Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002270-55.1993.4.03.6100/SP
2005.03.99.022797-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CECILIA MARCONDES
APELANTE : AMAURY PEREZ
ADVOGADO : AMAURY PEREZ
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
No. ORIG. : 93.00.02270-9 7 Vr SAO PAULO/SP

VOTO-VISTA

Amaury Perez ajuizou perante a sétima vara cível desta capital ação ordinária de indenização por dano moral contra a União Federal em razão dos fatos articulados desde a inicial, onde - sucintamente - declara haver sido ofendido por uma prisão de 2 meses e 5 dias por acusação julgada improcedente, relatando que o fato teve repercussão midiática e projetou custos à família de diversas ordens.


A ação foi julgada improcedente forte em que "a absolvição por falta de provas não é atestado de erro judiciário e sim indicativo de que não havia elementos suficientes para sua condenação".


Defendeu o juízo, ademais, a legalidade da prisão cautelar. Condenou-se a autoria à averba honorária em 5% do valor atribuído à causa.


No exame que operou do recurso interposto pelo apelante a eminente relatora concluiu pela inexistência de ato culposo ou doloso do Judiciário capaz de ensejar indenização por responsabilidade objetiva do Estado, não havendo que atribuir-se à conta da União qualquer ônus por matéria jornalística publicada em periódico privado, sendo ademais certo que o apelante teria dado causa à própria prisão, na medida em que efetivamente portava moeda falsa, conduta tipificada como crime.


Pedi vistas para mais detidamente examinar o feito em seu mérito e sobre ele me pronunciar.


É o relatório. Passo às razões do voto:


É entendimento pacífico que o Estado não é civilmente responsável pelos atos do Poder Judiciário, a não ser nos casos expressamente declarados em lei, porquanto a administração da justiça é um dos privilégios da soberania.


Neste sentido, trago os arestos do STF:

EMENTA: - Responsabilidade objetiva do Estado. Ato do Poder Judiciario. - A orientação que veio a predominar nesta Corte, em face das Constituições anteriores a de 1988, foi a de que a responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos do Poder Judiciario a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Precedentes do S.T.F. Recurso extraordinário não conhecido.
(STF, RE 111609 / AM, Relator: Min. MOREIRA ALVES, Julgamento:  11/12/1992)
EMENTA : RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. ATO DO PODER JUDICIÁRIO. O princípio da responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos do Poder Judiciário, salvo os casos expressamente declarados em lei. Orientação assentada na Jurisprudência do STF. Recurso conhecido e provido.
(STF, RE 219117 / PR, Relator: Min. ILMAR GALVÃO, Julgamento:  03/08/1999)

Já previa o artigo 630 do Código de Processo Penal que nos casos de revisão criminal "o tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.". Com a promulgação da Constituição previu-se expressamente no artigo 5°, inciso LXXV, que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;".


A Magna Carta garantiu ao cidadão o direito à indenização nos casos de prisão por erro judiciário ou permanência de preso em tempo superior ao determinado na sentença, reconhecendo-se expressamente que o erro judicial - a condenação posteriormente modificada - é fato potencialmente lesivo à honra e à dignidade humanas, já que evidentes os prejuízos sofridos com numa condenação criminal.


Neste ponto, de se ressaltar lição do Douto Guilherme de Souza Nucci in Código de Processo Penal Comentado "convém mencionar o disposto no art. 5°, LXXV, da Constituição Federal, impondo ao Estado o dever de indenizar o dano causado por erro judiciário, bem como o prejuízo advindo de prisão excessiva, gerando tempo além do fixado na sentença. Merece especial atenção a norma constitucional, nítida garantia humana fundamental, pois abrange não apenas os erros judiciários reconhecidos em ações de revisão criminal, como se poderia, apressadamente, supor. O conceito de erro judiciário deve transcender as barreiras limitativas da sentença condenatória impositiva de pena privativa de liberdade, para envolver toda e qualquer decisão judicial errônea, que tenha provocado evidente prejuízo à liberdade individual ou mesmo à imagem e honra do acusado. Assim, prisões cautelares indevidas, com posterior absolvição, reconhecendo-se a negativa de ocorrência do fato ou proclamando-se a certeza de que o réu não foi o autor, ou mesmo admitindo excludente de ilicitude ou de culpabilidade, podem dar ensejo à reparação."


Cabe ressaltar, que a Corte Constitucional, já se manifestou no sentido de ser devida indenização por erro judicial nos casos decorrentes de prisão cautelar indevida. Neste sentido:

EMENTA: Erro judiciário. Responsabilidade civil objetiva do Estado. Direito à indenização por danos morais decorrentes de condenação desconstituída em revisão criminal e de prisão preventiva. CF, art. 5º, LXXV. C.Pr.Penal, art. 630. 1. O direito à indenização da vítima de erro judiciário e daquela presa além do tempo devido, previsto no art. 5º, LXXV, da Constituição, já era previsto no art. 630 do C. Pr. Penal, com a exceção do caso de ação penal privada e só uma hipótese de exoneração, quando para a condenação tivesse contribuído o próprio réu. 2. A regra constitucional não veio para aditar pressupostos subjetivos à regra geral da responsabilidade fundada no risco administrativo, conforme o art. 37, § 6º, da Lei Fundamental: a partir do entendimento consolidado de que a regra geral é a irresponsabilidade civil do Estado por atos de jurisdição, estabelece que, naqueles casos, a indenização é uma garantia individual e, manifestamente, não a submete à exigência de dolo ou culpa do magistrado. 3. O art. 5º, LXXV, da Constituição: é uma garantia, um mínimo, que nem impede a lei, nem impede eventuais construções doutrinárias que venham a reconhecer a responsabilidade do Estado em hipóteses que não a de erro judiciário stricto sensu, mas de evidente falta objetiva do serviço público da Justiça.
(STF, RE 505393 / PE, Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Julgamento:  26/06/2007) 

No caso dos autos, é devida indenização, uma vez demonstrado erro judiciário nos termos do art. 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal devendo o cidadão que é privado do direito de ir e vir,  por crime que não cometeu, ser indenizado, pela dor, tristeza, humilhação por ele sofridas.


O dano moral afigura-se, portanto, inquestionável, diante do longo período de dois meses e cinco dias em que o apelante ficou afastado do convívio dos familiares e do trabalho, além da pecha de "ex-presidiário", que o acompanhará. Assim, o tempo  em que o acusado ficou  preso deve ser indenizado.


No mais, penso que mesmo com a absolvição fundada na falta de provas (art. 386, VI do CPP) subsistente o dano causado, devendo, pois, ser ressarcido ou compensado de tal evento, porque a prisão cautelar revelou-se descoincidente com a realidade, vez que o apelante foi absolvido.


Neste sentido, trago à colação o seguinte entendimento:


PROCESSO CIVIL. ERRO JUDICIÁRIO. ART. 5º, LXXV, DA CF. PRISÃO PROCESSUAL. POSTERIOR ABSOLVIÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS.
1. A prisão por erro judiciário ou permanência do preso por tempo superior ao determinado na sentença, de acordo com o art. 5°, LXXV, da CF, garante ao cidadão o direito à indenização.
2. Assemelha-se à hipótese de indenizabilidade por erro judiciário, a restrição preventiva da liberdade de alguém que posteriormente vem a ser absolvido. A prisão injusta revela ofensa à honra, à imagem, mercê de afrontar o mais comezinho direito fundamental à vida livre e digna. A absolvição futura revela da ilegitimidade da prisão pretérita, cujos efeitos deletérios para a imagem e honra do homem são inequívocos (notoria non egent probationem).
3. O pedido de indenização por danos decorrentes de restrição ilegal à liberdade, inclui o "dano moral", que in casu, dispensa prova de sua existência pela inequivocidade da ilegalidade da prisão, duradoura por nove meses. Pedido implícito, encartado na pretensão às "perdas e danos". Inexistência de afronta ao dogma da congruência (arts. 2°, 128 e 460, do CPC).
4. A norma jurídica inviolável no pedido não integra a causa petendi. "O constituinte de 1988, dando especial relevo e magnitude ao status lebertatis, inscreveu no rol das chamadas franquias democráticas uma regra expressa que obriga o Estado a indenizar a condenado por erro judiciário ou quem permanecer preso por tempo superior ao fixado pela sentença (CF, art. 5º, LXXV), situações essas equivalentes a de quem submetido à prisão processual e posteriormente absolvido."
5. A fixação dos danos morais deve obedecer aos critérios da solidariedade e exemplaridade, que implica na valoração da proporcionalidade do quantum e na capacidade econômica do sucumbente.
6. Recurso especial desprovido.
(STJ, REsp 427560 / TO, processo: 2002/0044627-8, Relator: Ministro Ministro LUIZ FUX, data do julgamento: 5/9/2002)

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. REVISÃO CRIMINAL. ERRO JUDICIÁRIO. DIREITO À JUSTA INDENIZAÇÃO PELOS PREJUÍZOS SOFRIDOS.
É devida indenização uma vez demonstrado erro judiciário ex vi art. 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal e art. 630 do CPP. In casu, restaram devidamente comprovados os prejuízos sofridos pelo recorrente, razão pela qual não há óbice a uma justa indenização.
Recurso provido.
(STJ, REsp 253674 / SP, processo: 2000/0030970-2, Relator: Ministro FELIX FISCHER, data do julgamento: 4/3/2004)

Assim, restaram devidamente comprovados os prejuízos sofridos pelo recorrente, razão pela qual não há óbice a uma justa indenização.


Neste ponto, destaque-se o entendimento adotado pelo Desembargador Federal Frâncico Wildo/TRF5, proferido na AC 316067/PE, processo n° 2003.05.00.004573-4: "Destarte, o que o ordenamento quer não é punir o Estado, mas preservar a dignidade de quem sofreu as conseqüências de uma condenação, quando, posteriormente, demonstra-se que referida condenação não foi a decisão mais plausível para o caso analisado. Mas, quando uma aferição posterior, e mais detida, demonstra que a decisão dantes tomada não fora a mais plausível, pois interpretou os fatos de forma equivocada, deve o Estado indenizar o prejudicado.".

Por fim, destaque-se que o 'erro judicial' não quer dizer que o Juiz agiu com dolo ou com culpa. O ordenamento jurídico brasileiro adota a tese da responsabilidade do Estado sem necessidade de aferição de culpa nos casos de erro judiciário.


Neste sentido, transcrevo excerto do voto do Ministro do relator Ministro Sepúlveda Pertence, no RE505393, acima citado:


"Creio, porém, ser hoje opinião consensual da doutrina tratar-se de responsabilidade civil objetiva. Assim já me parecia evidente na disciplina do art. 630 do Código de Processo Penal. Agora, a sua constitucionalização no art. 5°, LXXV, obviamente, não veio para criar pressupostos subjetivos à regra geral da responsabilidade fundada no risco administrativo, do art. 37, § 6°, da Lei Fundamental: a regra constitucional nova veio apenas, a partir do entendimento consolidado de que a regra é a irresponsabilidade do Estado por atos de jurisdição, estabelecer que, naqueles casos, a indenização constituiria garantia individual, e, manifestamente, não submeteu à exigência de dolo ou culpa do magistrado. (grifei)
Enfim, teria outras considerações a fazer, mas o que se discute hoje, muito, é o problema da prisão preventiva indevida; são outras hipóteses de indenização por decisões errôneas ou por "faute de service" da administração da Justiça, que não estão efetivamente previstos no art. 5° LXXV, da Constituição, que não barra a discussão infraconstitucional da matéria, porque o art. 5°, LXXV, é uma garantia. Portanto, um mínimo que nem impede a lei, nem impede eventuais construções doutrinárias em hipóteses que não a de erro judiciário stricto sensu, mas de evidente falta objetiva do serviço público, como é o caso objeto do Recurso Extraordinário n° 70.121, a que me referi."

Com relação ao quantum de indenização o autor pede a condenação da ré "ao pagamento da indenização devida ao autor, no valor equivalente a 1.800 salários-mínimos videntes à época das ofensas", o que corresponde atualmente a R$ 700.559,39 (abril/2012).


Ora, a indenização deve ser fixada num valor razoável. Tal valor não pode ser tão alto que propicie enriquecimento sem causa, nem tão ínfimo que se torne inócuo ao fim que se propõe.


In casu, utilizando-se tal valor como parâmetro, entendo que 10% dessa quantia é bastante razoável para a compensação pelos danos causados ao apelante.


Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação, para condenar a União no pagamento de indenização por danos morais, arbitrada em R$ 7.055,93, devidamente atualizado até o efetivo desembolso. Por fim, condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios os quais fixo em R$ 7.000,00, com fundamento no artigo 20, §° do CPC.


É como voto.



NERY JÚNIOR
Desembargador Federal


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Data e Hora: 27/08/2012 15:18:29



D.E.

Publicado em 03/09/2012
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002270-55.1993.4.03.6100/SP
2005.03.99.022797-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CECILIA MARCONDES
APELANTE : AMAURY PEREZ
ADVOGADO : AMAURY PEREZ
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : TÉRCIO ISSAMI TOKANO
No. ORIG. : 93.00.02270-9 7 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

ADMINISTRATIVA - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - INDENIZAÇÃO - RESSARCIMENTO POR DANOS PATRIMONIAIS E MORAIS - PRISÃO EM FLAGRANTE - LIBERDADE PROVISÓRIA CONCEDIDA PELO TRIBUNAL - ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS (ART. 386, VI, CPP).
I - A prisão alegada pelo apelante, por estar em posse de moeda falsa, conduta que configura delito, foi ato de autoridade estadual que não integrou a lide. Conquanto posteriormente os autos do inquérito policial tenham sido encaminhados à Justiça Federal, é evidente que não há responsabilidade do Poder Público quando a prisão é decorrente de estado de flagrância, hipótese em que mesmo o particular pode efetuar a prisão. Logo, não se pode dizer que a União Federal praticou nenhum ato ilegal ou ilícito, vez que calcada nos ditames do ordenamento jurídico.
II - Foi concedida a liberdade provisória por este E. TRF em tempo razoável e o fato de não ter sido concedida a liberdade em Primeira Instância não implica erro judicial. Ademais, a concessão da liberdade provisória decorreu de questões técnicas, tanto que a ordem para trancar a ação foi denegada e o processo penal teve normal seguimento, culminando com a absolvição com supedâneo no inciso VI do artigo 386 do Código de Processo Penal, situação que não desautoriza os atos praticados pelo Poder Judiciário e pela Administração. Precedentes.
III - Não pode a União Federal ser responsabilizada por matéria jornalística policial veiculada em jornal particular, por não haver ingerência na atividade e por ser a liberdade de imprensa garantia constitucional.
IV - Apelação improvida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Vencido o Desembargador Federal Nery Júnior que lhe dava parcial provimento para condenar a União Federal no pagamento de indenização por danos morais arbitrada em R$ 7.055,93 e ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 7.000,00.


São Paulo, 23 de agosto de 2012.
CECÍLIA MARCONDES
Desembargadora Federal Relatora


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Data e Hora: 27/08/2012 13:55:28



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002270-55.1993.4.03.6100/SP
2005.03.99.022797-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CECILIA MARCONDES
APELANTE : AMAURY PEREZ
ADVOGADO : AMAURY PEREZ
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : TÉRCIO ISSAMI TOKANO
No. ORIG. : 93.00.02270-9 7 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pelo autor de sentença proferida em ação ordinária de indenização, que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, condenou o ora apelante no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 5% sobre o valor da causa. O autor, ora apelante, alega que no dia 22 de novembro de 1990 foi autuado em flagrante delito por "estar cooperando na venda de milhares de dólares falsos", tendo sido denunciado por infração do art. 289, parágrafo 1º do Código Penal, sendo posteriormente absolvido em 20/01/92.


Alega ainda ter permanecido preso indevidamente por 2 (dois) meses e 5 (cinco) dias, fato que provocou lesões a sua honra e liberdade pessoal.


Foi determinada especificação de provas pelo MM. Juiz "a quo", requerendo a apelante prova documental e testemunhal, sendo juntados documentos, pela apelante, ouvida testemunha (fls. 2023). Audiência de conciliação realizada, sem acordo.


O feito foi sentenciado, julgando improcedente o pedido.


O apelante, inconformado, pede a reforma da sentença.


Com contra-razões subiram os autos a este Tribunal.


Hipótese de revisão consoante os ditames regimentais.


É o relatório.



CECÍLIA MARCONDES
Desembargadora Federal Relatora


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002270-55.1993.4.03.6100/SP
2005.03.99.022797-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CECILIA MARCONDES
APELANTE : AMAURY PEREZ
ADVOGADO : AMAURY PEREZ
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : TÉRCIO ISSAMI TOKANO
No. ORIG. : 93.00.02270-9 7 Vr SAO PAULO/SP

VOTO

Trata-se de apelação interposta pelo autor de sentença proferida em ação ordinária de indenização, que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, condenou o ora apelante no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 5% sobre o valor da causa.


Analisando os fatos, depreende-se que em virtude de informações obtidas de comerciante estabelecido na cidade de São José de Rio Preto, policiais da Delegacia de Investigações Gerais - DIG tomaram conhecimento de que indivíduos estariam oferecendo cédulas de dólares falsas à venda.


Para apurar os fatos, os policiais estabeleceram contato com o apelante, entre outras pessoas.


Assim, o policial identificado na denúncia acompanhou o autor, ora apelante, Amaury Perez, e outro indivíduo de nome Valdir Boscoli, para confirmação do recebimento de ordem de pagamento para a aquisição das cédulas falsas. Em seguida da confirmação, o autor e o segundo elemento seguiram para a residência de uma terceira pessoa de onde voltaram à agência bancária, portando uma mala com as cédulas falsas. Ao informarem o policial "comprador" da posse das moedas falsas, foi dada voz de prisão a eles por policiais que aguardavam na referida agência.


Posteriormente à prisão de outros envolvidos, foi o inquérito policial enviado à Delegacia da Polícia Federal competente para realizar as apurações e, na seqüência, foram todos denunciados, denúncia que foi recebida em 10/12/90.


De acordo com os ensinamentos da festejada administrativista MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, (in "DIREITO ADMINISTRATIVO", 12ª ed., Ed. ATLAS, págs. 2):


"Com relação por danos causados por atos de seus agentes, o artigo 37, § 6º, da Constituição estabelece que 'as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nesta qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa'.

A responsabilidade é objetiva e alcança todas as pessoas públicas ou privadas, que prestem serviços públicos. Houve uma ampliação em relação à Constituição anterior (art. 107) que somente fazia referência às pessoas jurídicas de direito público. Note-se que a própria entidade da Administração indireta que responde e não a pessoa política que a instituiu; isto porque, tendo personalidade jurídica ela é dotada de patrimônio próprio, que responde por suas obrigações".


Mister se faz analisar para a solução da presente lide quais os requisitos necessários para a caracterização da responsabilidade da apelada, bem como quando aquele que presta serviço público responde por dano causado ao administrado.


Pois bem, para a caracterização da referida responsabilidade há de existir nexo de causalidade entre o ato praticado e o prejuízo arcado pelo administrado, e, de outra parte, para que reste evidenciada a responsabilidade estatal pelo dano, impende que o ato seja ilícito, ou, sendo lícito, tenha sido afrontado o preceito constitucional da igualdade.


Analisando o feito, cumpre ser asseverado que o ora apelante se insurge contra a realização e a sua manutenção na prisão, por entender ser ilegal diante de sua posterior absolvição, ocasionando os danos materiais e morais descritos na inicial.


Ocorre que, como ressaltado em voto proferido por este E. Tribunal, no HC n.º 90.03.42149-8/SP, da relatoria do Des. Fed. Célio Benevides, a prisão em si "não vicia o ato eis que o art. 301 da lei instrumental penal autoriza até mesmo 'qualquer do povo' prender quem se encontre em situação de flagrante delito." (fls. 54)


Evidentemente, cumpria à Polícia Estadual entregar os presos à autoridade policial federal para a lavratura do respectivo flagrante, o que não aconteceu, já que foi enviado à Policia Federal o inquérito policial instaurado (fls. 33).


Contudo, a eventual responsabilidade pela realização de tal ato da autoridade policial estadual não há que ser analisada vez que, como se observa da leitura dos documentos dos respectivos autos, o ora apelante foi preso por autoridade estadual que não integrou a lide.


Esta Corte concedeu a liberdade provisória ao apelante, nos seguintes termos:

"HABEAS CORPUS - CRIME DE GUARDA DE MOEDA FALSA - FLAGRANTE PREPARADO POR POLICIAIS POR OCASIÃO DA COMERCIALIZAÇÃO DE MOEDA FALSA - INDEFERIMENTO PELO JUÍZO MONOCRÁTICO DO PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA.

- Tendo os paciente a posse de moeda falsa em com a intenção de colocá-la em circulação fica evidenciado o delito preconizado no art. 289, § 1º do Código Penal, independente da conduta policial na espécie.

- É de ser deferido a pedido de liberdade provisória, uma vez presentes as condições objetivas para a sua concessão.

- Ordem denegada.

- Concessão de liberdade provisória.."(fls. 57)


Portanto, restou evidenciado que a conduta praticada era, a princípio, típica, razão pela qual a ordem foi denegada e o processo teve seguimento até o seu julgamento final. Contudo, foi concedida a liberdade provisória, fato este que não desnatura eventual ilicitude da conduta.


Conforme se conclui da leitura dos respectivos autos, não restou demonstrada a responsabilidade da apelada pelos supostos danos ocasionados ao apelante, sendo certo que, por parte da União Federal, os atos foram praticados com rigorosa observância da lei.


Além do mais, nota-se que o flagrante foi efetuado pelas autoridades policiais estaduais não sendo, portanto, da responsabilidade da União Federal tal ato.


Consoante se conclui da leitura da sentença de fls. 41/50, a absolvição se deveu por falta de provas e a manutenção do ora apelante em prisão se deu até a apreciação do HC em tempo razoável e de acordo com os ditames legais.


Portanto, não há que se falar em erro judicial do qual tenha decorrido lesão ao apelante.


Observe-se que a r. sentença que absolveu o apelante do crime imputado foi explícita ao asseverar que somente o fazia em função da aplicação do "benefício da dúvida", eis que "não está completamente descartada a probabilidade de todos serem sócios na propriedade do dinheiro falso mas, quanto a estes dois acusados, não se colheram provas que razoavelmente levassem à responsabilização deles pela obtenção e guarda das cédulas contrafeitas." (fls. 46). A absolvição ocorreu, portanto, com fundamento no artigo 386, VI, do Código de Processo Penal, situação esta que não desautoriza os atos praticados pela Administração e pelo Poder Judiciário, não ensejando, assim, a pretendida verba indenizatória. Nesse sentido:

"Configuração de erro judiciário, para efeito de indenização, não se compatibiliza com a absolvição pela inexistência de prova suficiente para a condenação. Decisão com suporte processual do art. 386, VI, do CPP, não é demonstrativa da certeza da inocência do réu. É técnica processual que se apóia na dúvida, em que prefere o erro judiciário que desfavorece a sociedade ao erro judiciário que ofenda o denunciado" (TJRS, Embs. 597.222.652-Capital, Rel. Des. Tupinambá M. C. do Nascimento, j. 5-3-1999).

Importante destacar, ainda, que a prisão do apelante decorreu de flagrante delito, nos termos do artigo 5º, LXI, da Constituição Federal e do artigo 302 do CPP, medida segregatória cautelar realizada dentro dos limites da ordem legal e devidamente autorizada pelo ordenamento jurídico, que permite inclusive ao particular efetuar a prisão nesta hipótese. Não se verifica, dessa situação, ato injusto ou ilegal que possa ensejar reparação por dano moral, consoante entendimento jurisprudencial:

"Responsabilidade civil do Estado - Indenização - Réu preso preventivamente e absolvido por insuficiência de provas - Decreto segregatório dentro dos limites da ordem legal, sem que tenha havido qualquer ato de natureza culposa, erro judiciário, ilegalidade ou arbitrariedade - Verba indevida" (RT, 752:319).


"Indenização - Fazenda Pública - Danos morais e materiais - Prisão indevida - Inocorrência - Concessão de liberdade provisória subordinada à análise de condições objetivas e subjetivas, estas últimas não ostentadas - Recurso não provido" (JTJ, Lex, 198:93).


"Indenização - Erro judiciário - Inocorrência - Réu absolvido em processo-crime por não terem sido bem evidenciadas as circunstâncias em que ocorreram os fatos - Inexistência de dolo ou fraude nos atos do Ministério Público ou do Judiciário quando no exercício de suas funções - Verba indevida - Inaplicabilidade do art. 37, § 6º, da CF" (RT, 749:285)


"Indenização - Fazenda Pública - Prisão determinada em processo criminal que culminou com a absolvição pelo Tribunal - Fato que, por si só, não significa erro na decisão monocrática - Inocorrência, ademais, da hipótese do art. 630 do CPP - Ação improcedente" (JTJ, Lex, 175:36)


"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PRISÃO QUESTIONADA. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MORAL. DESCABIMENTO.

I - Tendo sido realizada a prisão dentro dos parâmetros legais, mesmo ante a pertinência da questão afeita à falta de intimação para defesa prévia, não há que se cogitar de teratologia do ato judicial, o que mitiga o erro do judiciário a ponto de não impor a indenização

por dano moral.

II - Recurso improvido." (REsp 815004 / RJ; RECURSO ESPECIAL Nº 2006/0010595-9, PRIMEIRA TURMA, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, publ. DJ 16.10.2006 p. 309)


A sua privação de liberdade, portanto, decorreu de causa justa, uma vez que surpreendido em hipótese de flagrante delito. Logo, sob este aspecto e também pelo erro judiciário - que não houve - mostra-se improcedente o pedido referente a indenização sob este supedâneo.


No que tange à lesão à honra, diz o apelante ter sido caluniado e injuriado, com inegáveis prejuízos para a sua boa fama, "como se observa dos recortes de jornais acostados à inicial." Todavia, a publicação de matérias jornalísticas em periódicos não é realizada pela União Federal, ora apelada, de forma que o pedido sob este fundamento mostra-se inteiramente improcedente.


É entendimento pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, inclusive objeto de súmula, que "são civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação" (Súm. nº 221). Não há a menor possibilidade de se condenar a União Federal em face de matéria jornalística policial publicada em jornal particular, por não haver ingerência na atividade e considerando-se que a liberdade de imprensa é garantia constitucionalmente assegurada, configurando um dos pilares do Estado Democrático de Direito.


Concluindo, não há demonstração de ato doloso ou culposo do Poder Judiciário a fim de que se possa concluir pela responsabilidade do Poder Público. Não está configurado, também, o erro judiciário, pois a liberdade provisória foi concedida pelo Tribunal depois de impetrado o oportuno remédio heróico. Finalmente, a Administração não pode ser responsabilizada por matéria jornalística publicada em periódico particular.


Assim, evidenciado está que o apelante deu causa a sua prisão na medida em que portava moeda falsa, conduta tipificada como crime.


Ante o exposto, nego provimento a apelação.


É como voto.


CECÍLIA MARCONDES
Desembargadora Federal Relatora


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