Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2008.03.99.023666-0/SP
APTE : JOSE PAULO FERNANDES
ADVOGADO : LUIZ INFANTE
APDO : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO : VINICIUS DA SILVA RAMOS
: HERMES ARRAIS ALENCAR

DECISÃO TERMINATIVA





Vistos etc.


Trata-se de apelação interposta por JOSÉ PAULO FERNANDES em face da r. sentença de extinção do processo sem resolução do mérito por falta de interesse de agir (carência da ação), nos termos do art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, de pedido de revisão de benefício previdenciário, em cujas razões recursais se sustenta que é desnecessário o prévio exaurimento da via administrativa como condição de ajuizamento da ação e, no mérito, que tem direito ao recálculo da renda mensal inicial da aposentadoria, tomando por base a média dos 24 (vinte e quatro) salários-de-contribuição anteriores aos 12 (doze) últimos, de acordo com os índices da ORTN/OTN, nos termos da Lei nº 6.423/77, bem como ao reajuste conforme a Súmula 260 do extinto TFR.


Com as contra-razões de apelação, subiram os autos a este Tribunal.


É o relatório.


D E C I D O


Na forma do artigo 557 do Código de Processo Civil, poderá o relator negar seguimento ou dar provimento a recurso e a reexame necessário, de acordo com as hipóteses assinaladas em referido dispositivo legal, regra aplicável ao presente caso.


A alegada falta de interesse de agir, decorrente da ausência de requerimento administrativo prévio, não pode prevalecer. Conquanto se possa dizer que não exista lide, em virtude da ausência de pretensão resistida a qualificar o conflito de interesses, o fato é que o INSS, constantemente, nega acesso ao pretenso beneficiário as suas vias administrativas sob alegação de falta de cumprimento dos requisitos necessários à concessão do benefício em questão.


Não há razão para que o segurado, como condição prévia ao ajuizamento de ação, deflagre pedido administrativo quando já se antevê que a pretensão não tem encontrado, em casos semelhantes, a acolhida esperada. A resistência a qualificar o conflito de interesses na hipótese é evidente, gerando o legítimo interesse de agir diante da necessidade do provimento jurisdicional almejado.


Ademais, o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal reza que "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".


Nesta esteira, este Tribunal Regional Federal firmou entendimento no sentido de que é desnecessária a prévia postulação administrativa ou o exaurimento dessa via para obtenção de benefício previdenciário por meio da prestação jurisdicional, notadamente quando a pretensão é daquelas que rotineiramente a autarquia previdenciária tem se pronunciado pelo indeferimento. Tal entendimento, em face das reiteradas decisões, cristalizou-se na Súmula 09, com o seguinte teor:


"Em matéria previdenciária, torna-se desnecessário o prévio exaurimento da via administrativa, como condição de ajuizamento da ação".

No mesmo sentido da orientação aqui adotada, os seguintes precedentes jurisprudenciais:


"AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PROPOSITURA DA AÇÃO. PRÉVIO REQUERIMENTO. VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE.
1. Consoante entendimento pacificado desta Corte, é desnecessário o prévio requerimento administrativo para a propositura de ação judicial objetivando a concessão de benefício previdenciário.
Precedentes.
2. Agravo regimental improvido." (STJ; AGA 461121/SP, Relator Ministro Fernando Gonçalves, j. 17/12/2002, DJ 17/02/2003, p. 417);
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. DESNECESSIDADE.
O prévio requerimento na esfera administrativa não pode ser considerado como condição para propositura da ação de natureza previdenciária.
Ademais, é pacífico neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é desnecessário o requerimento administrativo prévio à propositura de ação que vise concessão de benefício previdenciário.
Recurso conhecido e desprovido." (STJ; REsp nº 602843/PR, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, j. 26/10/2004, DJ 29/11/2004, p. 379).

No mesmo sentido, precedente da 10ª Turma desta Corte Regional Federal, em aresto de minha relatoria:


"O prévio requerimento administrativo não é condição para a propositura de ação previdenciária, especialmente em se tratando de pretensão que não tem encontrado acolhida na esfera administrativa. Prevalência do princípio do amplo acesso ao Poder judiciário, estabelecido no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal." (AC nº 755043/SP, j. 23/11/2004, DJU 10/01/2005, p. 149).

Ante os ditames impostos pela Constituição Federal, bem como de acordo com precedentes jurisprudenciais, restam evidenciados o interesse processual e a idoneidade da via eleita para a autora pleitear seu direito.


Ressalta-se que não é o caso de anulação da sentença para que seja enfrentado o mérito, pois a questão discutida no presente caso versa somente sobre matéria de direito, sendo suficiente os documentos encartados aos autos para o exame e julgamento da lide, de forma antecipada, e sendo desnecessária a dilação probatória estando, portanto, em condições de imediato julgamento pela superior instância, nos precisos termos do § 3º do artigo 515 do Código de Processo Civil.


Por outro lado, a prescrição qüinqüenal somente alcança as prestações não pagas nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito. Neste sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica a seguir:


"Em se tratando de ação proposta com o fito de obter revisão de benefício previdenciário, relação de trato sucessivo e natureza alimentar, a prescrição que incide é aquela prevista na Súmula 85/STJ: "Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.". Inocorrência da chamada prescrição do fundo de direito." (REsp nº 544324/SP, Relator Ministro Felix Fischer, j. 25/05/2004, DJ 21/06/2004, p. 242).

No presente caso, as diferenças relativas à aplicação do índice integral no primeiro reajuste pela Súmula 260 do extinto TFR estão prescritas, tendo em vista que tais diferenças são anteriores aos 5 (cinco) anos que precedem ao ajuizamento da ação. O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre o tema, fixando a seguinte orientação:


"Em sendo paga a última parcela a menor, por desobediência ao comando da primeira parte da Súmula nº 260/TFR, em março de 1989 e sem reflexos na renda futura do benefício previdenciário, eis que, para a aplicação do artigo 58 do ADCT, há de se considerar o valor da data da concessão do benefício, tem-se que, passados mais de cinco anos daquela data, impõe-se reconhecer a prescrição do direito às diferenças decorrentes da não aplicação da aludida Súmula, nos termos do disposto nos artigos 1º do Decreto nº 20.910/32 e 103 da Lei nº 8.213/91. Precedentes." (STJ; REsp nº 544657/SP, Relator Min. HAMILTON CARVALHIDO, j. 16/03/2004, DJ 10/05/2004, p. 357)

Aplicável ao caso destes autos, confira-se a seguinte ementa de aresto deste Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região:


"PREVIDENCIÁRIO. REAJUSTE DE BENEFÍCIO. ÍNDICE INTEGRAL NO PRIMEIRO REAJUSTE. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ARTIGO 58 DO ADCT. LEI Nº 8.213/91 - INPC.
I- AS DIFERENÇAS RESULTANTES DA APLICAÇÃO DA SÚMULA 260 DO TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS, "IN CASU", FORAM ALCANÇADAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL.
II- A EQUIVALÊNCIA SALARIAL PREVISTA NO ARTIGO 58 DO ADCT DEVE SER APLICADA NO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE 05/04/89 E 09/12/91.
III- COM A REGULAMENTAÇÃO DA LEI 8.213/91, POR MEIO DO DECRETO 357/91, PASSOU O INPC A CONSTITUIR-SE ÍNDICE IDÔNEO À CORREÇÃO DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS.
IV- RECURSO IMPROVIDO." (TRF-3ªR; AC nº 503824/SP, Relator Desembargador Federal CÉLIO BENEVIDES, j. 02/05/2000, DJU 26/07/2000, p.127).

Vencidas estas questões prévias, passa-se ao exame e julgamento do mérito do recurso.


O autor obteve a concessão de seu benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço em 01/12/1983, ou seja, antes da vigência da atual Constituição Federal e da Lei nº 8.213/91, conforme se verifica do documento trazido aos autos (fl. 40).


Por ocasião da concessão do benefício previdenciário encontrava-se em vigor a Lei nº 6.423/77, que determinava:


"A correção, em virtude de disposição legal ou estipulação de negócio jurídico, da expressão monetária de obrigação pecuniária somente poderá ter por base a variação nominal da obrigação do Tesouro Nacional - OTN".

Assim, ressalvadas as exceções do parágrafo 1º, do artigo de lei mencionado, não se poderia utilizar outro indicador econômico para a correção monetária (parágrafo 3º, do art. 1º, da Lei nº 6.423/77), de modo que os 24 (vinte e quatro) salários anteriores aos 12 salários imediatamente anteriores à concessão dos benefícios, que formam o período de verificação do salário-de-benefício, deveriam ter sido corrigidos pelo índice ORTN/OTN/BTN, e não com base em índices próprios do Ministério da Previdência e Assistência Social - MPAS, com base no § 1º do art. 26 do Decreto nº 77.077, de 24/01/1976. Aliás, tal questão foi objeto de Súmulas nos egrégios Tribunais Regionais Federais da 3ª e 4ª Regiões, conforme a seguir se transcreve:


TRF-3ª Região, Súmula 07: "Para a apuração da renda mensal inicial dos benefícios previdenciários concedidos antes da Constituição Federal de 1988, a correção dos 24 (vinte e quatro) salários-de-contribuição, anteriores aos últimos 12 (doze), deve ser feita em conformidade com o que prevê o artigo 1º da Lei 6423/77";

TRF-4ª Região, Súmula 02: "Para cálculo da aposentadoria por idade ou por tempo de serviço, no regime precedente à Lei 8.213 de 24 de julho de 1991, corrigem-se os salários-de-contribuição anteriores aos 12 últimos meses pela variação nominal da ORTN/OTN".

Este entendimento foi adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica das seguintes ementas de arestos:


"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. REAJUSTES. SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO. OS 24 ANTERIORES AOS 12 ÚLTIMOS DEVEM SER CORRIGIDOS PELAS ORTN/OTN. SALÁRIO BÁSICO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL PACIFICADA PELA ADOÇÃO DA INTERPRETAÇÃO DADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL AO TERMO A QUO DA INCIDÊNCIA DO SALÁRIO MÍNIMO COMO ÍNDICE DOS REAJUSTES PREVIDENCIÁRIOS, COM REPERCUSSÃO NO TERMO AD QUEM DA APLICAÇÃO DO SALÁRIO DE REFERÊNCIA" (REsp nº 67959/95-SP, Relator Ministro JOSÉ DANTAS, j. 30/08/95, DJ 25/09/95, p. 31.130);
"PREVIDENCIÁRIO. RENDA MENSAL INICIAL. CRITÉRIO DE CORREÇÃO. BENEFÍCIO CONCEDIDO ANTES DA CONSTITUIÇÃO. ORTN/OTN. APLICAÇÃO.
POSSIBILIDADE.
1. Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de que, para os benefícios concedidos antes da Constituição Federal de 1988, aplica-se a variação da ORTN/OTN na correção dos 24 (vinte e quatro) salários de contribuição anteriores aos 12 (doze) últimos.
2. Recurso especial conhecido em parte e, nesta extensão, provido." (REsp nº 480.376/RJ, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, j. 20/03/2003, DJ 07/04/2003, p. 361).

Assim, perfeitamente aplicável a Lei nº 6.423/77 para a correção dos salários-de-contribuição que serviram de base para o cálculo dos salários-de-benefício da aposentadoria do autor.


Recalculado o benefício, nos limites acima apontados, o mesmo deverá ser mantido pela equivalência em número de salários mínimos à data da concessão, cuja atualização por esse critério tem incidência a partir do sétimo mês contado da promulgação da Constituição Federal de 1988 até a implantação do plano de custeio e benefício, nos termos do art. 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.


O Superior Tribunal de Justiça, no tocante à aplicabilidade do artigo 58 do ADCT, já se pronunciou sobre o tema, fixando a seguinte orientação:


"O critério de equivalência salarial preconizado no artigo 58 do ADCT, aplica-se, somente, aos benefícios em manutenção em outubro de 1988, restringindo-se ao período entre abril de 1989 (04/89 - sétimo mês a contar da promulgação) e dezembro de 1991, quando houve a regulamentação dos planos de custeio e benefícios." (EDAGA nº 517974/MG, Relator Ministro GILSON GIPP, j. 03/02/2004, DJ 01/03/2004, p. 190).

A correção monetária incide sobre as prestações em atraso, desde as respectivas competências, na forma da legislação de regência, observando-se que, a partir de 11 de agosto de 2006, o IGP-DI deixa de ser utilizado como índice de atualização dos débitos previdenciários, devendo ser adotado o INPC a partir de tal data, nos termos do artigo art. 31 da Lei nº 10.741/2003, c.c. o art. 41-A da Lei nº 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Medida Provisória nº 316, de 11 de agosto de 2006, posteriormente convertida na Lei nº 11.430, de 26 de dezembro de 2006.


Os juros de mora incidem à base de 6% (seis por cento) ao ano, a partir da citação, de forma decrescente para as parcelas posteriores a tal ato processual e de forma globalizada para as anteriores, sendo que a partir de 11/01/2003 os juros deverão ser computados à base de 1% (um por cento) ao mês, nos termos do artigo 406 do novo Código civil, c.c. o artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional.


Em virtude da sucumbência, arcará o INSS com os honorários advocatícios, ora arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do § 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil e conforme entendimento sufragado pela 10ª Turma desta Corte Regional. A base de cálculo sobre a qual incidirá mencionado percentual será composta das prestações vencidas até a data desta decisão, em consonância com a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.


Na hipótese, considera-se a data desta decisão como termo final da base de cálculo dos honorários advocatícios em virtude de somente aí, com a reforma da sentença de improcedência, haver ocorrido a condenação do INSS.


Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as despesas suportadas pelo autor, quando esta é vencedora na lide (fls. 15/16).


Diante do exposto, nos termos do artigo 557 do Código de Processo Civil, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR para, reformando a r. sentença, condenar o INSS a proceder à revisão do benefício, na forma da fundamentação.


Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se ofício ao INSS, instruído com os devidos documentos, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja o benefício revisado de imediato, bem como para que seja apresentada conta de liquidação referente às prestações vencidas, tendo em vista a nova redação dada ao "caput" do artigo 461 do Código de Processo Civil. O aludido ofício poderá ser substituído por e-mail, na forma a ser disciplinada por esta Corte.


Transitado em julgado, remetam-se os autos à Vara de origem, observadas as formalidades legais.

Publique-se e intimem-se.



São Paulo, 02 de junho de 2008.
JEDIAEL GALVÃO
Desembargador Federal Relator


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