![]() DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Edição nº 107/2015 - São Paulo, segunda-feira, 15 de junho de 2015
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOPUBLICAÇÕES JUDICIAIS I – TRF
Subsecretaria da 3ª Turma
Expediente Processual 36878/2015 APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012479-48.2014.4.03.6100/SP
DECISÃO Vistos etc. Trata-se de apelação, em mandado de segurança, impetrado para afastar a exigibilidade de multa imposta pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura - CREA/SP, por ausência de registro da empresa no referido órgão de fiscalização. A r. sentença, reconhecendo a inadequação da via pela necessidade de dilação probatória, extinguiu o processo, sem exame de mérito, nos termos dos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil. Alegou-se, em suma: (1) tendo sido prestadas informações pelo Presidente do CREA/SP, não se caracteriza prejuízo ao impetrado por errônea indicação da autoridade coatora, devendo o ato ser declarado válido, consoante o art. 244 do CPC, bem como afastada a questão prejudicial de mérito arguida pelo conselho profissional em suas informações; (2) as Resoluções CONFEA 417/98 e 218/73 ao criar exigência, sem previsão legal, para que a indústria metalúrgica efetue registro perante a entidade ofende o princípio da legalidade e da liberdade do exercício profissional, previstos no art. 5º, incisos II e XIII, da CF; (3) a atividade básica da apelante, fabricação de cabos de comando para tratores, betoneiras, empilhadeiras, embarcações, ônibus e caminhões, é realizada basicamente por operadores de máquinas (tornos e prensas, previamente preparadas para trabalhos em série), com os clientes trazendo amostras ou projetos de cabos, cabendo à apelante a mera reprodução destes, de forma bastante automatizada, de modo que prescinde do serviço de engenheiro, pois a empresa não se dedica à elaboração de projetos ou presta serviços relativos à engenharia; (4) é desnecessária a produção de prova material, pois a atuação da empresa já consta do relatório de fiscalização, não havendo o que contestar quanto às atividades da empresa ali descritas, somente em relação à necessidade da atividade estar sujeita à inscrição no conselho; (5) a despeito de não ter um engenheiro sequer em seus quadros a empresa possui certificado de Sistema de Gestão de Qualidade Internacional, de acordo com a norma ABNT NBR ISSO 9001:2008, com relação à qualidade de seus recursos humanos; (6) "não é crível que se considere atividade privativa de engenheiro a simples operação de máquinas para a execução de projetos já prontos", sendo o conhecimento para a mera execução não objeto do monopólio da engenharia; e (7) a empresa não elabora projetos, limitando-se à execução de projetos já prontos ou cópia a partir de amostras, de modo que não exerce atividade que possa ser considerada "produção técnica especializada" e sim de cunho eminentemente mecânico, sem demandar grande carga de atividade intelectual, o que não possibilita a ingerência do CREA sobre as atividades da empresa. Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte, opinando o MPF pelo provimento da apelação. DECIDO. A hipótese comporta julgamento na forma do artigo 557 do Código de Processo Civil. Com efeito, é inviável a confirmação da sentença apelada, pois não se trata de situação em que necessária a dilação probatória preconizada, diante da prova pré-constituída devidamente produzida nos autos. Ao contrário do que foi assentado, não é indispensável, para a solução da causa, a perícia técnica para identificar o objeto social da empresa, na medida em que consta dos autos a prova documental suficiente. A propósito, em caso análogo, assim já decidiu a Turma: AMS 0014395-45.1999.4.03.6100, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, DJU 03/05/2006: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SENTENÇA EXTINTIVA DO MANDADO DE SEGURANÇA. ADEQUAÇÃO DA VIA. REFORMA. ARTIGO 515, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INFRAÇÃO POR FALTA DE REGISTRO NO CRQ E CONTRATAÇÃO DE QUÍMICO POR EMPRESA DE METALURGIA. COBRANÇA DE MULTA E ANUIDADES. ATIVIDADE BÁSICA INCOMPATÍVEL COM A ÁREA DE FISCALIZAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL DE QUÍMICA. 1. Estando a prova pré-constituída, com a juntada de documentação suficiente para o exame do mérito da controvérsia, afasta-se a preliminar de inadequação da via eleita e, pois, a extinção do processo, sem exame do mérito, prosseguindo-se com o julgamento, na forma do artigo 515, § 3º, do Código de Processo Civil. 2. A Lei n.º 6.839/80, em seu artigo 1º, obriga ao registro apenas as empresas e os profissionais habilitados que exerçam a atividade básica, ou prestem serviços a terceiros, na área específica de atuação, fiscalização e controle do respectivo conselho profissional. 3. A empresa dedicada à indústria na área de metalurgia não exerce atividade básica sujeita a registro no Conselho Regional de Química, ou que exija a contratação de profissional técnico em tal especialidade: ilegalidade da autuação e da cobrança de anuidades. 4. Precedentes.". Também cabe afastar a preliminar de ilegitimidade passiva, pois a multa, imposta em auto de infração lavrado por agente de fiscalização, restou confirmada pela Câmara Especializada de Engenharia Mecânica e Metalúrgica do CREA/SP e pelo próprio Plenário do CREA/SP, representado e presidido pela autoridade apontada coatora, conforme documentado nos autos (f. 23/38) Mesmo no caso de decisão apenas da Câmara Especializada de Engenharia Mecânica e Metalúrgica, a jurisprudência tem admitido seja apontada como coatora a autoridade que representa o CREA: AMS 00089893220074013800, Rel. Des. Fed. SOUZA PRUDENTE, e-DJF1 10/12/2010: "PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRELIMINAR DE NECESSIDADE DE EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA, DE AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO E DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM REJEITADAS. CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA - CREA. REGISTRO NO CONSELHO. DESNECESSIDADE. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE BÁSICA OU DA NATUREZA DOS SERVIÇOS PRESTADOS PELO PROFISSIONAL OU PELA EMPRESA. ARTS. 1º E 7º DA LEI Nº 5.194/66. ART. 1º DA LEI Nº 6.839/80. AUTO DE INFRAÇÃO. NULIDADE. I - "Por força do princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional (CF, art. 5º, XXXV), não se constitui em ausência de interesse de agir o não exaurimento das vias administrativas, não subsistindo, por conseguinte, a extinção do processo, sob esse fundamento, como no caso." (AMS 2005.34.00.034664-9, Rel. Desembargador Federal Souza prudente, TRF1, Sexta Turma, e-DJF1 Data: 04/08/2008 Página: 467). Preliminar rejeitada, na espécie. II - Rejeitada, ainda, a preliminar de ausência de prova do direito líquido e certo do impetrante, pois se confunde com o próprio mérito da impetração. III - Rejeitada, também, a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, porquanto o recurso administrativo foi julgado pela Câmara Especializada de Engenharia Mecânica e Metalúrgica, representada pelo seu Presidente, que, inclusive, defendeu-se do ato impugnado. VI - O critério legal para aferir-se a obrigatoriedade de registro e fiscalização pelos conselhos profissionais é determinado pela atividade básica ou pela natureza dos serviços prestados pela empresa recorrida. V - Tendo em vista a atividade principal desenvolvida pela impetrante, definidas pelos objetivos sociais descritos nos autos, e o disposto nos arts. 1º e 7º da Lei nº 5.194/66, verifica-se que deve ser anulado o Auto de Infração nº 2005003114, lavrado em desfavor da impetrante, e os efeitos dele decorrentes, bem como deve ser declarada a desnecessidade da contratação de engenheiro mecânico ou o registro da empresa no CREA/MG, pois se trata, na espécie, de empresa que se dedica à produção e à comercialização de pequenas peças ou modelos e ferramentas de fundição, e, de acordo com a alteração contratual constante dos autos, a atividade de usinagem não faz mais parte dos objetivos sociais da empresa. VI - Apelação e remessa oficial desprovidas. Sentença confirmada." Ademais, no caso dos autos, a autoridade impetrada não se limitou a invocar a sua ilegitimidade passiva, mas, ao contrário, defendeu a validade do ato impetrado, requerendo a denegação da ordem, demonstrando, portanto, não existir qualquer impedimento processual ao exame do respectivo mérito. No mérito, que se examina nos termos do artigo 515, § 3º, CPC, consolidada a jurisprudência no sentido de que não cabe exigência de inscrição e registro em conselho profissional, nem contratação de profissional da área como responsável técnico, se a atividade básica exercida não esteja enquadrada nas áreas profissionais específicas, objeto de fiscalização por parte da entidade paraestatal. Para enquadramento na hipótese de registro obrigatório no CREA, necessário que a autora exercesse atividade básica, ou prestasse serviços a terceiros, na área de engenharia, agronomia, ou arquitetura, ou seja, somente o profissional ou empresa que exerça, efetivamente, atividade profissional com ênfase específica em engenharia, sujeita-se à fiscalização do CREAA, daí que se preserva, na essência, o princípio da atividade básica, previsto na Lei 6.839/1980. Na espécie, a embargante atua na "Fabricação de outros produtos de metal não especificados anteriormente" (f. 18); "Indústria metalúrgica" (f. 19, 53 e 98verso); e "Metalurgia, atuando na fabricação de cabos de comando para veículos pesados e embarcações, atuando, principalmente, no mercado de reposição" (f. 24). A fabricação de produtos de metal, na área de metalurgia, não diz respeito à prestação de serviços próprios da profissão de engenheiro, para efeito de obrigatória inscrição e registro no CREA da empresa impetrante. A propósito, assim tem decidido o Superior Tribunal de Justiça: EDcl no AgRg no RESP 1.023.178, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 12/11/2008: "ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. INSCRIÇÃO DE EMPRESA INDUSTRIAL DE METALURGIA EM CONSELHO PROFISSIONAL (CREA). ART. 1º DA LEI 6.839/80. OBJETIVO SOCIAL DA EMPRESA. FATO INCONTROVERSO. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 7/STJ. DESTINAÇÃO BÁSICA. CONCEITO ATINENTE À ATIVIDADE-FIM. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS, COM EFEITOS MODIFICATIVOS. 1. Constatado, in concreto, que as atividades da empresa, explicitadas no acórdão a quo por meio de transcrição do objeto social, constituem fato incontroverso, mostra-se possível o conhecimento da questão de fundo, concernente à obrigatoriedade de inscrição de empresa em Conselho Profissional, pois tal mister prescinde de reexame de provas. Inaplicabilidade da Súmula 7/STJ. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem consolidando o entendimento de que a destinação básica de uma empresa, que a vincula a determinado Conselho profissional (art. 1º da Lei 6.839/80), está atrelada à sua finalidade, ou seja, aos objetivos sociais especificados no contrato ou estatuto social que a constituiu. Assim, as atividades internas da empresa, necessárias à elaboração e à comercialização dos seus produtos, ainda que exijam a qualificação técnica de trabalhadores sujeitos à fiscalização de determinados conselhos profissionais, não a vincula a tais órgãos, mas apenas àquele que regula, especificamente, a sua atividade-fim. 3. Na hipótese dos autos, embora necessite de engenheiros na linha de montagem, a recorrente, conforme assentado pelo Tribunal de origem, destina-se à industrialização e à comercialização de produtos relacionados à metalurgia e não à prestação de serviços próprios da profissão de engenheiro, agrônomo ou arquiteto que justifique sua sujeição ao Crea. 4. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para dar provimento ao recurso especial, a fim de afastar a obrigatoriedade de a recorrente inscrever-se perante o Crea/SP e, por conseguinte, restabelecer a sentença que julgou procedentes os embargos à execução fiscal (Processo 757/90) e condenou o Conselho ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor atualizado da execução. Dessa forma, por não exercer atividade básica relacionada à engenharia, a agravada não está obrigada ao registro junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Santa Catarina (CREA/SC)." AGRESP 1.310.052, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, e-DJE 18/03/2013: "ADMINISTRATIVO. CONSELHO PROFISSIONAL. EMPRESA DEDICADA À FABRICAÇÃO DE PEÇAS DE AÇO, FERRO, ALUMÍNIO E SOLDA. CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA - CREA. REGISTRO. DESNECESSIDADE. 1. Conforme entendimento firmado no âmbito do STJ, é a atividade preponderante desenvolvida na empresa que determina qual conselho profissional deverá submeter-se. 2. Nesse diapasão, no caso dos estabelecimentos cuja atividade preponderante seja a fabricação de peças de aço, alumínio e solda, é despiciendo o registro no CREA, em virtude da natureza dos serviços prestados. Ou seja, sua atividade-fim não está relacionada com os serviços de engenharia, arquitetura e/ou agronomia definidos na Lei n. 5.194/66. Precedentes: AgRg no Ag 1278024 / SC, Primeira Turma, rel. Ministro Teori Albino Zavascki, DJe 19/03/2012; EDcl no AgRg no REsp 1.023.178/SP, Primeira Turma, Min. Benedito Gonçalves, DJe de 12/11/2008; REsp 475.077/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/06/2004, DJ 13/12/2004, p. 284. 3. Agravo regimental não provido." Como se observa, a pretensão da impetrante tem amparo firme e consolidado na jurisprudência, não podendo, pois, subsistir o auto de infração, lavrado em razão da falta de inscrição da mesma no CREA/SP. Ante o exposto, com esteio no artigo 557 do Código de Processo Civil, dou provimento ao apelo para afastar a carência de ação por inadequação da via eleita e, prosseguindo no julgamento, ex vi do artigo 515, §§ 3º, do Código de Processo Civil, conceder o mandado de segurança, nos termos explicitados. Publique-se. Oportunamente, baixem os autos à Vara de origem.
São Paulo, 08 de junho de 2015.
CARLOS MUTA
Desembargador Federal |