D.E. Publicado em 14/12/2015 |
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EMENTA
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DE REFÚGIO. CONARE. INTIMAÇÃO PESSOAL COM VISTA DOS AUTOS. L.C. 80/94 E L.C. 132/2009. LEGITIMIDADE.
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ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares, negar provimento à apelação e dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de ação civil pública proposta pela DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - DPU, em face UNIÃO FEDERAL, objetivando assegurar o direito à intimação pessoal, com remessa dos autos, nos processos administrativos de pedido de refúgio em trâmite no CONARE, nos quais preste assistência jurídica ao solicitante, com extensão de efeitos a todo o território nacional.
Consta da inicial, em suma, que o CONARE vem descumprindo o disposto no artigo 44, I, da Lei n Complementar nº 80/94, ao se negar a proceder à intimação pessoal da DPU - quando esta atua na defesa dos vulneráveis, assim entendidos, os estrangeiros que buscam refúgio em território nacional - ao argumento de ser indevido o ato, diante do disposto no artigo 27 da Lei n.º 9.474/97. Sustenta o autor que o posicionamento do CONARE viola as prerrogativas funcionais previstas na mencionada lei complementar, bem como os princípios do contraditório e ampla defesa.
Regularmente citada, a União apresentou contestação à f. 57/75, arguindo, em preliminar, a ausência de interesse processual e inadequação da via eleita. No mérito, sustentou ser oferecida assistência jurídica aos estrangeiros por intermédio do CONARE, não competindo à DPU assistir aos solicitantes que postulam o reconhecimento da condição jurídica de refugiados.
O Ministério Público Federal informou a realização de Acordo de Cooperação Técnica entre a DPU, o CONARE e a Secretaria Nacional de Justiça (f. 100/107) e, instados a se manifestar, a autora reiterou seu interesse no prosseguimento do feito (f. 109/123), enquanto a União pugnou pela extinção do processo (f. 125/132).
Em seu parecer de f. 134/140, o Ministério Público Federal manifestou-se pela procedência da ação.
À f. 147/160, a DPU pleiteou a concessão de tutela antecipada.
Designada audiência de conciliação (f. 141), a ré opôs embargos declaratórios (f. 17/182), os quais rejeitados à f. 186.
Em audiência, as partes aduziram a impossibilidade de firmarem Termo de Ajustamento de Conduta, cada qual mantendo o posicionamento externado na inicial e contestação (f. 193).
Acordo de Cooperação Técnica juntado à f. 206/210.
À f. 213/214, foi indeferida a antecipação da tutela requerida pela autora.
Réplica à f. 222/226.
As partes pugnaram pelo julgamento antecipado da lide (f. 220/221 e 225v), tendo o MPF ratificado o parecer já apresentado (f. 227).
A r. sentença, rejeitou a preliminar de falta de interesse processual e julgou procedente a ação, para determinar à ré, por meio do CONARE, que proceda à intimação pessoal da autora, mediante entrega dos autos com vista, relativa às decisões proferidas nos processos administrativos de pedido de reconhecimento da condição de refugiado, cujo solicitante seja por ela assistido, sob pena de multa diária de R$500,00 (quinhentos reais) por comprovado descumprimento (f. 230/240).
Apelação da União (f. 249/283), arguindo a falta de interesse de agir, em razão da assinatura do Acordo de Cooperação Técnica, além de reiterar a preliminar de ilegitimidade ativa, bem como os argumentos deduzidos em contestação. Insurgiu-se, ainda, contra a aplicação da multa por descumprimento.
Contra a decisão que recebeu a apelação em ambos os efeitos, a DPU interpôs agravo de instrumento (f. 300/308), tendo o juízo reconsiderado a decisão, para receber o recurso apenas no efeito devolutivo, em razão da concessão da tutela antecipada (f. 391).
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo improvimento do apelo (f. 414/421).
Dispensada a revisão na forma regimental.
É o relatório.
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VOTO
Senhores Julgadores, pretende-se na presente ação civil pública assegurar o direito da Defensoria Pública da União à intimação pessoal, quando esta atua na defesa de vulneráveis, assim entendidos, os estrangeiros que buscam refúgio em território nacional, nos termos do previsto no artigo 44, I, da Lei Complementar nº 80/94, com redação dada pela Lei Complementar nº 132/2009.
Inicialmente, rejeito a preliminar ativa arguida pela União.
A legitimidade da DPU para manejar a ação civil pública decorre de expressa previsão legal, consoante artigo 5º, II, da Lei nº 7.347/85, especialmente por visar, no presente feito, a proteção de interesses individuais homogêneos, de pessoas hipossuficientes, assim considerados os estrangeiros que se encontram em situação de vulnerabilidade ao pleitear o refúgio.
Além disso, o artigo 4º da Lei Complementar nº 80/94, com redação dada pela Lei Complementar nº 132/2009, expressamente dispõe, como uma das funções institucionais da DPU, a de promover a ação civil pública visando propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos em prol dos hipossuficientes.
A questão relativa à legitimidade da DPU para a propositura de ação civil pública foi objeto de recente decisão proferida pelo C. Supremo Tribunal Federal, bem definindo os contornos de atuação da instituição, consoante se colhe do Informativo STF nº 806 (03 a 06 de novembro de 2015):
Confira-se, ainda:
Ademais, a legitimidade da DPU para atuação na defesa dos refugiados vem corroborada no teor do próprio Acordo de Cooperação Técnica firmado com a Secretaria Nacional de Justiça e CONARE, no qual foi conferida expressamente à instituição a missão de fornecer apoio jurídico nos processos administrativos de refúgio.
Não prospera a preliminar relativa à falta de interesse de agir superveniente em razão da assinatura do mencionado Acordo de Cooperação Técnica pois, apesar de prever que a DPU seria cientificada pela Secretaria Nacional de Justiça de quaisquer atos necessários ao desempenho de suas funções (Cláusula Sétima, caput), bem assim acerca dos pedidos de reconhecimento da condição de refugiado (Cláusula Sétima, §3º), a parceria firmada não se refere textualmente à prerrogativa de intimação pessoal da DPU, na forma determinada pela Lei Complementar nº 80/94, razão pela qual persiste o interesse processual no presente feito, aliás, evidenciado na negativa da União na conciliação proposta pelo juízo a quo, bem assim nas razões veiculadas em apelação.
Acresça-se, ainda, o fato noticiado nas contrarrazões da DPU, no sentido de que o CONARE tem se negado sistematicamente a enviar cópias dos procedimentos administrativos relativos aos pedidos de refúgio.
Rejeitada a matéria preliminar e presentes os pressupostos de desenvolvimento válido e regular do processo, bem assim as condições da ação, passo ao exame do mérito.
Não assiste razão à apelante.
A sentença recorrida bem analisou a questão, encontrando-se assim fundamentada:
A questão fulcral vertida nos autos reside na verificação da existência do direito à intimação da DPU, com vista dos autos, em processo administrativo de pedido de refúgio em trâmite junto ao CONARE.
Com efeito, a Constituição Federal expressamente preconiza ser a Defensoria Pública da União instituição essencial à Justiça, cabendo-lhe a orientação jurídica e defesa, em todos os graus, dos necessitados na forma do artigo 5º, LXXIV (CF, art. 134).
A Lei Complementar nº 80/94, com redação dada pela Lei Complementar nº 132/2009, ao dispor sobre a organização da DPU, estabeleceu os princípios, funções, objetivos institucionais, além de trazer as prerrogativas funcionais, nos seguintes termos:
Portanto, quando a DPU atua no cumprimento de suas funções institucionais impõe-se a observância das prerrogativas a ela conferida por lei, não sendo possível negar-lhe a intimação com recebimento dos autos com vista, sob o pretexto de que a Lei nº 9.474/97, a qual regula o mecanismo do processo de refúgio, determina apenas a notificação do solicitante e do Departamento de Polícia Federal acerca da decisão pelo reconhecimento da condição de refugiado ("Art. 26. A decisão pelo reconhecimento da condição de refugiado será considerada ato declaratório e deverá estar devidamente fundamentada. Art. 27. Proferida a decisão, o CONARE notificará o solicitante e o Departamento de Polícia Federal, para as medidas administrativas cabíveis.").
Mencionado dispositivo legal refere-se, obviamente, à hipótese em que o solicitante atua sem o patrocínio da DPU; porém, estando presente a defesa dos interesses do refugiado pela instituição, de rigor a observância do disposto nos artigos 4º, V e 44, I, da Lei Complementar nº 80/94, com redação dada pela Lei Complementar nº 132/2009.
Além disso, não se deve descurar dos princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa, os quais norteiam os processos administrativos (CF, art. 5º, LV) a ensejar a correta aplicação da legislação atinente à atuação da DPU, máxime considerando-se que o indeferimento do pedido de refúgio enseja recurso ao Ministro de Estado da Justiça, na forma do artigo 29 da Lei nº 9.474/97, de forma que a ausência de intimação da instituição decerto gerará prejuízo de monta ao solicitante.
Nesse sentido:
Ademais, despicienda qualquer discussão acerca da desnecessidade da atuação da DPU nos processos de refúgio tal como defendido na apelação, diante do já citado reconhecimento da legitimidade de atuação da instituição pela própria Secretaria Nacional de Justiça e CONARE ao firmarem o Acordo de Cooperação Técnica, bem como diante de toda fundamentação acima exposta.
Alias, não é demais ressaltar o teor da manifestação do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), acerca da indispensabilidade da atuação da DPU nos casos de refugiados:
Assim, correta a sentença de piso ao reconhecer o direito da DPU à intimação na forma do disposto nos artigos 4º, V e 44, I, da Lei Complementar nº 80/94, com redação dada pela Lei Complementar nº 132/2009 nos processos administrativos de pedido de refúgio.
De outra parte, não prospera a alegação da União, no sentido da impossibilidade de aplicação de multa contra a Fazenda Pública, por ser pacífico o entendimento quanto ao seu cabimento, consoante demonstram os precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça e desta E. Turma:
Todavia, no que tange aos honorários advocatícios, não pode prevalecer a condenação da União ao seu pagamento, pois indevidos em sede de ação civil pública, em observância ao disposto no artigo 18 da Lei nº 7.347/85, bem assim ao princípio da simetria.
Confira-se, a propósito, a orientação do E. Superior Tribunal de Justiça:
Ante o exposto, rejeito as preliminares, nego provimento à apelação e dou parcial provimento à remessa oficial, para afastar a condenação em honorários advocatícios, na forma acima exposta.
É como voto.
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