Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 30/06/2014
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001728-37.2012.4.03.6111/SP
2012.61.11.001728-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : CLAUDIO ROBERTO PERASSOLI
ADVOGADO : SP148760 CRISTIANO DE SOUZA MAZETO e outro
No. ORIG. : 00017283720124036111 2 Vr MARILIA/SP

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. PATROCÍNIO INFIEL. ATIPICIDADE. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. ARTIGO 168, §1º, III, DO CP. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. PERPETUAÇÃO DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DOSIMETRIA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Denúncia que descreve fato caracterizado pelo levantamento e apropriação, por advogado, de valores de benefício previdenciário depositados em nome de seu cliente, em razão de sentença transitada em julgado proferida nos autos de ação previdenciária.
2. Conduta que não se subsume ao tipo do artigo 355 do Código Penal. Mantida a absolvição por este delito, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.
2. Devidamente demonstradas a materialidade e a autoria do crime tipificado no artigo 168, §1º, III, do Código Penal.
3. Perpetuação da competência da Justiça Federal, nos termos dos artigos 109, IV da Constituição Federal e 81 do Código de Processo Penal, e à luz da Súmula 122 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
4. Preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, no valor equivalente a um salário mínimo, a ser destinada à União Federal.
6. Apelo parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para condenar Claudio Roberto Perassoli, pela prática do crime previsto no artigo 168, §1º, III, do Código Penal, à pena de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, no regime inicial aberto, e ao pagamento de 13 (treze) dias multa, cada qual fixado no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Nos termos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser cumprida conforme estabelecido pelo juízo da execução, e prestação pecuniária, no valor equivalente a 01 (um) salário mínimo, destinada à União Federal, conforme entendimento adotado por esta Turma, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 24 de junho de 2014.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001728-37.2012.4.03.6111/SP
2012.61.11.001728-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : CLAUDIO ROBERTO PERASSOLI
ADVOGADO : SP148760 CRISTIANO DE SOUZA MAZETO e outro
No. ORIG. : 00017283720124036111 2 Vr MARILIA/SP

RELATÓRIO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Marília/SP, que julgou improcedente a pretensão punitiva estatal deduzida na denúncia e absolveu CLAUDIO ROBERTO PERASSOLI, com fulcro no artigo 386, III, em relação ao crime de patrocínio infiel, e no artigo 386, II, quanto à imputação do crime de apropriação indébita, descrito no artigo 168, §1º, III, do Código Penal.

O réu foi denunciado pelo Parquet Federal como incurso nas sanções do artigo 355 e artigo 168, §1º, III, c.c. artigo 69, todos do Código Penal.

Segundo consta da denúncia (fls. 67/69):

"(...) Em 06/12/2004, o denunciando, na qualidade de advogado de Geraldo de França Pereira (nomeado pela assistência judiciária gratuita), aforou ação ordinária em face do Instituto Nacional do Seguro Nacional, visando reconhecimento do direito à aposentadoria por invalidez (Autos nº 0004548-10.2004.403.6111 - 3ª Vara Federal de Marília). O Tribunal Regional Federal da 3ª Região julgou procedente o referido pleito, sendo que o acórdão transitou em julgado.
Após os valores dos 'retroativos' da sobredita prestação previdenciária (R$15.876,98) serem disponibilizados para levantamento junto ao PAB da Caixa Econômica Federal - Justiça Federal, no dia 18 de fevereiro de 2009, o denunciando e Geraldo de França compareceram àquele posto de atendimento bancário, quando o denunciando apresentou a Geraldo 'alguns papéis', dizendo que era para serem assinados, já que se tratava de 'simples conferência'. Geraldo então assinou os citados papéis, apesar de que o denunciando não o informou acerca da existência da aludida disponibilidade.
Depois, por algumas vezes, Geraldo de França Pereira foi ao escritório profissional do denunciando, o qual continuou omitindo a disponibilidade para fins de levantamento do valor devido a Geraldo; cerca de um ano do comparecimento ao citado PAB, Geraldo foi novamente ao escritório profissional do denunciando, quando este teve discussão com aquele, entregando R$10.000,00 (dez mil reais) em espécie a Geraldo, sustentando que tinha direito a 30% (tinta por cento) sobre o valor recebido na ação, referentes aos seus honorários advocatícios".

A denúncia foi recebida em 26 de outubro de 2012 (fls. 72/77).

Defesa preliminar, às fls. 97/102. Decisão afastando as hipóteses de absolvição sumária e determinando o prosseguimento do feito (fl.110/111). Cópia dos autos da ação ordinária nº 0004548-10.2004.403.6111 (fls. 118/345).

Laudo pericial às fls. 391/396.

Em alegações finais, o Ministério Público Federal pleiteou a condenação do réu nos termos da denúncia (fls. 429/431).

A defesa, por sua vez, apresentou memoriais às fls. 433/437, pugnando pela absolvição.

Após regular instrução, sobreveio a sentença de fls. 439/450, que julgou improcedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia e absolveu Claudio Roberto Perassoli das imputações que lhe foram feitas, com fundamento no artigo 386, incisos III (em relação ao delito de patrocínio infiel) e II (em relação ao crime de apropriação indébita agravada), do Código de Processo Penal.

Inconformado, apela o Ministério Público Federal (fl.452), pleiteando em suas razões recursais (fls.455/467), a condenação do acusado como incurso nas penas dos artigos 355 e 168, §1º, III, c.c. artigo 69, todos do Código Penal.

Contrarrazões da defesa, às fls. 475/480, pelo improvimento do recurso. Sustenta, ainda, a incompetência da Justiça Federal para julgamento do crime de apropriação indébita, em razão da atipicidade do delito de patrocínio infiel.

Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República opina pelo parcial provimento da apelação ministerial, para que o réu seja condenado apenas pela prática do crime de apropriação indébita previsto no artigo 168, §1º, III, do Código Penal (fls.483/499).

É o relatório.

À revisão.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001728-37.2012.4.03.6111/SP
2012.61.11.001728-9/SP
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : CLAUDIO ROBERTO PERASSOLI
ADVOGADO : SP148760 CRISTIANO DE SOUZA MAZETO e outro
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VOTO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Imputam-se ao acusado a prática dos crimes previstos nos artigos 355 e 168, §1º, III, c.c. artigo 69, todos do Código Penal.

Do patrocínio infiel. Dispõe o artigo 355 do Código Penal:

Art. 355 - Trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado:
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa.

Para a caracterização do delito em comento, é necessário que o advogado traia o dever profissional, prejudicando o interesse de seu constituinte, em juízo.

Ou seja, exige-se que o advogado, com sua conduta, no processo, provoque um prejuízo ao seu constituinte, prejudicando o interesse que deveria na verdade defender, por força de seu dever profissional.

Segundo Alberto Silva Franco, in Código Penal e sua Interpretação, Ed. RT, 8ª. Edição:

"O núcleo do tipo está no verbo trair, ou seja, 'enganar', 'atraiçoar', 'ser infiel'. Não influi na configuração do crime o fato de o advogado ser procurador remunerado ou não; e tanto faz que tenha sido escolhido pela parte ou nomeado pelo juiz. (...) Indispensável, contudo, que a traição do advogado tenha ocorrido em ação judicial proposta, pois deverá ocorrer em juízo e não fora dele, pois tal circunstância constitui elemento do tipo".

Narra a denúncia que o réu se apossou do numerário depositado pelo INSS em favor de Geraldo de França Pereira, a título de benefício previdenciário, decorrente de decisão judicial transitada em julgado proferida nos autos nº 0004548-10.2004.403.6111.

Observo que a denúncia não indica qual o foi o interesse do constituinte do réu que, no curso do processo, foi prejudicado, tampouco descreve como se deu a traição. Além disso, os fatos narrados na peça acusatória ocorreram após o trânsito em julgado, não mais em juízo.

A propósito:

"Não se configura o patrocínio infiel se a sua atuação foi extrajudicial, embora possa significar transgressão disciplinar (TACrSP, RT 580/352)".

A conduta descrita na denúncia não se subsume ao tipo do artigo 355 do Código Penal, mas sim configura, em tese, o crime de apropriação indébita.

Nesse sentido:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA...2. Não se evidencia, estreme de dúvidas, a inocência do ora Paciente, advogado militante, porquanto a denúncia descreve, de forma consistente e suficiente para a deflagração da persecução penal, a existência, em tese, de fato tipificado como apropriação indébita, caracterizado pelo levantamento e apropriação de valores de benefício previdenciário depositados em Juízo em nome de sua cliente...
STJ - 5ª Turma - RHC 16605-SP - Rel.Min. Laurita Vaz - DJ 29.11.2004 p.352
CRIMINAL. RHC. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. ADVOGADO. VALORES DEPOSITADOS A TITULO DE INDENIZAÇÃO. RETENÇÃO DA QUANTIA ... Hipótese em que o paciente foi denunciado pela prática do delito de apropriação indébita, porque teria recebido as quantias depositadas pela municipalidade, à titulo de indenização, por força da procuração outorgada por seus clientes, deixando de repassá-las aos mesmos, retendo-as injustificadamente... Tem-se configurado, a princípio, o delito de apropriação indébita, pois, de acordo com a inicial acusatória e com o acórdão a quo, o paciente levantou as quantias depositadas, em ação expropriatória, pela Administração Pública a titulo de indenização dos seus clientes, retendo-as injustificadamente, agindo, portanto, com dolo específico de se apropriar de coisa alheia...
STJ - 5ª Turma - RHC 16146-SP - Rel.Min. Gilson Dipp - DJ. 02.08.2004 p.431

Dessa forma, mantenho a absolvição pela prática do delito previsto no artigo 355 do Código Penal, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.

2. Da apropriação indébita. Razão assiste ao Ministério Público Federal quanto ao pleito de condenação do acusado como incurso no artigo 168, §1º, III, do Código Penal.

2.1 Da materialidade: A materialidade delitiva restou demonstrada pelas provas colacionadas aos autos, notadamente pela procuração ad-judicia (fl.20), comprovante de levantamento judicial (fls. 34/35), ofício da Caixa Econômica Federal e comprovante de depósito na conta de Claudio Roberto Perassoli (fls. 51/52), cópia dos autos da ação ordinária (fls. 118/345), bem como pela prova testemunhal.

Segundo consta da inicial acusatória, o acusado, na qualidade de advogado, levantou valores depositados na conta judicial nº 1181.005.50445499-3 oriundos da ação previdenciária nº 0004548-10.2004.403.6111, deixando, de repassá-los à parte que representava.

2.2 Da autoria. Ouvido perante a autoridade policial, Geraldo de França Pereira confirmou as declarações que havia prestado na Procuradoria da República de Marília, onde afirmou que, em 18 de fevereiro de 2009 esteve na agência da Caixa Econômica Federal, na companhia do réu. Naquela ocasião assinou alguns papéis, que segundo Cláudio, destinavam-se a "simples conferência". Disse que não sabia que estava efetuando o saque do valor depositado judicialmente, muito menos, que estava repassando tais valores ao advogado. Decorrido, aproximadamente, um ano, foi ao escritório do acusado e, após uma discussão, recebeu R$10.000,00 (dez mil reais) em espécie (fl.06).

Em juízo, Geraldo declarou que Cláudio entregou-lhe R$10.000,00 (dez mil reais) no ano de 2010, quase um ano após o comparecimento ao posto bancário da CEF. Asseverou que recebeu 146 notas de R$50,00 (cinquenta reais) e 27 (vinte e sete) notas de R$100,00 (cem reais). Afirmou que, quando foi à agência da Caixa Econômica Federal em 18 de fevereiro de 2009, assinou alguns papéis a título de "conferência", porém, na ocasião, não foi informado que o valor já estava disponível para saque (mídia à fl. 381).

O réu foi ouvido na fase policial, às fls. 17/18. Declarou que: "em 18 de fevereiro de 2009, Geraldo foi até o Posto de Atendimento Bancário da Caixa Econômica Federal, mantido na Justiça Federal de Marília, e realizou o saque de quinze mil, oitocentos e setenta e seis reais e noventa e oito centavos, conforme cópia de recibo que apresenta neste ato. (...) Que presenciou, portanto, Geraldo receber os valores (...) Que não cobrou nenhum valor para representar Geraldo judicialmente ou administrativamente, uma vez que tem conhecimento que é defeso ao profissional nomeado como dativo; que, contudo, Geraldo disse que pagaria ao declarante um terço daquilo que fosse conseguido judicialmente, sem ser coagido para tanto(...) Que, contudo, não reteve um terço dos R$15.876,98 sacados no PAB da CEF; que Geraldo pagou paulatinamente no decorrer do ano de 2009, pelo que se recorda, a quantia total de 15% dos valores levantados".

Em juízo, o réu apresentou nova versão dos fatos. Declarou que em 18 de fevereiro de 2009, Geraldo não quis sacar a quantia de R$15.876,98 (quinze mil, oitocentos e setenta e seis reais e noventa e oito centavos), sob a alegação de que sua família "tomaria seu dinheiro". Por essa razão, o valor foi transferido para a sua conta (Claudio) a pedido de Geraldo, o qual assinou o comprovante de recebimento integral dos valores. Afirmou que, conforme Geraldo lhe pedia, repassava parcelas daquele valor. Indagado sobre a contradição de seu depoimento prestado na fase policial, o apelado afirmou que compareceu à delegacia desacompanhado de advogado e os fatos foram redigidos de forma errônea pelo escrivão. Em relação ao recebimento de honorários, o réu negou que tenha recebido qualquer quantia de Geraldo (mídia à fl. 423).

As testemunhas da defesa, Carlos Alberto dos Santos Mattos, Rosemary Vieira e Fabio Mendes Batista nada acrescentaram acerca da apuração dos fatos, eis que se limitaram a tecer comentários acerca da personalidade e da boa conduta do réu (mídia às fls. 381, 423).

Leila Cristina Barboza de Brito afirmou que viu Geraldo, algumas vezes, no escritório do acusado. No entanto, a testemunha não presenciou e não pôde comprovar se realmente houve recebimento de algum numerário naquelas situações (mídia à fl. 381).

Fernanda Maria Ribeiro da Silva, funcionária da Caixa Econômica Federal, compareceu em juízo e confirmou as declarações prestadas na fase investigativa. Declarou que, embora não se recorde do atendimento realizado na data dos fatos, é possível verificar, através dos comprovantes bancários, que o valor total levantado, equivalente a R$15.876,98, não foi sacado, e sim, foi transferido integralmente para outra conta. Confirmou que somente realiza a transação para a pessoa que efetivamente entrega os documentos exigidos e assina o comprovante de solicitação de pagamento (fls. 42/43 e mídia à fl. 381).

Segundo informações prestadas pela Caixa Econômica Federal, os valores referentes ao levantamento da conta judicial nº 1181.005.50445499-3 foram depositados integralmente na conta nº 3972.013.00002054-6 pertencente a Claudio Roberto Perassoli, em 18 de fevereiro de 2009 (fls. 51/52).

Não obstante o réu tenha apresentado recibo, segundo o qual Geraldo declara que recebeu o importe de R$15.876,98, provenientes dos autos nº 2004.61.11.004548-3, restou comprovado que Geraldo não levantou a referida quantia em 18 de fevereiro de 2009 (declaração à fl. 383 e laudo pericial à fl. 391/396).

Com efeito, o valor foi transferido em sua totalidade para o advogado Claudio Roberto Perassoli.

A alegação de que teria "emprestado" sua conta e que, à medida que Geraldo solicitava, o réu entregava-lhe parcelas daquela quantia, não encontra respaldo nos autos.

Nenhuma prova foi apresentada nesse sentido. Não constam recibos de pagamento de tais parcelas, mas tão somente, extratos bancários apontando saques da conta bancária do acusado, que nada comprovam (fls. 104/109).

Por outro lado, as declarações de Geraldo foram firmes e coerentes, tanto na fase inquisitorial, quanto em juízo, no sentido de que não recebeu os valores a que fazia jus, tampouco foi informado sobre sua disponibilidade na data em que o montante foi levantado. O réu apropriou-se da quantia de R$15.876,98 e devolveu apenas R$10.000,00, quase um ano após.

A prova, portanto, é idônea e segura o suficiente para demonstrar a prática do crime de apropriação indébita, previsto no artigo 168, §1º, III, do Código Penal.

Por oportuno, destaco que embora tenha sido devolvida uma parcela do valor apropriado, o crime se configurou no momento em que houve a inversão da posse e o acusado passou a dispor do numerário como seu.

Segundo o Superior Tribunal de Justiça:

PENAL - APROPRIAÇÃO INDÉBITA - ARREPENDIMENTO POSTERIOR - A apropriação indébita, dizem os penalistas, se dá quando o agente inverte o título de posse, isto é, muda, sem justa causa, o título, utilizando-o como sua fosse. Vale dizer, incorpora-a ao seu patrimônio. O animus do agente é fundamental para configurar a natureza jurídica da impontualidade. O ressarcimento do prejuízo não exclui a tipicidade. Aliás, o Código Penal, a propósito encerra instituto específico - Arrependimento Posterior - cujo efeito é causa especial de diminuição da pena.
(STJ. 09.03.1999. Sexta Turma REsp 199600535914. Rel. Luiz Vicente Cernicchiaro)

Devidamente demonstradas a materialidade e a autoria delitivas, impõe-se a condenação do réu como incurso no artigo 168, §1º, III, do Código Penal.

3. Da competência da Justiça Federal. O réu foi denunciado pela prática, em tese, do crime tipificado no artigo 355 do Código Penal, cometido nos autos de uma ação de natureza previdenciária, que serviu à definição da competência, em função do comprometimento da administração da Justiça Federal, que teria sido afetada pelo patrocínio infiel então apurado.

Assim, competente a Justiça Federal por força do artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal. Em consonância com a Súmula n.° 122 do Superior Tribunal de Justiça, resta atraída, à Justiça Federal, a competência para a apuração dos demais delitos conexos ao patrocínio infiel, in casu, a apropriação indébita.

Ademais, ainda que tenha ocorrido a absolvição pelo crime de patrocínio infiel, operou-se a perpetuação da competência do Juízo Federal, à luz do artigo 81 do Código de Processo Penal.

Nessa esteira:

HABEAS CORPUS. PENAL. PATROCÍNIO INFIEL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. CRIMES PRATICADOS EM PROCESSOS NA VARA FEDERAL. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. INQUÉRITO POLICIAL. TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. JUSTA CAUSA EVIDENCIADA. 1. Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes dos arts. 168 e 355 do Código Penal, uma vez que a denúncia trata de concurso formal entre os crimes de apropriação indébita e patrocínio infiel, praticados perante a Justiça Federal de Campinas/SP, hipótese de continência, nos termos do art. 77, inciso II, do Código de Processo Penal. Súmula n.º 122 do STJ. 2. O trancamento de inquérito policial pela via estreita do habeas corpus é medida de exceção, só admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca e sem a necessidade de valoração probatória, a inexistência de autoria por parte do indiciado ou a atipicidade da conduta. 3. O inquérito possui como elementos indiciários da autoria de conduta típica por parte dos Pacientes, além do fato de que as vítima nunca receberam os créditos levantados pelos indiciados, as cópias das procurações ad judicia, os alvarás de levantamento expedidos nos autos do processo, e os recibos fornecidos pelos mandatários em valor expressivamente menor que o devido nas declarações dos lesados e de seus familiares. 4. Reconhecer a falta de justa causa para o indiciamento, porque pendente a prestação de contas final onde todos os valores seriam pagos às vítimas, inexistindo o dolo, demanda o reexame do material cognitivo constante nos autos, incabível na via eleita. 5. Habeas corpus conhecido e denegado.
(STJ. HC 200500909491. Relatora Laurita Vaz. Quinta Turma. 07/04/2008).


Da dosimetria: A culpabilidade, os motivos, circunstâncias e conseqüências do crime são próprias do tipo penal, a ausência de elementos para avaliar a conduta social e a personalidade, impede qualquer ilação em seu prejuízo.

Assim, na primeira fase da dosimetria, fixo a pena no mínimo legal.

À míngua de circunstâncias atenuantes e agravantes, aplico, na terceira etapa, a causa de aumento prevista no artigo 168, §1º, III, do Código Penal. Dessa forma, fixo a pena privativa de liberdade em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, no regime inicial aberto, e 13 (treze) dias multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.

Preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser cumprida conforme estabelecido pelo juízo da execução, e prestação pecuniária, no valor equivalente a 01 (um) salário mínimo, já que ausentes nos autos elementos indicativos da situação econômica do sentenciado, capazes de justificar a fixação da prestação pecuniária acima do patamar mínimo. Destino-a à União Federal, conforme entendimento adotado por esta Turma.


Ante o exposto, DOU parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal, para condenar Claudio Roberto Perassoli, pela prática do crime previsto no artigo 168, §1º, III, do Código Penal, à pena de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, no regime inicial aberto, e ao pagamento de 13 (treze) dias multa, cada qual fixado no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Nos termos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser cumprida conforme estabelecido pelo juízo da execução, e prestação pecuniária, no valor equivalente a 01 (um) salário mínimo, destinada à União Federal, conforme entendimento adotado por esta Turma.

É o voto

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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