D.E. Publicado em 01/09/2014 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação e, com base no artigo 515, § 3º, do Código de Processo Civil, julgar parcialmente procedente o pedido do autor, sendo que o Juiz Federal Roberto Jeuken o fazia em menor extensão, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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VOTO-VISTA
Pedi vista para melhor inteirar-me da documentação existente nos autos, sobretudo quanto a indenização acolhida no voto condutor do julgamento, inclusive no tocante aos danos materiais.
E nesta oportunidade trago o meu voto a propósito da questão.
Inicialmente cumpre assentar que estou de acordo com o voto do eminente relator no pertinente ao afastamento da prescrição acolhida em primeiro grau e quanto ao prosseguimento no âmbito do art. 515 § 3º do CPC, visto que a causa encontra-se madura.
Destaco ainda do aludido voto a ausência de recurso autoral quanto a litispendência do pleito volvido a indenização por perdas e danos e lucros cessantes, em face da decisão proferida na ação de nulidade de ato administrativo c/c restituição de coisa apreendida e ressarcimento de danos, que tramitou perante a 2ª Vara Federal de Campo Grande/MS (Autos 00.1012-0), onde averbado, a propósit, que não comprovados naqueles autos (fls. 243, ultimo parágrafo).
Também verifico que a guia relativa ao recolhimento da Taxa Rodoviária Única, antecessora do IPVA, registrava tratar-se de caminhão tipo basculante, o que também restou afirmado por testemunhas da autoria (fls. 237 e 238 destes autos).
Do procedimento administrativo instaurado pela Receita Federal, nada consta a respeito deste ponto, apurando-se apenas que fora apreendido no transporte ilegal de café, providência comumente levada a efeito com caminhões dotados de carroceria tradicional de madeira, sobretudo porque a carga, de regra, encontra-se ensacada e não "a granel". O silêncio da prova documental coligida pelas partes milita em prol desta realidade: transporte de café ensacado e em caminhão dotado de carroceria de madeira.
Mas é certo que o emplacamento à época da apreensão não mais coincidia com aquela atribuída ao veículo, pela autoridade de trânsito em São Paulo/SP, sendo outra de município do Mato Grosso do Sul.
Enfim, somente com o ingresso do autor nos autos do procedimento administrativo é que restou possível detectar-se o real proprietário do caminhão. Entrementes, o perdimento administrativo já fora decretado. E por ocasião da propositura da presente ação, já arrematado por terceiro de boa-fé, pelo valor de NCrz$ 65.000,00 (sessenta e cinco mil cruzados novos) (fl. 93), o qual, atualizado para a data do julgamento, correspondia a R$ 65.730,21 (Sessenta e cinco mil, setecentos e trinta reais e vinte e um centavos), certo que os trinta mil reais acolhidos pelo voto-condutor, correspondia, na mesma ocasião, à cifra de R$ 80.059,88 (oitenta mil cinqüenta e nove reais e oitenta e oito centavos).
No documento de fls. 105, firmado pela autoria na ocasião do registro da ocorrência do furto, o valor do caminhão foi por ela apontado como sendo Cr$ 4.500.000,00 (Quatro milhões e quinhentos mil cruzeiros), que equivale a R$ 43.284,00 (Quarenta e três mil duzentos e oitenta e quatro reais).
De sorte que, em valores atuais a arrematação perfaz 82% do montante pedido na inicial, sendo este 184% acima do valor informado no momento em que registrada a ocorrência do furto.
Considerado este ultimo valor, a arrematação substanciaria 151% do mesmo, não podendo ser olvidado que as coisas envelhecem e aí, além da valorização, torna-se necessário levar em conta a depreciação do bem. Sobretudo quando ele foi objeto de furto, ficando por cinco anos a deriva do seu proprietário, sendo apreendido, ao que se infere, pois a autoria não cuidou de fazer a prova que lhe competia, com modificações que também interferem no preço, pois uma carroceria de madeira custa menos que uma basculante.
Em consulta a sítio eletrônico ligado ao comércio de caminhões, onde utilizado a tabela FIPE, tradicional neste ramo, não localizamos valor de mercado para a atualidade, no tocante ao caminhão Mercedes Benz, modelo 1113, ano de fabricação 1977, sendo o mais próximo conseguido, o de 1983, seis anos após, para o qual indicado o valor de R$ 31.510,00 ao passo em que o lanço vencedor no leilão administrativo representava, mais que o dobro (108%), sendo indiscutível que eventual valor disponibilizado quanto ao ano de 1977, seria inferior ao R$ 31.510,00, sugerido pela tabela fipe. E também a taxa de depreciação seria superior a atual, pois o veículo estava com 12 anos de uso e não os 37, se ainda funcionando nos dias atuais.
Daí porque, reputamos como mais consentâneo com a realidade, limitar o valor da indenização a importância informada à época do furto (fls. 105), R$ 43.284,00, da qual ainda poderia ser deduzida a taxa de depreciação do bem.
Relativamente ao dano moral, não logramos vislumbrar substrato probatório suficiente para acolher a pretensão. De fato, no anterior pleito relativo a indenização por perdas e danos, a sentença a afastou pela mesma razão, falta de prova dos prejuízos suportados (lucros cessantes e danos emergentes).
O voto condutor leva em conta os percalços sofridos com as diversas lides judicializadas, o que não se erigiria a tanto, de vez que na referida ação a sentença declinou falta de prova, rectius: deficiência processual. Também ao buscar a restituição do bem apreendido, descurou-se de que o leilão já ocorrera. Daí a sentença, conquanto anulando o procedimento administrativo correlato, tê-la afastada em homenagem ao princípio da boa-fé do terceiro adquirente.
Donde o contexto sugerir, com fortes colores, que os percalços decorreram das opções feitas pela própria autoria, não sendo moralmente adequado que esta deficiência sirva, exatamente, para beneficiar a quem lhe deu causa.
Também não se avista abuso por parte da requerida, numa estrita análise do caso, posto que a administração pública esta adstrita ao princípio da legalidade. Decretado o perdimento administrativo do bem, e a autoria somente ingressou no procedimento administrativo após tal desfecho, não haveria espaço para a administração voltar atrás. Restaria somente as vias judiciais, mesmo, não se podendo valorar pejorativamente a conduta fazendária para daí extrair quociente de dano moral em prol da autoria.
Em verdade, a apreensão do veículo transportando café, ilegalmente, acabou por se revelar um benefício, aliás, reconhecido em seu primeiro requerimento administrativo, pois naquelas alturas e, passados tantos anos, dificilmente o veículo seria localizado de outra forma. Já era um caso perdido.
Demasia registrar que a Receita Federal nada tem a ver com a demora verificada desde o furto do veículo, providência esta afeita aos órgãos da Segurança Pública de São Paulo, onde ocorrido o furto e do Mato Grosso do Sul, por onde o mesmo transitava à época da sua apreensão.
Consta da documentação carreada que foram apreendidos mais dois caminhões, além deste ora tratado, todos eles transportando ilegalmente café brasileiro em direção ao Paraguai, sendo surpreendidos nas proximidades da fronteira entre os dois países, ocasião em que os motoristas lograram evadir-se do local, sendo preso em flagrante apenas um outro envolvido.
O caminhão furtado da autoria, continha placas de município sul-matogrossense Naqueles idos ainda vigorava a sistemática anterior, placas de duas letras, que eram trocadas sempre que o veículo fosse alienado a pessoa de outro município e não a atual, com três letras, em que o mesmo número persiste durante as diversas mudanças de propriedades do mesmo bem. No seu interior, encontrou-se documentação de propriedade contendo nome de terceira pessoa.
Destarte, naquele momento, a míngua de êxito na notificação pessoal, somente restaria mesmo a via editalícia. Não se está olvidando que o procedimento restou anulado, havendo coisa julgada em prol do autor. Contudo, tais peculiaridades, conquanto suficientes para aquela decisão, não militam em prol do dano moral, segundo o nosso convencimento.
Razão pela qual, divergimos do voto-condutor, com a vênia costumeira e sempre devida, para limitar a indenização do bem ao montante informado pelo autor à época do furto, atualizada monetariamente, cumprindo esclarecer que os valores aqui informados tomaram em conta os parâmetros da Resolução CJF 2013/00267, de 02.12.2013, mais juros moratórios a partir da citação, não cumuláveis com a SELIC, ou seja, Cr$ 4.500.000,00 em agosto de 1983, equivalentes em fevereiro do corrente ano a R$ 43.284,50 (Quarenta e três mil duzentos e oitenta e quatro reais e cinqüenta centavos), e para desacolher a condenação em danos materiais.
É como votamos.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta pelo autor Miguel Ferreira Neves contra a sentença prolatada nos autos da ação de indenização por dano material e moral e lucros cessantes, a qual julgou extinto o feito sem julgamento de mérito, com relação ao pedido de lucros cessantes e com julgamento de mérito, para reconhecer a prescrição em relação aos pedidos de dano material e moral, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), bem como de custas processuais.
Alega o autor na inicial que teve seu veículo, um caminhão marca Mercedes Bens, modelo 1113, ano 1977, placas IU-8868-SP, furtado em 22 de agosto de 1983, na cidade de São Paulo, conforme boletim de ocorrência de fls. 32 e certificado de propriedade de fls. 80/82.
Relata que posteriormente o veículo foi apreendido por policiais federais em 8 de dezembro de 1987, conforme documento de fls. 46, consistente no auto de prisão em flagrante, tendo sido instaurado processo administrativo fiscal.
Expõe o autor que ao ser intimado apresentou defesa, comprovando ser o proprietário do veículo, porém o bem não lhe foi restituído, findando com o processo com a declaração de perdimento do bem em favor da Fazenda Nacional (fls. 47/51).
Em razão do ocorrido, promoveu processo judicial nº 1.801/89, objetivando a liberação do bem, o que foi deferido pelo Juiz Federal da 2ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande, no entanto, o veículo já havia sido leiloado pela Receita Federal.
Em sequência, o autor propôs ação de nulidade administrativa com pedido de sequestro, restituição de coisa apreendida e ressarcimento de danos contra a União Federal, que recebeu o nº 90.1373-9 e tramitou pela 2ª Vara Federal de Campo Grande, vindo a ação ser julgada improcedente em 07 de julho de 1995, ao fundamento de que, tendo a Receita Federal promovido a venda do veículo em hasta pública, sendo o bem arrematado por terceiro, não seria possível o acolhimento do pedido de restituição do bem, em face da mudança de dominialidade, em razão da venda, conforme cópia da sentença anexada às fls. 71/75.
Diante dos fatos, o autor propôs a presente ação indenizatória objetivando o ressarcimento do dano material, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), lucros cessantes a serem apurados em liquidação de sentença, consistente no que deixou de lucrar com a utilização do bem, após a determinação do juízo para devolução do bem, em 30 de janeiro 1990.
Expõe ainda que a incúria e negligência da ré deram causa à perda do único bem móvel que possuía, acarretando danos materiais e morais, estando obrigada nos termos da Constituição Federal a recompor os prejuízos materiais e a dor do dano moral, em valor a ser fixado pelo Juiz, em salários mínimos vigentes a época do efetivo pagamento.
Apresentou documentos de fls. 23/116 e deu à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais).
A União contestou o pedido alegando que o autor não se manifestou tempestivamente no procedimento administrativo, tendo promovido a ação 00.1012-0, que tramitou pela 2ª Vara da Justiça Federal em Campo Grande/MS, em que pleiteava danos emergentes e lucros cessantes, sem obter êxito, embora não tenha noticia atual do feito.
Informa que foram infrutíferas as intimações pessoais e via correio para localizar o proprietário do veículo, tendo sido fixado edital para quem de direito se apresentar para impugnação e ninguém compareceu para reclamar o veículo em questão, sendo devidamente baixado o ato declaratório de perdimento em favor da Fazenda Nacional.
Adita que somente após dois meses o autor reclamou a propriedade do veículo, porém, intempestivamente, sendo o veículo vendido em hasta pública em 22 de setembro de 1989 e somente em 30 de janeiro de 1990 o Inspetor da Receita Federal recebeu a ordem judicial para devolução do veículo.
Alegou que o direito do autor está prescrito, argumentando que o termo inicial da prescrição das ações contra a União é a data do ato ou fato do qual se originaram, que no presente caso seria a data da venda do veículo em hasta pública, ocorrida em 22/11/1989, portanto, mais de 8 anos.
Consignou que nos processos judiciais que tramitaram na Justiça Federal o autor já poderia ter formulado todos os pedidos, a rigor do artigo 292 do CPC, que permite a cumulação de pedidos, concluindo que mesmo os não constantes nos outros processos, estão prescritos, nos termos do artigo 1º do Decreto-lei 20.910/32.
Assevera que quanto aos demais pedidos também estão prescritos, mesmo considerando que houve interrupção do prazo prescricional, em razão dos referidos processos, a rigor do artigo 3º do Decreto-Lei 4.597/42.
Defende-se no mérito sustentando que a União nada deve ao autor a título de indenização e, caso fosse devida, não poderia ultrapassar o valor arrecadado com o venda do bem em hasta pública.
Pontua que a União não pode ser responsabilizada pelas atitudes intempestivas e eleição de vias inadequadas escolhidas pelo autor.
Afirma que não cabe no presente caso ressarcimento do dano moral, pois a União agiu conforme princípio da estrita legalidade, sendo lícito o seu ato.
Assinala que o dano moral apesar de consagrado na Constituição Federal, não está expresso no Código Civil, não se podendo cumular danos material e moral, pois este está incluído naquele. Acrescenta que, quando devido, sua fixação deve ser cautelosa a fim de evitar abusos.
Quanto ao pedido de indenização pelos lucros cessantes, requereu a extinção do feito sem apreciação do mérito em razão da coisa julgada ou litispendência, bem como seja declarada a prescrição ou, caso rejeitada, seja julgado improcedente a ação, com a condenação do autor aos ônus da sucumbência.
Em réplica o autor alegou que não promoveu outra ação por perdas e danos ou lucro cessante, mas de nulidade de ato administrativo, sendo que por este motivo o prazo prescricional foi interrompido (fls. 141/148).
Expôs que a venda em hasta pública se deu em 22 de novembro de 1989 e ação de nulidade foi proposta em 01 de junho de 1990, reiniciando sua contagem pelo prazo de dois anos e meio, após a pratica do último ato na referida ação, assim, tendo a ação sido proposta em 12 de maio de 1998, não se concretizou a prescrição, nos termos do artigo 3º do Decreto-lei nº 4.597/42.
As partes foram intimadas para especificar as provas que pretendiam produzir, tendo o autor requerido a oitiva de testemunha e a União apresentado os documentos de fls. 153/ 168, consistente na cópia da sentença da ação de nulidade de ato administrativo, promovida pelo autor, em que buscava também o ressarcimento do dano.
Às fls. 182/216 e 221/26 foram anexadas cópias dos autos da medida incidental.
O d. Magistrado a quo julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, com relação do pedido dos lucros cessantes, nos termos do artigo 301, parágrafo 3º c/c 267, V do CPC e com julgamento de mérito em relação aos pedidos de dano material e moral, reconhecendo a prescrição, condenando a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais).
Apela o autor, requerendo a reforma da sentença e a condenação do apelado aos pagamentos das indenizações por dano material e moral, reiterando os argumentos da inicial e réplica (fls.269/89).
A União contrarrazoou o recurso do autor (fls. 296/303).
Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
VOTO
Merece reforma a sentença que decretou a prescrição do direito de ação.
A prescrição pressupõe um direito não exercido dentro de certo lapso temporal, tendo como consequência a extinção da ação, com resolução do mérito, tratando-se, pois, de legítima exceção de direito material e como tal deve ser deslindada.
No conceito clássico de Clóvis Beviláqua (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, comentado, ed. histórica, Editora Rio, 7a. t. da ed. de 1940, vol. I, p. 435) "prescrição é a perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, em conseqüência do não-uso dela, durante um determinado espaço de tempo".
A partir do conceito acima, Sílvio Rodrigues (Direito Civil, vol. I, Saraiva, São Paulo, 16a. ed., 1986, p. 340/341) preleciona que: "a) a inércia do credor, ante a violação de um direito seu; b) por um período de tempo fixado na lei; c) conduz à perda da ação de que todo o direito vem munido, de modo a privá-lo de qualquer capacidade defensiva".
Quer dizer, o elemento temporal, cujo período é fixado em lei, aliado à inércia do credor, leva, inexoravelmente, à perda do direito de ação, repercutindo no próprio direito material, que permanece latente, porém, carente de meios defensivos para torná-lo efetivo.
Com relação à Fazenda Pública, de fato o Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, no seu artigo 1º, dispõe que as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra as Fazendas federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em 5 (cinco) anos, contados da data do ato ou fato do qual se originaram.
A inteligência da referida norma conduz à conclusão de que a partir do momento em que ocorre o fato gerador dos alegados danos, nasce o direito da parte autora de ajuizar ação para reaver o prejuízo sofrido, dentro do prazo de cinco anos. É o chamado princípio da actio nata, significando que o prazo de prescrição inicia-se a partir do momento em que o direito de ação possa ser exercido.
Na espécie, pretende o apelante o ressarcimento dos danos material e moral, decorrente da indevida venda de seu veículo em hasta pública, promovida pela Receita Federal, submetendo-se, portanto, ao prazo prescricional de cinco anos (Decreto n. 20.910).
No caso em apreço, o ato que se aponta como causador de dano, a venda do veículo em hasta pública, ocorreu em 22/11/1989. O autor interrompeu o prazo prescricional ao propor ação declaratória de nulidade nº 0001012-58.1989.403.6000 (nº origem 00.00010120) em 1º de junho de 1990, na qual foi proferida sentença em 7 de julho de 1995, obtendo provimento parcial para declarar nulo o ato administrativo de perdimento do veículo, sem acolher o pedido de restituição do bem, em razão da mudança de dominialidade, julgando improcedente o pedido de composição do prejuízos alegados (lucros cessantes).
Em prosseguimento e em homenagem aos princípios da celeridade processual e do devido processo legal, convém verificar se a teoria da causa madura é aplicável, está pronta para julgamento, de modo a possibilitar a aplicação do artigo 515, 3º, do Código de Processo Civil, conforme inclusive salientado na sentença:
Nos termos do art. 515:
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, tem abarcado e aplicado amplamente a Teoria da Causa Madura, nas hipóteses em que o processo foi extinto em razão da prescrição, conforme se pode observar dos julgados abaixo relacionados:
Observo ainda que, não obstante o art. 515 , § 3º do CPC utilize a expressão "exclusivamente de direito", a jurisprudência vem entendendo que, nesse particular, o legislador expressou menos do que pretendia, de modo a estar autorizado o enfrentamento do mérito também quando a causa versar sobre matéria de fato, desde que "madura para julgamento", sem violação do duplo grau de jurisdição ou reformatio in pejus.
Acerca do assunto, registro o seguinte comentário de Theotônio Negrão e José Roberto F. Gouvêa:
No mesmo sentido já decidiu o STJ:
Assim, o pressuposto para a incidência do art. 515, 3º, é o de que a causa esteja madura para o julgamento, viabilizando a análise do mérito.
Compulsando os autos, verifica-se que as partes foram intimadas para especificarem as provas a produzirem, tendo a União apresentado os documentos de fls. 153/ 168, consistente na cópia da sentença da ação de nulidade de ato administrativo e o autor, embora tenha requerido a oitiva de testemunha, o feito foi sentenciado, não se insurgindo o ora apelante nesse aspecto, de forma que se conclui que a prova documental colacionada nos autos é suficiente para solucionar a controvérsia, podendo ser aplicada a Teoria da Causa Madura para julgamento.
Dessa forma, prossigo no julgamento.
Inicialmente cabe consignar que foi reconhecido a litispendência quanto ao pedido de indenização por lucros cessantes, não sendo a matéria impugnada no recurso de apelação, de forma que somente serão apreciados os pedidos de indenização por dano material e moral, postulados na inicial.
Afasto a alegação da União, relativa à ofensa ao artigo 292 do CPC, sob a afirmativa de que o autor já poderia ter formulado todos os pedidos em outras ações anteriormente promovidas, pois a regra constante do dispositivo apresenta mera permissão de cumulação de pedidos e não a obrigatoriedade.
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
No entanto a questão restou superada com o julgamento da ação declaratória de nulidade nº 00.1012-0, cuja cópia encontra-se às fls. 154/159, demonstrando o dano patrimonial sofrido pelo apelante e o nexo de causalidade decorrente da indevida declaração de perda de seu veículo, um caminhão, marca Mercedes Benz, modelo 1113, ano 1977, placas IU-8868-SP e consequente venda em hasta pública.
Constou expressamente da sentença:
A tese defensiva da ré, ampara-se na alegação de impossibilidade de se cumular dano material e moral, pois este estaria incluído naquela, sustentando que o dano moral não está expresso no Código Civil de 1916, sustentado o mesmo argumento de defesa ao dano material, respeitante a licitude de seu ato, pautado no princípio da estrita legalidade.
A matéria encontra-se pacificada pela na Súmula 37 do STJ, a qual dispõe: São cumuláveis as indenizações por dano material e moral oriundos do mesmo fato.
Acrescenta-se que o direito fundamental à reparação por dano moral, garantido constitucionalmente, não pode ser suprimido nem cerceado por ato normativo infraconstitucional ou por interpretação da regra de direito.
Em prosseguimento, para que se configure o dano moral e o consequente dever de indenizar, há situações em que é prescindível a prova do efetivo prejuízo que, implícito na própria ofensa em si (damnum in re ipsa), dela decorra direta e necessariamente.
O dano moral está ínsito no próprio ato de ofensa, decorrente da gravidade do ilícito em si, de modo que, comprovado a ocorrência do fato, está demonstrado o dano moral, justificando a concessão de satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
O nexo causal decorrente dessa conduta que gerou o dano moral experimentado pelo apelante, consistente no transtorno pessoal experimentado pelo apelante, consistente na frustração pelas inúmeras tentativas de reaver o seu bem, comprado com trabalho árduo, conforme alegou na inicial, por certo causou angústia e consternação, que dispensa a prova de efetivo prejuízo, obrigação de reparar o dano dele decorrente, cumprindo a obrigação de indenizar.
Juros e Correção monetária.
Sobre o valor fixado na indenização por dano material incidirá juros de mora a partir do evento danoso, fixado em 22/11/1989, data da venda do veículo em hasta pública, nos termos do enunciado 54 da Súmula do STJ.
Sobre o valor da indenização fixada a título de dano moral incidirá juros de mora desde a data do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do Superior Tribunal Justiça e correção monetária a partir da data do arbitramento, conforme Súmula 362.
Especificamente quanto aos juros de mora, deverá incidir o percentual de 0,5% (meio por cento) até 11.01.2003 (entrada em vigor do novo Código Civil) e, somente a partir de 12/01/2003 à taxa de 1% (um por cento) ao mês, reduzidos em 0,5% (meio por cento) ao mês, a partir da entrada em vigor da Lei 11.960/09, ante a condenação imposta à União.
É como voto.
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