos testemunhais, que Eli mantinha apartamentos na Itália onde moravam diversas moças brasileiras que se dedicavam ao meretrício, as quais eram aliciadas pelo corréu Adriano, que era pago por tais serviços. Verifica-se pelos documentos de fls.13/23 a remessa de valores ao corréu, encaminhados pelo apelante.
Ademais, o tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual praticado pelo apelante também está bem delineado, especialmente pelo teor da conversa mantida com Adriano em 05/10/2007, quando reclama do declínio nos negócios e da necessidade de serem enviadas meninas que fizessem "tudo", isto é, que se submetessem à prática sexual em todas as suas vertentes.
Provado está também que o apelante Eli coletava rotineiramente o dinheiro auferido pelas meretrizes com os programas, enviando parte do numerário a Adriano para que fosse providenciada a compra das passagens aéreas e entregue mil euros a cada nova aliciada para a comprovação de recursos financeiros, necessários à caracterização da condição de turista perante o departamento de imigração, além de pagamento pelos serviços realizados.
Além disso, as testemunhas de acusação de fls.252/254, respectivamente agente e delegado da polícia federal que encetaram as investigações, ressaltaram que Adriano não trabalhava e sobrevivia dos valores recebidos.
Todo o exposto aponta seguramente para a presença do dolo no recrutamento, bem como na obtenção de sustento às expensas das prostituídas.
Provadas a materialidade e autoria dos delitos, bem como o elemento subjetivo de cada qual, a manutenção da sentença condenatória é de rigor.
3. Da dosimetria.
3.1 Da pena-base.
O Juízo a quo fixou a pena-base do apelante, para o crime de rufianismo, em 01 (um) ano e 03 (três) meses e quanto ao crime de tráfico internacional, em 03 (três) anos e 06 (seis) meses, contra o que se insurge o apelante.
Quanto ao rufianismo, a elevação esteve bem fundamentada (fl.590), não merecendo reparos:
Contudo, no que se refere ao crime de tráfico de mulheres, o acréscimo baseou-se apenas nas circunstâncias judiciais, "que demonstram que a culpabilidade do réu se insere no grau elevado, pois a conduta de tráfico humano é altamente reprovável". As demais circunstâncias foram havidas como boas.
Dizer que o tráfico internacional humano para fins de prostituição é conduta altamente reprovável não constitui embasamento suficiente para elevar a pena-base, pois se caracteriza como elemento do próprio tipo penal e não em circunstância judicial aferida na análise casuística.
Dessa forma, reduzo a pena-base do crime previsto no artigo 231 para 03 (três) anos de reclusão.
3.2 Da continuidade delitiva.
A defesa postula o afastamento da condenação em concurso material e formal, alegando que foi excedida a denúncia.
No entanto, observa-se que bem delineados ambos os casos, conforme bem caracterizado no decreto condenatório:
Com efeito, tendo o réu, mediante mais de uma ação, praticado dois crimes distintos e autônomos, consistentes em tráfico internacional de pessoas para fim de exploração sexual (artigo 231 do Código Penal) e rufianismo, tirando proveito da prostituição alheia (artigo 230 do Código Penal), de rigor a soma das penas, em concurso material, nos moldes do artigo 69 do mesmo diploma legal.
Nesse sentido:
No que concerne ao rufianismo, a ocorrência da continuidade delitiva restou comprovada nos autos por cinco vezes. Na inicial, corroborada pela instrução, foram devidamente delineados todos os fatos delitivos atinentes ao rufianismo que, praticados pelo réu nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, implicam na necessária configuração do crime continuado.
Embora não conste expressamente da exordial a indicação ao artigo 71 do Código Penal, o réu defende-se dos fatos a ele imputados e não de sua capitulação legal, não havendo que se falar em sentença ultra ou extra petita.
Presentes os requisitos que autorizam tal ficção legal, que inclusive beneficia o réu, nada impede sua aplicação, como bem salientado pelo E. Superior Tribunal de Justiça:
3.3 Do regime
Mantém-se, como exposto, a pena atribuída à prática do crime de rufianismo em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão.
Prosseguindo no cálculo quanto ao crime de tráfico de pessoas, ausentes atenuantes ou agravantes, causas de aumento ou diminuição da pena, mantenho o acréscimo de 1/6 (um sexto) decorrente da continuidade delitiva, resultando em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão.
A pena total atinge 04 (quatro) anos e 09 (nove) meses de reclusão, ficando mantidos o regime semi-aberto, nos termos do artigo 33, §2º, "b" do Código Penal e a inviabilidade da substituição por restritiva de direito.
3.4 Da multa. A pena pecuniária, por sua vez, foi fixada para o crime de rufianismo em disparidade com os critérios adotados para a fixação da pena privativa de liberdade, em 15 (quinze) dias-multa. Readequando-a, de ofício, tem-se a elevação da pena-base de 10 (dez) dias-multa em ¼ (um quarto), o que resulta em 12 (doze) dias-multa, mantido o valor unitário estipulado em 1/10 (um décimo) do salário mínimo.
No tocante ao crime previsto no caput do artigo 231 do Código Penal, o mesmo sofreu alterações pela lei 12.015/2009 que, em que pese ter mantido a pena privativa de liberdade, suprimiu a pena de multa. Por conseguinte, tratando-se de lei posterior mais benéfica ao réu, aplico-a ao caso dos autos, reformando a sentença nesse aspecto.
Com tais considerações, rejeito as preliminares, dou parcial provimento ao apelo para reduzir a pena-base do crime do artigo 231 do Código Penal ao patamar mínimo e, de ofício, afasto a pena de multa quanto a este delito e reduzo a pena de multa do crime de rufianismo para 12 (doze) dias-multa.
É o voto.
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Data e Hora: | 01/08/2012 14:19:12 |