D.E.

Publicado em 25/06/2021
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004902-86.2014.4.03.6110/SP
2014.61.10.004902-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : ANDERSON BRAND PIRES
ADVOGADO : RJ165249 DIEGO RABELLO NEVES e outro(a)
No. ORIG. : 00049028620144036110 2 Vr BARUERI/SP

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA DESCAMINHO. TESE AFASTADA. CONSTITUCIONALIDADE DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO TIPO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DOLO CONFIGURADO. REFORMA DA SENTENÇA. CONDENAÇÃO. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME INICIAL ABERTO. APELAÇÃO MINISTERIAL PROVIDA.
1. O réu foi absolvido da imputação do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal.
2. A quantidade e a qualidade dos medicamentos apreendidos, de origem estrangeira, sem registro na ANVISA, inviabilizam a aplicação do princípio da insignificância, na medida em que não demonstrados os vetores da mínima ofensividade da conduta e do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento dos agentes. Ademais, a quantidade e variedade de medicamentos apreendidos indicam o intuito comercial dos mesmos.
3. A conduta de importar medicamentos sem registro no órgão de vigilância sanitária competente caracteriza o delito previsto no artigo 273, §1º-B, I, do Código Penal, norma específica, que prevalece sobre o crime de contrabando, em observância ao princípio da especialidade.
4. A materialidade delitiva está devidamente comprovada nos autos.
5. A autoria restou demonstrada pelo auto de prisão em flagrante, corroborado pelas provas amealhadas em juízo.
6. O dolo, por sua vez, foi evidenciado tanto pelas circunstâncias em que os medicamentos foram apreendidos como pela prova oral produzida.
7. Reforma da sentença para condenar o réu pela prática do crime do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal. Fixada como pena aquela prevista no artigo 33 da Lei nº 11.343/2006. Entendimento da Corte Especial do STJ (HC nº 239.363-PR) em 26.02.2015, a qual acolheu a arguição de inconstitucionalidade do preceito secundário da norma do artigo 273 do Código Penal.
8. Pena-base fixada no mínimo legal, consistente em 5 (cinco) anos de reclusão, e 500 (quinhentos) dias-multa.
9. Segunda fase. Ausentes atenuantes e agravantes, mantida a pena como fixada na primeira fase.
10. Terceira fase da dosimetria. Majorada a pena em decorrência da causa de aumento prevista no artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006 (transnacionalidade do delito), na fração mínima de 1/6 (um sexto), e causa de diminuição de pena prevista no §4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 reduzida em 1/2 (metade). Pena definitiva fixada em 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão e 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa.
11. Em razão da condição econômica ostentada pelo réu, fixo o valor unitário do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.
12. Tendo em vista a pena privativa de liberdade aplicada e a redação constante do artigo 33, §2º, "c", do Código Penal, fixo o regime aberto para início de cumprimento da pena de reclusão ora imposta.
13. Presentes os requisitos do artigo 44, do Código Penal, na medida em que a pena definitivamente aplicada não é superior a 4 (quatro) anos, o réu não é reincidente e não ostenta maus antecedentes, e a análise das circunstâncias judiciais indica que a substituição atende aos fins de prevenção e retribuição pelo delito praticado. Substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em uma pena de prestação de serviços à comunidade, à razão de uma hora de serviço por dia da pena corporal substituída, ressalvado o disposto no artigo 46, §4º, do Código Penal, e uma pena de prestação pecuniária, no valor de um salário mínimo, a ser paga em favor da União.
14. Apelo do Ministério Público Federal provido.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao recurso do Ministério Público Federal para condenar o réu ANDERSON BRAND PIRES pela prática do crime do artigo 273, §§ 1º, 1º-A e 1º-B, do Código Penal, no regime inicial ABERTO, substituída a pena priva de liberdade por duas penas restritivas de direito, nos termos do voto do Relator. Prosseguindo, a Turma, por maioria, decidiu fixar a fração de redução referente à causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas, no patamar de ½ (metade), tendo em vista a enorme quantidade de medicamentos apreendidos, e fixar a definitivamente a pena em 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão e pagamento de 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa, nos termos do voto divergente do Desembargador Federal Fausto De Sanctis, com quem voto o Desembargador Federal Nino Toldo, vencido o Desembargador Federal Relator que aplicava a minorante prevista no § 4º do artigo 33 da Lei n.º 11.343/2006, na sua fração máxima de 2/3 (dois terços) e fixava a pena definitiva em 01 ano, 11 meses e 10 dias de reclusão e ao pagamento de 193 dias-multa.



São Paulo, 14 de maio de 2020.
FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004902-86.2014.4.03.6110/SP
2014.61.10.004902-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
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APELADO(A) : ANDERSON BRAND PIRES
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VOTO CONDUTOR

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS: Trata-se de recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público Federal em face de sentença proferida pelo Juízo Federal da 2ª Vara de Barueri/SP, que absolveu o réu ANDERSON BRAND PIRES quanto à imputação do delito tipificado no artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.


Na sessão realizada em 14.05.2020, acompanhei o e. Relator quanto ao provimento do recurso do Ministério Público Federal, a fim de condenar o réu ANDERSON BRAND PIRES pela prática do crime do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal.


Na oportunidade, também acompanhei o e. Relator quanto aos critérios da primeira e segunda fases do cálculo da dosimetria da pena, quanto à fração referente à causa de aumento do artigo 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/2006, bem como em relação à substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito.


Todavia, divergi de Sua Excelência acerca do patamar de redução da causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/2006.


Passo ao voto.


O apelado ANDERSON BRAND PIRES restou condenado nesta Instância pela prática do crime do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal, pois promoveu a importação de produtos sem registro perante o órgão de vigilância sanitária competente, consistentes em 1.000 comprimidos Pramil 50 mg; 50 ampolas com a inscrição "Ampolla 1 ml"; 20 comprimidos de Oxitoland - Oximetolona 50mg, e 1 vidro de medicamento Stanozoland Depot - Stanozolol 50mg.


Ao final da segunda fase da dosimetria, a pena estabelecida pelo e. Relator restou determinada em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.


Na terceira etapa da dosimetria, a pena do apelado foi acrescida de 1/6 (um sexto), em razão da causa de aumento prevista no artigo 40, inciso I, da Lei de Drogas, patamar de incremento que também acompanho.


Todavia, ao reconhecer a incidência da causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/2006, o e. Relator diminuiu a pena em 2/3 (dois terços), de modo a estabelecê-la definitivamente em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa.


Nesse ponto, divirjo do e. Relator, a fim de fixar o patamar de redução referente à causa de diminuição acima estampada em ½ (metade), tendo em vista a enorme quantidade de medicamentos apreendidos (1.000 comprimidos Pramil 50 mg; - 50 ampolas com a inscrição "Ampolla 1 ml"; - 20 comprimidos de Oxitoland - Oximetolona 50mg; - 1 vidro de medicamento Stanozoland Depot - Stanozolol 50mg), o que denota envolvimento, ainda que ocasional, com organização criminosa.


Desse modo, mantidos os demais critérios adotados pelo e. Relator em seu voto, fixo definitivamente a pena em 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, no regime inicial ABERTO, e pagamento de 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.


Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas, nos termos do voto do Relator, ou seja, uma pena de prestação de serviços à comunidade, à razão de uma hora de serviço por dia da pena corporal substituída, ressalvado o disposto no artigo 46, §4º, do Código Penal, e uma pena de prestação pecuniária, no valor de um salário mínimo, a ser paga em favor da União.



Dispositivo


Ante o exposto, divirjo parcialmente do e. Relator, para fixar a causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas, no patamar de ½ (metade), tendo em vista a enorme quantidade de medicamentos apreendidos, e, mantidos os demais critérios adotados pelo e. Relator em seu voto, fixar definitivamente a pena em 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, no regime inicial ABERTO, e pagamento de 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa. Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito.


É o voto.


FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004902-86.2014.4.03.6110/SP
2014.61.10.004902-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
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No. ORIG. : 00049028620144036110 2 Vr BARUERI/SP

RELATÓRIO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Barueri/SP, que absolveu o réu ANDERSON BRAND PIRES da imputação do crime previsto no artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.


Narra a denúncia à fl. 143:

"Em fins de agosto de 2014, possivelmente na cidade de Foz do Iguaçu/PR, o denunciado, com cognição e liberdade volitiva, importou medicamentos sem registro no órgão de vigilância sanitária e sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização.
De acordo com o apurado, Policiais Militares, ao realizarem fiscalização de rotina na Rodovia Castelo Branco, abordaram o ônibus da Viação Pluma proveniente de Foz do Iguaçu com destino a São Paulo, na altura do Km 46, município de Araçariguama.
Ao realizarem revista no ora denunciado ANDERSON BRAND PIRES, portador de necessidades especiais que não possui a perna esquerda, localizaram dentro da barra da calça referente a mencionada perna 1.000 comprimidos de Pramil 50mg, 20 comprimidos de 'oxitoland', 1 ampola de 'stanozoland depot', 1 ampola de sais de testosterona 'duratestoland', todos de origem e procedência paraguaia, sem registro no órgão da vigilância sanitária brasileira e sem características de identidade e qualidade admitidas para sua comercialização no território pátrio, tais como dizeres esclarecedores no idioma português, sobre sua composição, suas indicações e seu modo de usar (§2º do art. 11 da Lei 6.360/76 - implícito no laudo de fls. 107/114).
Vale mencionar que os fármacos Oxiland, Estanozolol e Testosterona, constituintes ativos dos produtos Oxiland, Stanozoland Depot e Durastestoland, encontram-se relacionados pela lista C5 - substâncias anabolizantes, sujeitas a controle especial em duas vias. Da Resolução-RDC nº 13/2015.
Ao ser interrogado em sede policial a fl. 04, ANDERSON BRAND PIRES informou, em síntese, que os medicamentos encontrados em seu poder e que estavam sendo transportados na barra da calça da perna esquerda, foram comprados em território paraguaio e destinavam-se ao uso pessoal, o que não é crível, dado a grande quantidade de medicamentos.(...)"

Segundo a acusatória, estariam presentes indícios suficientes de materialidade e autoria para o réu ANDERSON BRAND PIRES do delito de importação irregular de produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais sem o registro de vigilância sanitária (ANVISA), nos termos do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal.


A denúncia foi recebida em 01/12/2015 à fl. 147.


Defesa prévia do réu às fls. 191/241.


O Ministério Público Federal em alegações finais às fls. 378/381, requereu a condenação do réu pelos fatos descritos na denúncia.


A defesa apresentou alegações finais às fls. 388/410, postulando a absolvição do réu ANDERSON BRAND PIRES. Afirmou que a quantidade de medicamentos apreendidos duraria 6 meses para uso do réu, que é deficiente físico e possui dificuldades em viajar ao Paraguai. Aduziu que o réu é primário, possui bons antecedentes, profissão definida e residência fixa. Requereu o reconhecimento do princípio da insignificância. Pleiteou, subsidiariamente, a desclassificação do crime do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal para os delitos de contrabando (artigo 334-A, do Código Penal). Solicitou a aplicação do preceito secundário do artigo 33, da Lei nº 11.343/06 ao delito, bem como as benesses do artigo 33, §4º, da Lei 11.343/2006.


Regularmente processado o feito, sobreveio sentença de fls. 417/430, que julgou improcedente o pedido formulado na denúncia e absolveu o réu ANDERSON BRAND PIRES com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.


A sentença foi publicada em 31/05/2019 à fl. 434.


O Ministério Público Federal interpôs apelação à fl. 436. Em suas razões de recurso às fls. 437/443 requer a reforma da sentença, com a condenação do réu como incurso nas penas do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal.


Em contrarrazões, a defesa do réu ANDERSON BRAND PIRES às fls. 449/456 requer o desprovimento da apelação ministerial. Alega que o réu é deficiente físico (perna esquerda amputada) e que os medicamentos apreendidos seriam para uso próprio, não sendo destinados a mercancia. Sustenta que os medicamentos apreendidos não eram adulterados ou falsificados não havendo que se falar em falsificação, corrompimento, adulteração ou alteração.


Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República opinou às fls. 461/466 pelo provimento do recurso ministerial com a condenação do réu pela pratica do crime do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal e com aplicação analógica das penas previstas para o crime do artigo 33, caput da Lei 11.343/2006.


É o relatório.


À revisão.



JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004902-86.2014.4.03.6110/SP
2014.61.10.004902-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : ANDERSON BRAND PIRES
ADVOGADO : RJ165249 DIEGO RABELLO NEVES e outro(a)
No. ORIG. : 00049028620144036110 2 Vr BARUERI/SP

VOTO


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto pelo Ministério Público Federal e passo ao exame de mérito.


Consoante já relatado, o Ministério Público Federal denunciou réu ANDERSON BRAND PIRES pela suposta prática do crime previsto no artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal, in verbis:


"Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa.
§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.
§ 1º-A - Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico.
§ 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições:
I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente;
II - em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior;
III - sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização;
IV - com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade;
V - de procedência ignorada;
VI - adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente."

Por sua vez, o MM. Juízo da 1ª Vara Federal de Barueri/SP proferiu a sentença de fls. 417/430, publicada em 31/05/2019 (fl. 434), absolvendo o réu ANDERSON BRAND PIRES com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.


Em suas razões recursais às fls. 437/443, o Ministério Público Federal requer a reforma da sentença, com a condenação do réu ANDERSON BRAND PIRES como incurso nas penas do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal.


Princípio da insignificância:


O MM. Juízo da 2ª Vara Federal de Barueri/SP absolveu o réu ANDERSON BRAND PIRES, pelos seguintes fundamentos às fls. 429/430. A saber:


"O acusado é primário e não ostenta maus antecedentes, ou seja, não há nenhum dado de que tenha perpetrado ações semelhantes.
Os elementos probatórios colhidos no curso desta ação penal levam a conclusão de que a quantidade de medicamentos internalizados pelo denunciado não é hábil a impactar a saúde pública.
À vista disso, em juízo de periculosidade da ação do denunciado, entendo, que não há falar sequer em potencial lesa à incolumidade pública/saúde pública, inexistindo tipicidade material da conduta, o que impõe a sua absolvição."

Em seu apelo, o Ministério Público Federal afirma que a absolvição do réu ANDERSON BRAND PIRES com fundamento na atipicidade material da conduta, por aplicação do princípio da insignificância não se sustenta.


O recurso ministerial comporta provimento.


Com efeito, o princípio da insignificância, como corolário do princípio da pequenez ofensiva inserto no artigo 98, inciso I, da Constituição Federal, estabelece que o Direito Penal, pela adequação típica do fato à norma incriminadora, somente intervenha nos casos de lesão de certa gravidade, atestando a atipicidade penal nas hipóteses de delitos de lesão mínima, que ensejam resultado diminuto.


No entanto, a quantidade e a qualidade dos medicamentos apreendidos, de origem estrangeira, sem registro na ANVISA, inviabilizam a aplicação do princípio da insignificância, na medida em que não demonstrados os vetores da mínima ofensividade da conduta e do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento dos agentes. Ademais, a quantidade e variedade de medicamentos apreendidos indicam o intuito comercial dos mesmos.


Desclassificação do delito de importação irregular de produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais sem o registro de vigilância sanitária para o delito de contrabando:


A defesa de ANDERSON BRAND PIRES pretende a desclassificação da conduta imputada do delito do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal para o delito de contrabando.


A conduta de importar medicamentos sem registro no órgão de vigilância sanitária competente caracteriza o delito previsto no artigo 273, §1º-B, I, do Código Penal, norma específica, que prevalece sobre o crime de contrabando, em observância ao princípio da especialidade.


Malgrado os medicamentos possam ser considerados "mercadoria proibida", não se trata de contrabando já que existe norma específica neste aspecto.


Ademais, o tipo penal do artigo 334 do Código Penal visa tutelar a política estatal de comércio exterior, pois através da proibição de importação de determinada mercadoria, ou da tributação sobre a sua importação, o Estado pode estimular ou proteger determinado setor da indústria nacional. De outro lado, não há interesse do Estado na proteção da regularidade do comércio exterior no caso de medicamentos proibidos. Estes têm sua importação proibida, não em razão da política estatal de comércio exterior, mas pelo fato de não estarem em regularidade com as normas de vigilância sanitária, podendo colocar em risco a saúde pública.


Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. IMPORTAÇÃO DE PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS SEM REGISTRO. ARTIGO 273, § 1º E § 1º-B, DO CÓDIGO PENAL. CAPITULAÇÃO LEGAL. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA CONTRABANDO. ANÁLISE FÁTICO-PROBATÓRIA.INVIABILIDADE.
1. A conduta de introduzir no país produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais sem registro no órgão de vigilância sanitária competente ou de procedência ignorada, se subsume ao delito do artigo 273, §§ 1º, 1º-B, I e V, do Código Penal, não cabendo desclassificação para o delito de contrabando, em obediência ao Princípio da Especialidade.
2. O tipo que prevê a figura do contrabando ("Importar ou exportar mercadoria proibida", hoje tipificado no artigo 334-A do Código Penal) traz previsão genérica, em detrimento da caracterização do tipo penal especifico do art. 273 , §§ 1° e 1°-B, I, do Código Penal que, na modalidade "importar", assemelha-se à trazida pelo crime de contrabando .
Todavia, o tipo penal inscrito naqueles primeiros dispositivos refere-se a uma mercadoria específica: o produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais proibido em território nacional, tratando-se, portanto, da proteção de um bem jurídico distinto.
3.Caso em que foram apreendidos medicamentos de uso proibido no Brasil: 6 cartelas de comprimidos RHEUMAZIN FORTE, com 10 unidades cada e 5 cartelas de comprimido PRAMIL, com 20 unidades cada cartela.
4. Considerando se tratar de importação de medicamentos proibidos no Brasil, a conduta descrita na exordial acusatória, de fato, se subsume ao tipo previsto no artigo 273 , §§ 1º, 1º-B, I e V, do CP.
(...)
(REsp 1728166/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 19/09/2018).(grifo nosso).
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. POMADA CHINESA "DRAGON & TIGER". AUSÊNCIA DE REGISTRO NA ANVISA. ART. 273, § 1º-B, INCISOS I E V, DO CÓDIGO PENAL. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA. DESCAMINHO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE.
1. A conduta de introduzir no país produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais sem registro no órgão de vigilância sanitária competente ou de procedência ignorada se subsume ao delito do artigo 273, §§ 1º, 1º-B, I e V, do CP, sendo equivocada a desclassificação da conduta para o crime do art. 334 do Código Penal (descaminho), por afronta ao princípio da especialidade da norma penal imputada ao réu.
2. A jurisprudência deste Sodalício orienta-se no sentido de ser descabida a incidência do princípio da insignificância na hipótese em que o agente introduz no território nacional medicamentos não autorizados pelas autoridades competentes, in casu a importação de oitocentas unidades da pomada Dragon and Tiger, produto não registrado na ANVISA, diante da potencial lesividade à saúde pública.
3. Embora haja relevância jurídica em se punir tais condutas, verifica-se a necessidade de atuação do Judiciário para corrigir o exagero e ajustar a pena cominada à conduta inscrita no art. 273 , § 1º-B, do Código Penal.
4. Determinação de prosseguimento da ação penal, com a adoção, se for o caso, de alternativas para o fim de evitar a imposição de penas desproporcionais às condutas praticadas.
5. Agravo Regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1618458/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 24/04/2018, DJe 04/05/2018).

Desta forma, diante do princípio da especialidade afasto a tese da defesa.


A conduta imputada a ANDERSON BRAND PIRES é a de importar produto sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente. A materialidade do crime descrito no artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal foi devidamente comprovada nos autos, restando incontroversa.


Cuida-se de crime formal, já que prescinde da efetiva ocorrência do dano a alguém. O objeto material do crime é o produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Por sua vez, o objeto jurídico é a saúde pública.


O Auto de Apresentação e Apreensão às fls. 06/07 demonstra que foram apreendidos diversos itens descritos como medicamentos no documento, distribuídos nas seguintes quantidades:


- 1.000 comprimidos Pramil 50 mg;

- 50 ampolas com a inscrição "Ampolla 1 ml";

- 20 comprimidos de Oxitoland - Oximetolona 50mg;

- 1 vidro de medicamento Stanozoland Depot - Stanozolol 50mg;

- 1 bilhete de passagem da Viação Pluma - poltrona 35.


Os laudos periciais às fls. 62/64, 107/114 e 370/374 esclareceram que os produtos apreendidos eram de importação e distribuição proibidas em território nacional (fl. 112), em razão da ausência de registro na ANVISA, bem como enfatizaram a origem estrangeira dos produtos apreendidos.


Os bens apreendidos apresentam potencial lesivo à saúde pública e a conduta imputada ao réu subsome-se, com exatidão, ao artigo 273, §1º-B, inciso I, do Código Penal.


Comprovada, portanto, a materialidade do delito.


Autoria e dolo:


A autoria restou demonstrada pelo auto de prisão em flagrante, corroborado pelas demais provas amealhadas em juízo.


O dolo, por sua vez, foi evidenciado tanto pelas circunstâncias em que os medicamentos foram apreendidos como pela prova oral produzida.


Os depoimentos em juízo dos policiais militares Fernando Dalmeida Fonseca e Jeferson Pereira Murat (mídia - fls. 260) ratificaram as declarações prestadas na fase inquisitiva às fls.02/03, afirmando que efetuaram vistoria no interior do ônibus da Viação Pluma oriundo de Foz de Iguaçu junto aos passageiros e seus pertences e que ao revistarem o réu ANDERSON BRAND PIRES, portador de necessidades especiais que não possui a perna esquerda, encontraram dentro da perna da calça diversos medicamentos de origem paraguaia sem registro no órgão de vigilância sanitária brasileira.


O policial militar Jeferson Pereira Murat (mídia - fls. 260) ao ser indagado pelo advogado de defesa, sobre a cooperação do réu ao ser abordado pela polícia, afirmou que ANDERSON BRAND PIRES "ficou tranquilo e em momento algum se exaltou, ele assumiu a propriedade dos medicamentos e cooperou com o trabalho policial".


Ressalte-se que os depoimentos dos policiais, sobretudo produzidos em juízo, sob o crivo do contraditório, são idôneos para ensejar um provimento condenatório, inclusive porque corroboram as provas documentais já produzidas, e gozam de fé pública e presunção "juris tantum", não afastada pela defesa.


Nesse tocante, já decidiu esta E. Décima Primeira Turma:


PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. VALIDADE. PENA MANTIDA.
1. Materialidade comprovada. Autoria demonstrada pela prova testemunhal produzida durante as investigações e em juízo.
2. Diante do conjunto probatório, não se sustenta o argumento ventilado pela defesa de que o réu estava na companhia dos demais acusados, mas desistiu de praticar o delito.
3. O fato de a testemunha afirmar que não se recorda de determinada passagem, não retira credibilidade daquilo que afirma saber sobre os fatos.
4. A sistemática processual penal vigente não impõe qualquer restrição na eficácia probatória decorrente de depoimentos feitos por agentes policiais, até porque, ordinariamente, suas declarações têm expressiva relevância na elucidação do delito e de sua autoria.
5. Transnacionalidade do crime evidenciada pelos depoimentos das testemunhas.
6. Dosimetria da pena inalterada. Diante da ausência de recurso ministerial e do princípio da non reformatio in pejus, mantida a pena-base e a redução decorrente do art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/2006.
7. Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em razão do quantum da pena aplicada (CP, art. 44, I).
8. Apelação improvida.
(TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 40252 - 0000197-79.2008.4.03.6005, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO, julgado em 28/10/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2014).

Em seu interrogatório na fase policial à fl. 4, o réu ANDERSON BRAND PIRES confessou a prática dos fatos em comento, asseverando que os medicamentos eram para uso pessoal. A saber:


"QUE, o interrogando declara que os medicamentos encontrados em seu poder foram adquiridos em território paraguaio que seriam para uso pessoal; QUE afirma que os custos dos medicamentos foi em torno de R$ 1.200,00; QUE os medicamentos estavam sendo transportados na barra da calça da perna esquerda; QUE o interrogando estava se deslocando até o Terminal Tietê, aonde pegaria outro ônibus para o Rio de Janeiro; QUE na data de hoje, quando se encontrava no interior do ônibus Pluma procedente de Foz do Iguaçu, foi surpreendido pela fiscalização da polícia militar rodoviária na posse dos medicamentos relacionados sem auto próprio, os quais lhe deram voz de prisão, sendo ratificado nesta delegacia (...)."

A autoria delitiva do réu ANDERSON BRAND PIRES é inconteste, uma vez que confessou o delito no interrogatório judicial (mídia - fl. 314). Afirmou que viajou até o Paraguai e lá adquiriu os anabolizantes, que algumas pessoas disseram que não tinha perigo, que eram legalizados no Brasil, mas que aqui só eram vendidos mediante receita médica além de serem caros, desconhecia que era crime a importação desses medicamentos, que queria fazer academia e ganhar corpo, que não tinha interesse em vender os medicamentos.


A versão declinada pelo réu ANDERSON BRAND PIRES de que os medicamentos seriam para consumo pessoal e que desconhecia a ilicitude de sua conduta destoa do conjunto probatório amealhado, restando isolada nos autos.


Os medicamentos, como já salientado, estavam escondidos na perna da calça esquerda, que é a perna amputada do réu, consoante depoimento dos policiais que participaram do flagrante e confirmado pelo réu em depoimento judicial, o que corrobora o conhecimento sobre a proibição de introdução da referida mercadoria de origem estrangeira em território brasileiro.


Inadmissível, assim, especialmente pelas próprias palavras do réu, constatar que incidiu em erro.


Logo, não há se falar em erro de tipo, preceituado pelo Código Penal como:


"Art. 20. O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei."

O doutrinador Guilherme de Souza Nucci conceitua o erro de tipo como: "o erro que incide sobre elementos objetivos do tipo penal, abrangendo qualificadoras, causas de aumento e agravantes. O engano a respeito de um dos elementos que compõem o modelo legal de conduta proibida sempre exclui o dolo, podendo levar à punição por crime culposo" (Código Penal Comentado, 13. ed., 2013, São Paulo, Ed. RT, p. 232).


Inconteste, portanto, pelas assertivas do réu, que adquiriu os medicamentos no Paraguai, ciente de que praticava conduta criminosa, à qual aderiu de forma livre e consciente, não incidindo em qualquer erro.


Assim, resta irrefutável a presença do dolo no comportamento engendrado pelo réu.


Pelos motivos ora expostos, a r. sentença deve ser reformada.


Aplicação do preceito secundário do artigo 273 do Código Penal:


O parecer da Procuradoria Regional da República suscitou que o preceito secundário do artigo 273 do Código Penal é inconstitucional, devendo ser aplicada a dosimetria do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 para o referido delito.


O artigo 273 do Código Penal foi substancialmente modificado pela Lei nº 9.677/1998. Motivado pela descoberta maciça de medicamentos falsificados comercializados no País, o legislador alterou a redação do caput do artigo e seu §1º, acrescentou os §§1º-A e 1º-B, incluiu os delitos enumerados no artigo no rol de crimes hediondos e recrudesceu sobremaneira a pena (antes de um a três anos) para dez a quinze anos.


A constitucionalidade do preceito secundário do artigo 273 do Código Penal passou a ser alvo de impugnação e, nesse contexto, foi objeto de decisão do Órgão Especial desta E. Corte que, na Arguição de Inconstitucionalidade nº 0000793-60.2009.4.03.6124, decidiu pela constitucionalidade da pena prevista para o delito, nos seguintes termos:

"DIREITO PENAL. ARTIGO 273, § 1º-B, DO CÓDIGO PENAL. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE COMINADA EM ABSTRATO (PRECEITO SECUNDÁRIO DA NORMA). INCIDENTE DE ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. OFENSA À PROPORCIONALIDADE E À RAZOABILIDADE. INEXISTÊNCIA. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE REJEITADA.
- Incidente de Argüição de Inconstitucionalidade criminal suscitado pela Quinta Turma deste Tribunal em sede de apelação criminal (proc. nº 0000793-60.2009.4.03.6124/SP), versando sobre a desarmonia do preceito secundário do art. 273 , § 1º-B, do Código Penal com a Constituição Federal, por ausência de proporcionalidade e razoabilidade.
- Inexistente o aventado vício de inconstitucionalidade da pena fixada em abstrato pela norma secundária do art. 273 , § 1º-B, do Estatuto Repressivo, pois o seu rigor decorre da própria natureza do bem jurídico tutelado, qual seja, a saúde pública, e da elevada potencialidade lesiva da conduta tipificada, devidamente sopesadas pelo legislador.
- Inadmissível a aplicação analógica de penas previstas para outros delitos, preconizada em razão das pretensas desproporcionalidade e ausência de razoabilidade, eis que atentatória aos princípios da separação dos poderes e da reserva legal, não cabendo ao julgador, no exercício da sua função jurisdicional, realizar o prévio juízo de proporcionalidade entre a pena abstratamente imposta no preceito secundário da norma com o bem jurídico valorado pelo legislador e alçado à condição de elemento do tipo penal, por se tratar de função típica do Poder Legislativo e opção política, não sujeita, portanto, ao controle judicial. Precedente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região sobre a mesma questão (ARGINC nº 47 - processo 201051014901540 -, Rel. Des. Federal Guilherme Couto de Castro, Plenário, j. 22.08.2011, E-DJF2R 08.09.2011.)
- O próprio Supremo Tribunal Federal, em mais de uma oportunidade, já reconheceu a impossibilidade de o Poder Judiciário, na ausência de lacuna da lei, se arrogar função legiferante e criar por via oblíqua, ao argumento da inadequação da sanção penal estabelecida pelo Legislativo, uma terceira norma, invadindo a esfera de atribuições do Poder competente (v.g., HC nº 109676/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 14.08.2013; RE nº 443388/SP, Relª. Minª. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 11.09.2009). Precedentes, na mesma linha, do E. STJ.
- Habeas corpus a ser concedido de ofício que não se conhece, por se tratar de medida de competência da Turma julgadora da apelação criminal que deu origem ao incidente, eis que cabe àquele Órgão fracionário conhecer das questões de fato relativas ao caso concreto.
- Argüição de Inconstitucionalidade rejeitada. Habeas Corpus ex officio não conhecido.
(TRF 3ª Região, ÓRGÃO ESPECIAL, ARGINC 0000793-60.2009.4.03.6124, Rel. Des. Fed. Márcio Moraes, e-DJF3 CJ 1: 23/08/2013)."

Dessa forma, como integrante da Décima Primeira Turma, órgão fracionário deste Tribunal, vinha adotando a referida orientação e aplicando, aos condenados pelos crimes do artigo 273 do Código Penal, seu respectivo preceito secundário. Paralelamente, afastava a tese das defesas dos réus, muitas vezes endossadas pela acusação, que pleiteavam, por analogia, a aplicação da pena do tráfico de entorpecentes nas condenações pelo crime em espeque.


Consoante meu entendimento, tal analogia, combinando diferentes dispositivos da legislação penal, afronta a lei. Uma vez reconhecida a constitucionalidade do preceito secundário do artigo 273 do Código Penal, tal prática fere o princípio da estrita legalidade previsto no artigo 5º, inciso XXXIX, da Carta Magna e no artigo 2º do Código Penal, já que se utiliza pena diversa da prescrita em lei.


No entanto, recentemente, a Corte Especial do C. Superior Tribunal de Justiça, em arguição de incidente de inconstitucionalidade, declarou inconstitucional o preceito secundário da norma penal em testilha, por ofensa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Por oportuno, transcrevo a ementa do referido julgado:

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEITO SECUNDÁRIO DO ART. 273, § 1º-B, V, DO CP. CRIME DE TER EM DEPÓSITO, PARA VENDA, PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS DE PROCEDÊNCIA IGNORADA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. 1. A intervenção estatal por meio do Direito Penal deve ser sempre guiada pelo princípio da proporcionalidade, incumbindo também ao legislador o dever de observar esse princípio como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente. 2. É viável a fiscalização judicial da constitucionalidade dessa atividade legislativa, examinando, como diz o Ministro Gilmar Mendes, se o legislador considerou suficientemente os fatos e prognoses e se utilizou de sua margem de ação de forma adequada para a proteção suficiente dos bens jurídicos fundamentais. 3. Em atenção ao princípio constitucional da proporcionalidade e razoabilidade das leis restritivas de direitos (CF, art. 5º, LIV), é imprescindível a atuação do Judiciário para corrigir o exagero e ajustar a pena cominada à conduta inscrita no art. 273 , § 1º-B, do Código Penal. 4. O crime de ter em depósito, para venda, produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais de procedência ignorada é de perigo abstrato e independe da prova da ocorrência de efetivo risco para quem quer que seja. E a indispensabilidade do dano concreto à saúde do pretenso usuário do produto evidencia ainda mais a falta de harmonia entre o delito e a pena abstratamente cominada (de 10 a 15 anos de reclusão) se comparado, por exemplo, com o crime de tráfico ilícito de drogas - notoriamente mais grave e cujo bem jurídico também é a saúde pública. 5. A ausência de relevância penal da conduta, a desproporção da pena em ponderação com o dano ou perigo de dano à saúde pública decorrente da ação e a inexistência de consequência calamitosa do agir convergem para que se conclua pela falta de razoabilidade da pena prevista na lei. A restrição da liberdade individual não pode ser excessiva, mas compatível e proporcional à ofensa causada pelo comportamento humano criminoso. 6. Arguição acolhida para declarar inconstitucional o preceito secundário da norma. ..EMEN:
(AINHC 201200764901, SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, STJ - CORTE ESPECIAL, DJE DATA:10/04/2015 ..DTPB:.)

Com a declaração de inconstitucionalidade do preceito secundário da norma penal em tela, a Corte Superior passou a entender pela possibilidade de aplicação das penas previstas para o crime de tráfico de drogas aos crimes tipificados no artigo 273 do Código Penal, em razão da semelhança entre as condutas, inclusive com a possibilidade de aplicação da minorante prevista no §4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006. A propósito, confira-se:

"RECURSO ESPECIAL. PENAL. ART. 273, § 1-B, DO CP. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. PENA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Com a declaração de inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273 , § 1º-B, do Código Penal, segundo o entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, tornou-se possível aplicar aos crimes tipificados nesse artigo as penas previstas para o delito de tráfico de drogas, devido a semelhança entre as condutas, sendo, inclusive, cabível a concessão da minorante do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 nas hipótese em que o apenado preencha todos os requisitos legais. 2. Agravo regimental improvido. ..EMEN:
(AGRESP 201600780338, SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:01/07/2016 ..DTPB:.)
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO LIMINAR DO WRIT. ART. 210 DO RISTJ. AUSÊNCIA MANIFESTA DE QUALQUER CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ART. 273 , §§ 1º E 1º-B, I E V, DO CÓDIGO PENAL. IMPORTAR E TER EM DEPÓSITO, PARA VENDA, PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS SEM REGISTRO NO ÓRGÃO DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, FALSIFICADO E DE PROCEDÊNCIA IGNORADA. PRECEITO SECUNDÁRIO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. MINORANTE PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006. APLICABILIDADE. ENTENDIMENTO DA CORTE ESPECIAL. PROGRESSÃO DE REGIME. CONFORMIDADE COM A LEI N. 8.072/1990. CRIME DE NATUREZA HEDIONDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Nos termos do que é permitido pelo art. 210 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça ao relator de habeas corpus impetrado nesta Corte Superior, indefere-se liminarmente o writ quando não há flagrante constrangimento ilegal ou qualquer mácula nas decisões das instâncias ordinárias que justifiquem a intervenção deste Tribunal. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a partir do julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade no HC n. 239.363/PR por sua Corte Especial, reconheceu não apenas a desproporcionalidade do preceito secundário do delito previsto no art. 273 , § 1º e § 1º-B, I e V, do Código Penal - imputado ao paciente -, a fim de admitir a aplicação da reprimenda prevista no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 para o crime em comento, como também a possibilidade de incidência do respectivo § 4º, quando for o caso. 3. Não há, porém, nenhuma ilegalidade manifesta no indeferimento da referida benesse quando, apesar de o paciente não registrar outros antecedentes criminais e ser pequena a quantidade de cada produto importado e mantido em depósito, para venda, sem autorização do órgão de vigilância sanitária competente (Anvisa), falsificado ou de origem desconhecida, a sua variedade e as próprias circunstâncias em que foram encontrados denotam a não eventualidade da prática criminosa. 4. A Lei dos Crimes Hediondos não apenas manteve em seu art. 1º,VII-B o mesmo nomem iuris utilizado no art. 273 do Código Penal, como também indicou expressamente que as condutas descritas no Diploma Repressivo geral apresentavam caráter hediondo, a receber o tratamento mais severo imposto pela lei especial, inclusive para a progressão de regime. 5. Agravo regimental não provido. ..EMEN:
(AIHC 201601147370, ROGERIO SCHIETTI CRUZ, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:06/06/2016 ..DTPB:.).

Os reflexos do entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça passaram a serem sentidos também nos julgados deste Tribunal. Em muitos casos, o Superior Tribunal de Justiça vem determinando o retorno dos autos a esta Corte, para que uma nova dosimetria da pena imposta ao crime do artigo 273 do Código Penal seja realizada, tomando-se por base o preceito secundário do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006. A título de exemplo, confiram-se julgados de minha relatoria:

DIREITO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. PENA. ALTERAÇÃO. DECISÃO EM RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 273 DO CÓDIGO PENAL. PRECEITO SECUNDÁRIO AFASTADO. APLICADO PRECEITO SECUNDÁRIO DO CRIME DE TRÁFICO. CONDENAÇÃO ALTERADA. 1. Reexame da dosimetria em virtude de decisão do C. STJ, por meio da qual se interpretou que, ante a declaração (pela Corte Especial daquele Tribunal Superior) de inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273 do Código Penal, seria aplicável ao presente caso (quanto à conduta que se amoldaria, inicialmente, àquela figura típica) o preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/2006. Conduta reexaminada a partir dessa premissa. 2. Autoria, materialidade e dolo. Comprovação. 3. Dosimetria da pena. Condenação pelo crime do art. 273 do Código Penal. Preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/06. 4. Pena definitivamente fixada em 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 194 (cento e noventa e quatro) dias-multa tendo estes o valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. 5. Embargos Infringentes opostos pelo réu parcialmente providos para condená-lo pela prática do delito do art. 273 do Código Penal. Reexaminada a dosimetria da pena, em obediência à decisão do STJ contida nos autos, afastada a incidência do preceito secundário do dispositivo, utilizando, para fins de dosimetria, o preceito secundário contido no art. 33 da Lei 11.343/06.
(EIFNU 00020373220104036110, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - QUARTA SEÇÃO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/11/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PENA. ALTERAÇÃO. DECISÃO EM RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 273 DO CÓDIGO PENAL. PRECEITO SECUNDÁRIO AFASTADO. APLICADO PRECEITO SECUNDÁRIO DO CRIME DE TRÁFICO. CONDENAÇÃO ALTERADA. 1. Reexame da dosimetria em virtude de decisão do C. STJ, por meio da qual se interpretou que, ante a declaração (pela Corte Especial daquele Tribunal Superior) de inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273 do Código Penal, seria aplicável ao presente caso (quanto à conduta que se amoldaria, inicialmente, àquela figura típica) o preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/2006. Conduta reexaminada a partir dessa premissa. 2. Autoria, materialidade e dolo. Comprovação. 3. Dosimetria da pena. Condenação pelo crime do art. 273 do Código Penal. Preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/06. 4. Pena definitivamente fixada em 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 194 (cento e noventa e quatro) dias-multa tendo estes o valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. 5. Apelação do Ministério Público Federal e do réu parcialmente providas para condenar o réu pela prática do crime descrito no art. 273 , §1º e 1º-B, I do Código Penal. Reexaminada a dosimetria da pena, em obediência à decisão do STJ contida nos autos, afastada a incidência do preceito secundário do dispositivo, utilizando, para fins de dosimetria, o preceito secundário contido no art. 33 da Lei 11.343/06.
(ACR 00017566320074036116, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/10/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PENA. ALTERAÇÃO. DECISÃO EM RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 273 DO CÓDIGO PENAL. PRECEITO SECUNDÁRIO AFASTADO. APLICADO PRECEITO SECUNDÁRIO DO CRIME DE TRÁFICO. CONDENAÇÃO ALTERADA. 1. Reexame da dosimetria em virtude de decisão do C. STJ, por meio da qual se interpretou que, ante a declaração (pela Corte Especial daquele Tribunal Superior) de inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273 do Código Penal, seria aplicável ao presente caso (quanto à conduta que se amoldaria, inicialmente, àquela figura típica) o preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/2006. Conduta reexaminada a partir dessa premissa. 2. Autoria, materialidade e dolo. Comprovação. 3. Dosimetria da pena. Condenação pelo crime do art. 273 do Código Penal. Preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/06. 4. Pena definitivamente fixada em 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 194 (cento e noventa e quatro) dias-multa tendo estes o valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. 5. Apelação do Ministério Público Federal e do réu parcialmente providas para condenar o réu pela prática do crime descrito no art. 273 , §1º e 1º-B, I do Código Penal. Reexaminada a dosimetria da pena, em obediência à decisão do STJ contida nos autos, afastada a incidência do preceito secundário do dispositivo, utilizando, para fins de dosimetria, o preceito secundário contido no art. 33 da Lei 11.343/06.
(ACR 00017566320074036116, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/10/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Ademais, há recente julgado desta Corte que aplicou ao crime do artigo 273 o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça:


PENAL - TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS, CONTRABANDO, IMPORTAÇÃO DE MEDICAMENTOS ADULTERADOS/SEM REGISTRO NA ANVISA E MOEDA FALSA - TIPICIDADE -INSIGNIFICÂNCIA - AUTORIA - PENAS. I - A quantidade de medicamentos /anabolizantes ocultos no compartimento de ar condicionado do veículo evidencia, nitidamente, sua finalidade comercial, afastando a tese de consumo próprio. Além dos medicamentos, a quantia de cocaína também é significativa, ainda que os acusados tenham se considerado usuários da droga, alegando que a utilizavam por inalação, ou seja, aspirando-se pó. Entretanto, a cocaína apreendida é da forma de "base livre", tratando-se de material sólido "em forma de pedras", não se tratando, pois, de cocaína pronta para se inalar, em pó. II - De outro vértice, a par do intuito da defesa em tentar partilhar a presente ação delituosa, atribuindo, assim, a importação de medicamentos e anabolizantes a Rodrigo e José Ricardo e a titularidade do entorpecente a José Eduardo, vejo que tal tese não possui amparo fático-jurídico. Neste diapasão, é forçoso ressaltar que todos foram flagrados no veículo que ocultava essas substâncias e, segundo o depoimento dos policiais que realizaram a abordagem, todos os acusados sabiam que substâncias ilícitas tinham sido ocultadas no veículo, eis que efetuaram a viagem até o Paraguai com unidade de desígnios, com total conhecimento da operação realizada em conjunto e com absoluta sintonia de propósitos. III - Unidade de desígnios, compartilhamento de ações, convergência e solidariedade de propósitos é o que claramente se deduz de toda a complexa ação realizada entre os três acusados. O que se deu, no presente caso, foi a adesão do comportamento de um aos demais, fato essencial para a consumação do delito, havendo, pois, corresponsabilidade de tudo que fora apreendido em território nacional no interior do automóvel, onde cada um concorreu para a consumação dos crimes tipificados na denúncia. É o que se descreve doutrinariamente como vínculo subjetivo ou psicológico, ou seja, a consciência de contribuir para a atividade delituosa de outrem. IV - Igualmente há de se manter o entendimento da sentença quanto à aplicação do princípio da insignificância quanto aos demais produtos estrangeiros apreendidos, eis que o valor tributável não ultrapassa o limite verificado por Portaria do Ministério da Fazenda para a cobrança de seus créditos, sendo tal matéria pacificada pelos Tribunais Superiores. V - Sendo assim, é caso de dar parcial provimento ao recurso ministerial, para que todos respondam, indistintamente, pelos delitos do art. 273 , §§ 1º e 1º-B e incisos I, II e IV do Código Penal e art. 33, caput, da Lei 11.343/06. VI - Pena do artigo 273 do Código Penal. Fixada como pena aquela mínima prevista no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, em 05 anos de reclusão, em razão de decisão proferida pela Corte Especial do STJ (HC nº 239.363-PR) em 26.02.2015, a qual acolheu a arguição de inconstitucionalidade do preceito secundário da norma do art. 273 , § 1º -B, V, do Código Penal. Aplicada a fração de 1/6 como causa de diminuição prevista no § 4º, do art. 33, da legislação ordinária acima, eis que não há prova nos autos de que os acusados integrem organização criminosa ou façam do crime seu meio de vida, sendo primários e sem antecedentes registrados. Seguindo os mesmos critérios, a pena de multa resulta em 416 dias-multa no valor unitário fixado na sentença. VII - Fixada a pena mínima de 05 anos para todos os acusados, com base no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, em relação especificamente ao crime de tráfico de entorpecentes, aplicando-se a fração de 1/6 como causa de aumento prevista no art. 40, I, da legislação supra e a mesma fração de 1/6 como causa de diminuição do § 4º, do art. 33, da legislação ordinária acima, pelas mesmas justificativas anteriormente explicitadas. Seguindo os mesmos critérios, a pena de multa resulta em 485 dias-multa no valor unitário fixado na sentença. VIII - De conformidade com a regra do art. 70 do CP, dada a existência de concurso formal, aplica-se a fração de aumento de 1/6 em relação ao delito mais grave, que é o do delito de drogas. Resta, assim, a pena final dos réus José Eduardo e Rodrigo em 05 anos, 08 meses e 01 dia de reclusão e pagamento de 583 dias-multa. A pena de José Ricardo resta acrescida pelo delito do art. 289, § 1º, do Código Penal em 03 anos de reclusão, totalizando o montante de 08 anos, 08 meses e 01 dia de reclusão e pagamento de 613 dias-multa. Fica mantido o regime inicial fechado, tratado na sentença, em função da gravidade dos produtos ilícitos importados, além de moedas falsas e de entorpecente em quantidade considerável para fins de comércio. IX - Parcial provimento aos recursos.
(ACR 00078380420114036106, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/07/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Destaco que a dosimetria da pena para os crimes do artigo 273 do Código Penal deve levar em conta as sanções abstratamente previstas para o crime previsto no artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 e não apenas a aplicação restrita de seu preceito secundário. Isso porque não se pode, a partir de novo amoldamento da conduta (ao menos para fins sancionatórios, como parece ser "a ratio" da decisão superior), buscar a aplicação apenas das disposições jurídicas convenientes a uma das partes, mas sim de todo o conjunto de normas atinente ao quadro fático examinado em um caso concreto.


Assim, amoldando-se a conduta ao artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, não se tem apenas a aplicação de uma disposição normativa específica, mas de todas as normas penais pertinentes a esse enquadramento jurídico. Interpretação outra implicaria verdadeira negativa de vigência a todas as demais disposições legais pertinentes (como as constantes do artigo 40 e do artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006), as quais, assumido o enquadramento inicial da conduta como amoldada ao artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, passam a ser em tese aplicáveis ao caso (se preenchidos os demais requisitos fáticos previstos nesses mesmos enunciados normativos).


Tecidas essas considerações, assiste razão ao MPF, devendo, nos termos explicitados, ser aplicada a dosimetria do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 ao delito em apreço.


Tecidas essas considerações, assiste razão ao MPF, devendo, nos termos explicitados, ser aplicada a dosimetria do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 ao delito em apreço.


Dosimetria:

Destaco que a dosimetria da pena para o crime do artigo 273 do Código Penal deve levar em conta as sanções abstratamente previstas para o crime previsto no artigo 33 da Lei 11.343/2006, e não apenas a aplicação restrita de seu preceito secundário. Isso porque não se pode, a partir de novo amoldamento da conduta (ao menos para fins sancionatórios, como parece ser "a ratio" da decisão superior), buscar a aplicação apenas das disposições jurídicas convenientes a uma das partes, mas sim de todo o conjunto de normas atinente ao quadro fático examinado em um caso concreto.


Assim, amoldando-se a conduta ao artigo 33, da Lei 11.343/06, não se tem apenas a aplicação de uma disposição normativa específica, mas de todas as normas penais pertinentes a esse enquadramento jurídico. Interpretação outra implicaria verdadeira negativa de vigência a todas as demais disposições legais pertinentes (como as constantes do artigo 40 e do artigo 33, § 4º, da Lei 11.343.06), as quais, assumido o enquadramento inicial da conduta como amoldada ao artigo 33, caput, da Lei 11.343/06, passam a ser em tese aplicáveis ao caso (se preenchidos os demais requisitos fáticos previstos nesses mesmos enunciados normativos).


1ª Fase:

Passo à análise das circunstâncias judiciais.


Entendo que a culpabilidade é normal à espécie.


O réu não ostenta maus antecedentes, conforme documentos de fl. 349.


Em relação à conduta social e à personalidade, não vislumbro nenhum elemento indicativo de que tais circunstâncias sejam desfavoráveis.


Os motivos e as circunstâncias do crime são normais ao delito.


As consequências foram inerentes ao próprio tipo penal.


Por fim, quanto ao comportamento da vítima, não há vítima determinada, sendo neutra tal circunstância.


Dessa forma, ausentes circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base no mínimo legal, qual seja, 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.


2ª Fase:


Na segunda etapa da dosimetria da pena, não ocorrem agravantes e incide apenas a atenuante prevista no artigo 65, III, "d", do Código Penal, pois o réu confessou a prática delitiva em seu interrogatório policial e judicial.


Mesmo nas hipóteses de prisão em flagrante e ainda que a autoria delitiva possa ser comprovada por outros meios de prova, o fato de o réu confessar espontaneamente a prática do crime ora narrado autoriza a incidência da atenuante da confissão. A propósito, confira-se:

"HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO A RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. TRÁFICO DE DROGAS E FALSA IDENTIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. SEGUNDA FASE. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL, POSTERIORMENTE, RETRATADA EM JUÍZO E CONFISSÃO JUDICIAL. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO N. 545 DA SÚMULA DESTA CORTE. PRISÃO EM FLAGRANTE. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO IMPEDE O RECONHECIMENTO DA MENCIONADA ATENUANTE. COMPENSAÇÃO ENTRE A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. POSSIBILIDADE. MATÉRIA PACIFICADA NO ERESP N. 1.154.752/RS. PENAS REDUZIDAS. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO.
- O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
- A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que a confissão realizada na fase inquisitorial e posteriormente retratada em juízo, mas utilizada pelo juiz para formar seu convencimento pela condenação, permite a incidência da atenuante do artigo 65, inciso III, alínea 'd', do Código Penal. Tal entendimento resultou na edição do enunciado n. 545 da Súmula desta Corte.
- Ademais, "[o] fato de o apenado haver sido detido em flagrante não impede a aplicação da atenuante prevista no art. 65, III, 'd', do Código Penal. A respeito já decidiu este Superior Tribunal de Justiça que 'a referida atenuante deve ser aplicada em favor do sentenciado ainda que a confissão somente corrobore a autoria delitiva já evidenciada pela prisão em flagrante' (AgRg no HC n. 201.797/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 2/2/2015)" (AgRg no HC 363.566/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 01/02/2017).
[...]
Habeas corpus não conhecido.
Ordem concedida, ex officio, para reduzir as penas do paciente ao novo patamar de 5 anos e 10 meses de reclusão e 583 dias-multa e 3 meses de detenção, mantidos os demais termos da condenação."
(STJ, 5ª Turma, HC 468639 / SP, Relator(a) Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA (1170), DJe 29/10/2018).

Além disso, a confissão foi utilizada para embasar a condenação, o que, por si só, impõe a aplicação da aludida atenuante. Nesse diapasão, a Súmula nº 545 do Superior Tribunal de Justiça:


"Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal."

Contudo, diante da impossibilidade de se fixar a pena intermediária em patamar inferior ao mínimo legal (Súmula n. 231 do STJ), resta a reprimenda mantida em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.


3ª Fase:


Na última etapa da dosimetria, incide a minorante prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06, na sua máxima fração - 2/3 (dois terços) -, pois o réu é primário, tem bons antecedentes e não há indícios de que ele se dedique a atividades criminosas ou integre organização criminosa. Assim, a pena resta definitivamente fixada em 1 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa.


Por fim, conforme decidido pela 4º Seção desta E. Corte, em julgamento realizado no dia 15.03.2018, nos Embargos Infringentes n.º 0001912-51.2007.4.03.6116/SP, de relatoria do e. Des. Fed. André Nekatschalow, faço incidir também a causa de aumento, prevista no artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), restando a pena definitiva fixada em 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 193 (cento e noventa e três) dias-multa.


Multa:


Em razão da condição econômica ostentada pelo réu, fixo o valor unitário do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.


Regime inicial de cumprimento de pena:

Tendo em vista a pena privativa de liberdade aplicada e a redação constante do artigo 33, §2º, "c", do Código Penal, fixo o regime aberto para início de cumprimento da pena de reclusão ora imposta.


Substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos:


Presentes os requisitos do artigo 44, do Código Penal, na medida em que a pena definitivamente aplicada não é superior a 4 (quatro) anos, o réu não é reincidente e não ostenta maus antecedentes, e a análise das circunstâncias judiciais indica que a substituição atende aos fins de prevenção e retribuição pelo delito praticado.


Substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em uma pena de prestação de serviços à comunidade, à razão de uma hora de serviço por dia da pena corporal substituída, ressalvado o disposto no artigo 46, §4º, do Código Penal, e uma pena de prestação pecuniária, no valor de um salário mínimo, a ser paga em favor da União.


Dispositivo:


Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso do Ministério Público Federal para condenar o réu ANDERSON BRAND PIRES pela prática do crime do artigo 273, §§1º, §1º-A e §1º-B, do Código Penal, à pena de 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 193 (cento e noventa e três) dias-multa, no valor unitário mínimo legalmente estabelecido, substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos.


É o voto.




JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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